O Homem Baile

Com festa

Em espetáculo bem engendrado, Angra vira superbanda para comemorar aniversário de seu álbum mais representativo. Fotos: Nem Queiroz.

O bom vocalista Fabio Lione não esconde a falta que Andre Matos faz nos clássicos de 'Holy Land'

O bom vocalista Fabio Lione não esconde a falta que Andre Matos faz nos clássicos de 'Holy Land'

O palco é imponente já em sua paisagem inicial. São duas baterias de configuração arrojada e quatro bumbos no somatório total. De um lado, um farto material de percussão, incluindo um atabaque gigante customizado com os motivos da banda, e, de outro, um cercadinho de teclados que assusta só de pensar como uma pessoa só vai tocar aquilo tudo. Está prestes a começar, no Vivo Rio, nesta sexta (26/8), o show que comemora o aniversário de 20 anos do lançamento do álbum “Holy Land”, que garantiu ao Angra a consolidação de uma então iniciante carreira – é só o segundo disco deles – no mercado internacional; entenda-se não só Japão, mas Europa e até Estados Unidos.

Como se vê, o show tem ares de espetáculo grandioso, de modo que o esfacelamento da banda – só o guitarrista Rafael Bittencourt da formação original permanece – é compensado pela participação de convidados dos mais nobres, e trata-se de uma única oportunidade para os fãs verem, ao vivo, músicas que talvez não fossem tocadas nem na época em que foram lançadas, e sucessos que o próprio álbum consagrou. “Holy Land”, de acordo com uma das falas de Rafael, foi um “encontro da banda como músicos e com a história do Brasil”, descrita de modo conceitual em um trabalho cheio de referências à música brasileira. Coincidência ou não, foi lançado quase que simultaneamente com “Roots”, do Sepultura, outro ícone do metal nacional em todo o mundo, que tem semelhante orientação estética.

Lione canta junto com o guitarrista Rafael Bittencourt, protagonista maior dessa nova fase do Angra

Lione canta junto com o guitarrista Rafael Bittencourt, protagonista maior dessa nova fase do Angra

As duas baterias tocadas simultaneamente logo da cara em “Nothing to Say”, um dos hits do disco, pelo baterista atual, Bruno Valverde, e por Ricardo Confessori, que contribuiu – e muito – na composição de “Holy Land”, é de arrepiar. Assim como uma batucada “from hell” acrescida da forte percussão de Dedé Reis, e que deságua numa por assim dizer improvisação sensacional. Os músicos, incluindo convidados, não estão para brincadeira, ensaiaram tudo tintim por tintim e o resultado, do ponto de vista musical, é de arrepiar. Até o ponto de capoeira de “Holy Land”, a música, não incomoda o público, e registra-se que não é fácil associar esse tipo de referência a um mundo fechado como o do heavy metal, mesmo em se tratando de um show comemorativo de um clássico do gênero.

O tecladista Junior Carelli brilha em “Silence and Distance”, e o guitarrista Marcelo Barbosa vai muito bem como imediato de Kiko Loureiro, que segue ganhando o mundo ao lado de Dave Mustaine no Megadeth. Barbosa encanta em duelos com Rafael Bittencourt ou em ótimos solos, sobretudo na pauleira “Z.I.T.O.”. Que o vocalista Fabio Lione se adapta certinho nessa nova fase do Angra, não há dúvidas, mas do ponto de vista do repertório de “Holy Land”, a falta de Andre Matos com sua rara afinação e seus falsetes é brutal, ainda mais para quem conhece o disco de cor e salteado. Músicas como a própria “Nothing to Say”, “Carolina IV” e “Make Believe”, cantada por Rafael e que mostra a força de uma balada genuína, perdem muito sem aquele gogó privilegiado, e não são só as viúvas de plantão que percebem.

O convidado Ricardo Confessori se apresenta para espancar os tambores ao lado de Bruno Valverde

O convidado Ricardo Confessori se apresenta para espancar os tambores ao lado de Bruno Valverde

O baixista Luis Mariutti, outro que gravou “Holy Land”, reaparece de cabelos curtos e menos Jesus que antes, para substituir Felipe Andreolli nas três músicas finais. Mas o protagonismo desse espetáculo de viés singular é de Rafael Bittencourt. O extraordinário músico é espécie de diretor geral da peça e mestre de cerimônias, e tem se saído muito bem cantando, ou sozinho ou junto com Lione, com um daqueles microfones presos na cabeça. É o que acontece na inesperada cover de “Synchronicity II”, do Police, que traça uma surpreendente ponte entre os monstros Andy Summers e Stewart Copeland e o – quem diria - heavy metal. E aí o modo de segurar a baqueta com a mão esquerda de Bruno Valverde pode não ser reles coincidência. O prodígio baterista, que tem a idade do Angra (25 anos em outubro), é um show à parte, e não apenas no acrobático e cativante solo a que tem merecido direito.

Mas a noite não é só de “Holy Land”, e tem músicas de quase todos os álbuns, com certa ênfase em “Secret Garden” lançado há (já?) quase dois anos. São dele “Newborn Me”, que abre a noite com todos cantando junto, e a ótima “Final Light”, quem vem depois das improvisações vocais de Lione; o cara é bom pacas. Hits de “Angels Cry”, o estupendo disco de estreia, são omitidos, e só a dramática “Time” representa, com o vocalista fazendo um esforço daqueles para tomar ar ante a exuberante gravação de Andre Matos. Outros destaques em quase duas horas e meia de show são “Rebirth” e a pedrada “Nova Era”, arremate sem reparos para a agitação geral do público, ambas no bis. No fim das contas, o espetáculo é a prova de que mesmo sem uma formação rodada, com músicos talentosos, um bom repertório e certeira direção musical é possível fazer um ótimo show. Não para, não.

Bittencourt toca ao lado de outro convidado, o baixista Luis Mariutti, que também gravou 'Holy Land'

Bittencourt toca ao lado de outro convidado, o baixista Luis Mariutti, que também gravou 'Holy Land'

Do interior de Santa Catarina, cinco rapazes imberbes saíram mais cedo da escola para fazer um ótimo show de abertura em plena Cidade Olímpica. Explica-se que o Odysseya é formado por integrantes muito jovens, mas que apresentam um heavy metal de grande impacto e identificado com pioneiros do melódico como o Helloween; o final com “Eagle Fly Free” não é coincidência. Mas as músicas próprias são muitos boas, e as performances, individuais e como banda, são ótimas também. Victor Franco e Vinicius Mira debulham as guitarras em belos arranjos, e o vocalista Felipe Silva segura bem na afiação alta. O mais importante é que o quinteto não se intimidou com a grandeza do palco do Angra e conquistou o apreço do público com um excelente trabalho.

Set list completo Angra:

1- Newborn Me
2- Wings of Reality
3- Waiting Silence
4- Nothing to Say
5- Silence and Distance
6- Tribal Jam
7- Carolina IV
8- Holy Land
9- The Shaman
10- Make Believe
11- Z.I.T.O.
12- Deep Blue
13- Final Light
14- Time
15- Storm of Emotions
16- Lullaby for Lucifer
17- Silent Call
18- Solo bateria
19- Synchronicity II
20- Angels and Demons
Bis
21- Rebirth
22- Nova Era

Odysseya: o guitarrista Vinicius Mira, o baixista Vitor Vieira e o vocalista Felipe da Silva agitando no palco

Odysseya: o guitarrista Vinicius Mira, o baixista Vitor Vieira e o vocalista Felipe da Silva agitando no palco

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