O Homem Baile

Livre e atuante

De volta à cidade onde os integrantes foram presos, Planet Hemp estreia no Porão do Rock em incrível encontro com os fãs. Fotos: Gerdan Wesley/Divulgação Porão do Rock.

No gás: nem as dores no joelham subtraíram a disposição de Marcelo D2, à frente do Planet Hemp

No gás: nem as dores no joelham subtraíram a disposição de Marcelo D2, à frente do Planet Hemp

Passa das duas horas da madrugada de domingo (30/10) e uma multidão considerável não arreda o pé da frente do palco montado no Estacionamento do Estádio Mané Garrincha, em Brasília. Com frio e sob chuvas ocasionais, eles estão à espera dos “maconheiros mais famosos do Brasil”, e não é que o show esteja atrasado, foi marcado para essa hora mesmo. Um encerramento do Porão do Rock com ares de liberdade no qual só o Planet Hemp poderia atuar como protagonista. A formação não é a clássica, um disco com músicas novas não é lançado desde 2000, mas jamais uma banda como Planet, misturando rock, rap, hardcore e o escambau apareceu com tanta força, para o bem ou para o mal.

Poderia ser apenas mais um show de mais uma turnê de reunião, não fosse essa a primeira vez do grupo no festival, que completa 20 anos no ano que vem, e se não fosse Brasília a cidade onde os integrantes foram presos por apologia e associação para uso de drogas, em 1997. Não que o Planet não tenha tocado na Capital Federal desde então, mas impossível não lembrar as fotos de Marcelo D2 e Formigão (os únicos da formação atual que lá estavam) na carceragem e da repercussão do caso. E de como é emblemático, em tempos estranhos como esses, vê-los ao vivo, ali em cima daquele palco, cantando as mesmas músicas que lhes deram cana, quase 20 anos depois. Não, nem tudo está perdido.

Duplinha boa de rima: BNegão e a costumeira velocidade com as palavras, ao lado de Marcelo D2

Duplinha boa de rima: BNegão e a costumeira velocidade com as palavras, ao lado de Marcelo D2

Por isso isqueiros, muitos isqueiros tomam o lugar dos aparelhos celulares em “Quem Tem Seda?”, já na parte final do show. Por isso antes que comece “Contexto”, BNegão pede “mudança pra frente” e cita os estudantes que ocupam escolas em todo o Brasil. Por isso “Crise Geral”, a alma do brasileiro escancarada sem poesia por um torneiro mecânico, entra no set e causa frisson realçando ainda mais a porradaria que come solta e interfere até no semblante do quase sempre impávido Formigão. Por isso Chico Science, Chorão, Skunk, integrante fundador, e Sabotage, entre outros, são lembrados em “Samba Makossa”, da Nação Zumbi. E por isso D2 cita o Garage Art Cult, o berço do rock carioca dos anos 1990, onde o Planet nasceu, ao anunciar “Phunky Buddha”. Completam a formação atual o guitarrista Nobru e o baterista Pedro Garcia, ambos revelados no Cabeça.

Vê-se que o show – e só podia ser assim – é repleto de clássicos do cancioneiro não só maconheiro, mas revolucionário. E dá-lhe “Porcos Fardados”; “Legalize Já”, que abre o show no gás como palavra de ordem em uníssono; a irresistível “Queimando Tudo”, que nasceu da pergunta “e agora, vocês vão falar de que?”; e blocos hardcore que incluem, além do hino do Ratos de Porão citado ali em cima, “Seus Amigos”, “Maryjane” e “Mão na Cabeça”. O repertório é um pouco menor do que o de uma apresentação solo, mas não há o que reclamar quando se tem 24 porradas que detonam intermináveis, fundidas entre si e cada vez maiores rodas de pogo. E isso com D2 meio chumbado por conta de dores em um dos joelhos. O que, vamos e venhamos, seria pouco para deter esses caras. Mais que revivalista, e sobretudo nos dias de hoje, o Planet Hemp é uma banda necessária.

Dinho, guitarrista do Boogarins: pose ou realidade na psicodelia de baixa pressão tipo exportação?

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A vibe viajandona, no entanto, aparece mais cedo, nesse mesmo palco, com o Boogarins. O grupo brasileiro mais “tipo exportação” da atualidade faz uma apresentação até certo ponto padrão, como se não se desse conta do tamanho do festival. Oficialmente, são quatro músicas nos 50 minutos em que a banda toca, mas essa matemática não faz o menor sentido ante a uma série de improvisações e citações a outros artistas, de Mutantes a Júpiter Maçã, de Tame Impala ao rock progressivo dos anos 70. A dúvida que fica – e não é de hoje – é de o quanto aquela psicodelia de baixa pressão é real, e o quanto é tudo pose. Questões que também não fazem sentido para a turma da grade que venera a banda, a despeito da indiferença de outra parte que circula pelo festival durante a apresentação.

Em uma edição de boas bandas novas de Brasília já na abertura, realça a surf music d’Os Gatunos. Ou, por outra, é uma edição de maior diversidade entre as bandas mais novas, o que permite inclusive que o trio, uniformizado como exige o gênero, e com máscaras de bandido de seriado dos anos 60, inclua um naipe de metais para inserir lambada (não precisava) e guitarrada (ficou lindo) no repertório. E isso com os contornos clássicos de Dick Dale. Muito próximo do hardcore melódico, o My Last Bike tem a manha de tocar a genial “Adolescente”, do Cólera, para quase ninguém, na abertura do festival. E fiquem de olho no Darshan, banda que melhorou muito desde 2013, quando tocou no Goiânia Noise, e promete muito com um som mezzo stoner mezzo grunge, mas completamente esporrento. Ao menos foi o que deu pra ver na ressaca do show do Ira!.

Os Gatunos: surf music uniformizada, mascarada e com a adição de lambada e guitarrada

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Set list completo Planet Hemp:

1- Legalize Já!
2- Dig Dig Dig
3- Planet Hemp
4- Fazendo a Cabeça
5- Deisdazseis
6- Phunky Buddha
7- Maryjane
8- Procedência C.D.
9- Ex-Quadrilha da Fumaça
10- Raprockandrollpsicodelia
11- 100% Hardcore
12- Zerovinteum
13- Porcos Fardados
14- Mão na Cabeça
15- Crise Geral
16- Seus Amigos
17- Futuro do País
18- Stab
19- Contexto
20- Queimando Tudo
21- Quem Tem Seda?
22- A Culpa é De Quem?
23- Samba Makossa
24- Mantenha o Respeito

Darshan: melhora significativa nos últimos três anos na mistura de stoner, grunge e muito barulho

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Clique aqui para ver como foram os shows de Ira! e Nação Zumbi no Porão do Rock 2016

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