Som na Caixa

Pitty

Anacrônico
(Deckdisc)

pittyanacronicoPara o primeiro disco Pitty tinha só uma fita com umas músicas com voz e violão. Depois do sucesso e de shows espalhados pelo Brasil, formou-se verdadeiramente uma banda, e este segundo disco mostra, antes de qualquer coisa, uma certa noção de conjunto que antes não havia. Mas um conjunto coordenado, e muito bem, pela própria Pitty, que sabe exatamente o que quer, e pelo produtor Rafael Ramos. A dupla parece se entender muito bem mesmo, até nas horas em que divergiam fazer isto ou aquilo, como pode ser visto no filme “Sessões Anacrônicas”, peça principal do lado DVD desde Dual Disc – a versão simples de “Anacrônico” saiu em agosto e já superou as 60 mil cópias.

Dito isso, a análise deste disco aponta pra um paradoxo dos mais interessantes. De um lado, ele é muito mais pesado, como a faixa título logo sugere, elaborado e bem formatado, em detalhes técnicos pinçados em meio a muito esporro. E esporro do bom. De outro, mostra a mesma Pitty de seu antecessor, temperando músicas pesadas e familiares ao meio metálico com arrumações pop de dar gosto até para aqueles que torcem o nariz quando o assunto é rock pesado. Pitty consegue fundir, já nas composições, mas, sobretudo nos arranjos, a fúria adolescente do metal (e o grunge também) com o apelo de um bom pop rock. Nunca esses extremos da pop mundial foram colocados no mesmo saco sem um prejudicar o outro.

As referências que antes apareciam disfarçadas agora mostram mais a cara e contribuem para o conjunto do trabalho. Não é exagero dizer que “No Escuro”, por exemplo, é grunge até a raiz, para não dizer que é praticamente uma música do Nirvana. O baixo encontrado em “De Você” veio direto de “Give It Away”, dos Chili Peppers. Algumas evoluções são quase “mini jams” que não soarão estranhas para quem já ouviu algo do Mars Volta. Tudo isso prova o quão forte é na música da Pitty não só o tal metal de vanguarda do início dos anos 90, como toda a música com um certo peso que predominou naquela época – inclua-se aí o grunge, thrash metal e o tal funk o metal.

Afora isso, há que se destacar, ao menos, duas coisas. Primeiro a capacidade da cantora de fazer, sim, boas músicas, senão de nada adiantaria a boa produção e os arranjos. É o que se vê, por exemplo, em “Brinquedo Torto”, “Déjá Vu” e na hardcoreana “Aahhh…!”, que lembra bem os tempos do Inkoma. Nas letras, notas-se também mais consistência, além de referências às mudanças que o sucesso remeteu à vida da cantora. Depois, é que desta vez abriu-se mão de colocar músicas mais lentas com artifícios do tipo “vamos agradar o mercado”, o que certamente deu mais coerência ao disco como um todo. Mesmo em baladas como “Ignorin’u” e a ótima “Na Estante”, por exemplo, há o peso que permeia todo o disco. Tudo isso faz de “Anacrônico” um dos melhores discos de rock de 2005.

No DVD, o documentário mostra como Pitty e Rafael definem o jeito que cada micro detalhe do disco deve funcionar, mostrando que a coisa não é mesmo para qualquer um. Algumas cenas engraçadas divertem, como o dia em que o guitarrista Martin decidiu gravar um trecho de uma música bêbado, mas, no geral, como entretenimento, o documentário tem estética de reality show e não chega ser tão bom quanto o disco. Vem ainda com o clipe para “Anacrônico”, fotos e todas as músicas em áudio, sobre uma animação inspirada nos personagens da capa.

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