O Homem Baile

Alternativo

Ira! revira baú e resgata não hits junto com as faixas do clássico álbum “Vivendo e Não Aprendendo” no Circo Voador. Fotos: Nem Queiroz.

Renovado: um emagrecido Nasi canta no comando do ótimo show do Ira! no Circo Voador

Renovado: um emagrecido Nasi canta no comando do ótimo show do Ira! no Circo Voador

A noite está para acabar e o renovado Ira! recebe no palco o gaúcho Wander Wildner para o esperado encontro em “Bebendo Vinho”, no arremate de uma noite que entra automaticamente para a história do rock nacional. Wander, que fez um arrebatador show de abertura (resenha aqui), traz o lendário Jimi Joe a tiracolo, mas a imagem que marca o show, que só poderia mesmo ter acontecido no Circo Voador, é a silhueta do vocalista Nasi projetada por uma certeira iluminação, lá no alto, nas duas laterais do palco. Coincidência ou não, é ali que residem, entranhados na lona embaralhada, todos os fantasmas do rock que, nessa noite, descem sobre o palco para um sensacional encontro de energias emanadas da eternidade. E a imagem não poderia ser mais emblemática.

O show é espécie de derivação da turnê de reunião que começou há cerca de dois anos nesse mesmo local (relembre), dessa vez com a totalidade do álbum “Vivendo e Não Aprendendo”, o segundo do Ira!, gravado no Rio e lançado há trinta anos naquele prolífico 1986. Mas, além disso, e talvez por isso mesmo, Edgard Scandurra e Nasi, os únicos remanescentes da formação original, optam por completar o repertório com menos hits e a inesperada inclusão de músicas não tão bem exploradas nas épocas em que foram lançadas, para dizer o mínimo. Por isso a demora para o show começar de verdade, o que só vai acontecer na calminha, porém conhecida “Tarde Vazia”, a primeira a ser cantada pela plateia.

Nasi recebe o gaúcho Wander Wildner no bis, para cantar o sucesso e hino de torcida 'Bebendo Vinho'

Nasi recebe o gaúcho Wander Wildner no bis, para cantar o sucesso e hino de torcida 'Bebendo Vinho'

Gente que reage de modo contemplativo, mas guarda aplausos respeitosos toda vez em que um não hit é tocado. Como “Sem Saber Pra onde Ir”, do indigesto “Invisível DJ”, disco de inéditas mais recente, que saiu já há 10 anos. A música é reativada por um mini riff de guitarra e só um exemplo de como Scandurra não está para brincadeira. “Advogado do Diabo” é outra, retirada de “Psicoacústica”, tido como o álbum esquisito do Ira!, e, portanto, cultuadíssimo entre o baixo clero dos fãs. Mas desse material é “Rubro Zorro”, inspirada na obra do cineasta Rogério Sganzerla (”O Bandido da Luz Vermelha”), a estrela, com o palco iluminado em vermelho. As duas juntas de uma vez só é a representação do aspecto ousado de um show, no mínimo, singular, que foge daquele oba-oba de hits que agrada as massas.

E que tem a vez quando “Envelheço Na Cidade”, a “primeira do lado A”, é tocada e recebida com um vigor até de desabafo pelo público, começando a mostrar como “Vivendo e Não Aprendendo” tem muitos mais sucessos do que a vã memória tenta contabilizar. Das 10 faixas, nada menos que oito são de domínio público, ao menos dentro da amostragem que lota o Circo Voador. À exceção de “Casa de Papel”, não tocada há uns 25 anos, o que faz Nasi lembrar a letra com um papel afixado no piso, e “Tanto Quanto Eu”, todas as outras são cantadas a plenos pulmões, tocadas na ordem em que aparecem no álbum original, e em versões turbinadas por um Scandurra inspiradíssimo, o que não chega a ser exatamente uma novidade.

O inspirado Edgar Scandurra, um dos mais destacados guitarristas do rock nacional em todos os tempos

O inspirado Edgar Scandurra, um dos mais destacados guitarristas do rock nacional em todos os tempos

É o que mostra “Nas Ruas”, que tem o guitarrista fazendo um ótimo contraponto vocal com Nasi, no maior estilo Plebe Rude, além de mandar um solo final que beira o genial. “Dias de Luta” é outra que agrada, muito pelo riff de guitarra, um dos mais marcantes do rock nacional em todas as épocas, ainda que o público distorça tudo ao cantar um nefasto refrão imaginário sobre ele. “Flores em Você”, que foi até tema de novela global, chega a ser covardia, com Edgar substituindo o arranjo de cordas da versão original com rara preciosidade. Mas poucos números superam “Vitrine Viva”, nem sempre incluída nessa reunião. A música é convertida em um funk arrebenta assoalho contagiante até para os menos iniciados.

No repertório do álbum, sobra até para o tal deputado de extrema direita popstar, xingado por Nasi justamente em “Pobre Paulista”, que tem versos de conotação racista/xenófoba. No bis, a dupla de gaúchos é recebida no palco, e Wander Wildner canta “Eu sigo só junto com o Ira!”, ajustando a letra de um de seus maiores sucessos e que já virou até grito de torcida por esse Brasilzão. Se “Longe de Tudo” é omitida do set list inicialmente planejado, e faltam muitas outras músicas de sucesso nesse desdobramento da turnê de reunião, cabe a “Núcleo Base” o encerramento para a alegria e felicidade geral de uma geração que segue aprendendo a lutar com outras fardas. E que – sorte grande - viu um show que dificilmente se repetirá.

Remanescentes da formação original: Nasi abre os braços ao lado do guitarrista Edgard Scandurra

Remanescentes da formação original: Nasi abre os braços ao lado do guitarrista Edgard Scandurra

Set list completo:

1- Amor Impossível
2- Flerte Fatal
3- Sem Saber Pra Onde Ir
4- Tarde Vazia
5- Sempre Mais
6- Advogado do Diabo
7- Rubro Zorro
8- Envelheço na Cidade
9- Casa de Papel
10- Dias de Luta
11- Tanto Quanto Eu
12- Vitrine Viva
13- Flores em Você
14- 15 Anos (Vivendo e Não Aprendendo)
15- Nas Ruas
16- Gritos
17- Pobre Paulista
Bis
18- Girassol
19- Bebendo Vinho
20- Núcleo Base

Ira! 2016: o baterista Evaristo Pádua, Edgard, o tecladista Johnny Boy, Nasi e o baixista Daniel Scandurra

Ira! 2016: o baterista Evaristo Pádua, Edgard, o tecladista Johnny Boy, Nasi e o baixista Daniel Scandurra

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Comentários enviados

Apenas 1 comentários nesse texto.
  1. Adelvan em junho 28, 2016 às 20:09
    #1

    pow, deu vontade de estar lá …

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