Imagem é Tudo

Iron Maiden

Flight 666
The Film
(EMI)

ironmaiden666Mais do que um documentário ou a gravação da turnê de uma banda de rock, “Flight 666” é uma história de aventura, bolada para possibilitar a realização do sonho dos fãs e para os integrantes do Iron Maiden superarem mais um desafio: o de reviver a turnê do auge de sua carreira, percorrendo cerca 70 mil quilômetros para tocar em 21 cidades em três continentes, durante enxutos 45 dias, a bordo de um Boeing 757 próprio, customizado com os logos da banda, e ainda pilotado pelo vocalista Bruce Dickinson. Ufa… Assim dá pra entender a cara de alívio do baixista Steve Harris (o chefão da banda) durante “Hallowed Be Thy Name”, no último show, em Toronto, Canadá. Eles haviam conseguido dar um passo ousado, depois de uma longa carreira de sucesso e com mais de 50 primaveras nas costas.

É uma ousadia ainda maior se pensarmos que para fazer o filme foram recrutados Sam Dunn e Scott McFadyen, cuja experiência vinha de “Metal – Uma Jornada Pelo Mundo do Metal” e “Global Metal”. Ou seja, neófitos na sétima arte. Uma coisa é viajar pelo mundo com uma câmera na mão gravando entrevistas para fazer documentários, outra é cobrir uma turnê inteira do Iron Maiden, o que inclui uma equipe generosa com várias câmeras registrando ao mesmo tempo o show em si (que aparece na íntegra do disco 2, com uma música diferente gravada em 16 cidades), os bastidores, o público e toda a movimentação da equipe, incluindo pousos e decolagens do “Ed Force One”. A dupla se saiu muito bem, conseguindo boas tomadas unidas numa excelente edição, e ainda cenas surpreendentes do avião em pleno vôo (em que pese os efeitos de computação gráfica) e das cidades por onde o banda passou.

Contratado pelo grupo, o documentário é quase que totalmente “chapa branca”, não releva problemas internos da equipe, de relacionamento entre integrantes ou de dificuldades na realização de cada espetáculo, a menos que sejam agruras contornadas com final feliz. Caso do show em Mumbai, na Índia, onde a estrutura de bambus que sustentava o palco parecia não suportar a carga dos equipamentos, mas não cedeu. Ou ainda da dor de barriga que pegou quase todos os Maidens na Austrália, graças a uma comida mais temperada servida em Mumbai. Quando, ao jogar golfe nas horas de folga, o baterista Nicko McBrain levou uma bolada no punho de uma das mãos que poderia tirá-lo do show da Costa Rica, e tudo não passou de um susto, ficou fácil incluir as cenas na edição.

As imagens de bastidores mostram de tudo. Bruce se transformando em soldado da cavalaria inglesa do século 19, em “The Trooper”, num náufrago da fábula S. T. Coleridge, em “Rime Of The Ancient Mariner” e usando a clássica máscara em “Powerslave”. Roadies trabalham e se divertem, puxando panos de fundo para lá e para cá e até operando, por controle remoto, as ações do boneco Eddie, na sua versão “cyber”, da capa do álbum “Somewhere In Time”, dessa vez com uma câmera na cabeça cujas imagens não ficaram de fora da edição final. No show de Los Angeles, aparece um dos chefes de equipe terminando de carregar o “Ed Force One” às 7h40 do dia seguinte ao show. “Quando tudo corre bem, trabalhamos entre 7h e 2h da manhã”, diz um deles.

ironmaiden666cdO filme começa com Sam Dunn narrando a aventura, mas ele sai de cena na maior parte do tempo, diferentemente do que acontece em seus dois filmes anteriores. Sabidamente, deixa para que cada integrante da banda conte suas histórias, bem como o manager geral Ron Smallwood. A cada etapa aparece o destino e a quilometragem percorrida, mostrando que certamente nunca ninguém viajou tanto em tão pouco tempo. Além de conseguir terminar a turnê sem problemas logísticos, era preciso ter muito público para poder pagar as contas e escrever a palavra sucesso em letras garrafais ao final. É o que se vê no filme, com as cenas ao vivo editadas, mas sobretudo no disco 2, com a íntegra de cada música: um mar de gente à frente de cada palco, em cada cidade.

No Chile, por exemplo, onde no passado a ditadura de Pinochet impediu a realização de um show do Iron Maiden, uma massa disforme de milhares de pessoas se movimenta já na abertura, antes de a banda subir no palco, com a instrumental “Transylvania”. Na Costa Rica, onde Smallwood pensava num show para cerca de sete mil pessoas, acabou acontecendo o maior evento ao vivo da história da América Central, reunindo quase 30 mil fanáticos. Como diz Bruce na Cidade do México, arrepiado com um grito de torcida vindo da platéia, quanto mais eles descem para o Sul, mas a coisa pega fogo. Na Colômbia, os músicos sofrem com a altitude, e o público com uma rigorosa revista policial que recolhe mesmo a comida de quem chegou ao local do show – um parque púbico – uma semana antes.

A parte dedicada ao Brasil mostra cenas do tradicional futebol (com a presença dos rapazes do Sepultura) e trechos do show de São Paulo. Duas músicas têm a íntegra incluída no disco 2: “Heaven Can Wait”, em São Paulo e “The Clairvoyant”, em Curitiba. Se o Rio não entrou nessa primeira perna da turnê, o histórico show do Rock In Rio, em 1985, é relembrado com cenas da época (que fazem parte dos extras de outro DVD, “Live After Death”) e tido pela banda como o marco inicial da trajetória do Iron na América Latina. O fato bizarro fica por conta da entrevista do pastor Marcos Motolo, que usa as letras do Iron Maiden em sua igreja, na periferia de São Paulo, tem um filho chamado Steve Harris e o corpo todo (mal) tatuado a partir do material gráfico dos discos do Iron Maiden.

Dada a rapidez atroz dos nossos tempos - o filme virou DVD em menos de três meses – “Flight 666” chega ao formato subvertendo a ordem do mercado. Em vez de o show como protagonista e os extras com um documentário, é a aventura de voar em seu próprio avião para fazer o máximo possível de shows em lugares onde, sem essa alternativa não seria possível realizá-los, o prato principal. E a banda tocando ao vivo, representando todos os 12 países contemplados nessa primeira etapa da turnê, o bônus. Seria bem mais simples fazer um único show e gravar para um DVD, mas não para o Iron Maiden. E isso sim contar que se trata de um filme feito para cinema, com qualidade de imagem superior – e muito – a maioria dos DVD musicais que estão na praça.

Um CD duplo, com o áudio da íntegra de todas as músicas do disco 2 do DVD também está disponível. Nele, somadas as imagens só do show (que aparecem entrecortadas por trechos do filme que remetem às cidades onde foram gravadas), percebe-se, no fim das contas, o melhor de tudo. A banda continua afiadíssima, tocando com precisão músicas com mais de 20, 25 anos, numa forma espantosa. Os três guitarristas indo à frente do palco em coreografia ensaiada; Steve Harris cantando todas as músicas com seu baixo matador apontado para o público; Nicko McBrian virando sem parar na bateria que parece sufocá-lo; e Bruce Dickinson, que achou um modo de cantar com afinação mesmo sem ter a voz do passado, e não consegue ficar parado, revelam uma forma impressionante que fez os fãs viverem uma época na qual sequer tinham nascido. É o que faz desse DVD, pelo conjunto da obra, indispensável – e não só para os fãs.

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