O Homem Baile

Com ódio

Devotos supera expectativas e brilha no Porão do Rock; Matanza e Capital Inicial são outros destaques e The Galo Power a revelação da primeira noite. Fotos Divulgação: Alessandro Dantas (1 e 2) e Gerdan (3, 4 e 5)

Cannibal liderando o Devotos a um dos melhores shows do Porão do Rock desse ano, no palco secundário

Cannibal liderando o Devotos a um dos melhores shows do Porão do Rock desse ano, no palco secundário

Bastou um tempo de bola rolando para o Devotos mostrar com quantos hardcores se faz um bom show de rock. Escalado em um horário cedo pela importância que tem, no Palco Budweiser, o terceiro do Porão do Rock, nesta sexta, o trio precisou só de 45 minutos para soltar 21 petardos na cara do público que ainda se agigantava na arena montada no Estacionamento do Estádio Mané Garrincha. Não adianta tirar o ódio do nome de uma banda de conteúdo tão visceral, brutal, impossível de ser lapidado. Com o Devotos, doravante chamado de novo de Devotos do Ódio, não tem dá licença, não tem por favor: é porrada atrás de porrada.

Matanza: Jimmy e a indefectível bateção de cabeça

Matanza: Jimmy e a indefectível bateção de cabeça

É bem verdade que uns flertes com o reggae e o dub acontecem aqui e ali, como em “Orixás”, por exemplo, mas pense bem: um sujeito com dread locks gigantes como Cannibal, um dia teria que necessariamente tocar reggae. Nada que tirasse o gás do Devotos do Ódio, sobretudo em músicas como “Nosso Ninho”, que tem em um dos versos um sonoro “vai tomar no #%*!”; a genial “Eu Tenho Pressa” e “Luz da Salvação”. É de impressionar como boa parte da plateia conhece todas as músicas, muito embora o pogo predomine o tempo todo. Canibal quase entra mudo e sai calado, e só “dá boa noite” na hora de se despedir. Antes, dedica o show às bandas candangas Detrito Federal e Oscabeloduro, tocando para elas “Me Perco Nesse Tempo”, das paulistanas Mercenárias…

Pense bem mais uma vez: não é extraordinário que um grupo venha de uma comunidade tocando justamente punk e hardcore? É a prova cabal de que estão equivocados os antropólogos que fazem seu recreio no chamada funk carioca. Subam o alto Zé do Pinho, acadêmicos, para ver o que é bom. Ou, por outra, vão a um show do Devotos do Ódio. Até a metida a eclética “Tem de Tudo”, no fim das contas, é um hardcore avassalador. Outras que se salientam no show são o hino “Punk Rock Hardcore”, na qual Neílton esmerilha a guitarra no monitor; a dramática “Futuro Inseguro” e “Roda Punk”, autoexplicativa de uma bela noite de punk e hardcore.

Capital Inicial e o diálogo da plateia com Dinho

Capital Inicial e o diálogo da plateia com Dinho

Curioso que os destaques principais venham do terceiro palco do festival, mas tudo é fruto de escolhas em um evento de shows simultâneos. E, a bem da verdade, o terceiro palco do Porão do Rock tira onda de Palco Principal em muito festival famoso por aí. Por isso só dá para ver o Matanza tocar 25 das 30 músicas, já na alta madrugada, num outro show – como de hábito – na cara. Turbinada pelo público que saía do show do Soulfly (veja como foi), a plateia se agigantou ainda mais. E pensar que o grupo, que vem pela quarta vez ao Porão, em 2001 tocou só seis músicas em apertados 15 minutos (veja fotos da época aqui, aqui e aqui). Showzaço que passou o rolo pé de carneiro sem dó por cima de geral.

Mas o maior público da noite, que chegou a 25 mil pessoas, segundo a produção, quem levou foi o Capital Inicial, com a pecha de local que estourou nacionalmente. Jogo ganho já no início, com “Depois da Meia-noite” e “À Sua Maneira”. Vale reouvir antigos sucessos do boom do rock dos anos 80, como “Leve Desespero”, “Fátima” e “Veraneio Vascaína”. Nem precisava inserir covers como o de “Seven Nation Army”, do White Stripes, mas o povão gosta mesmo assim. Tocando antes deles, o também local Alf se aproveitou da concentração para mostrar três músicas da insipiente carreira solo e rever hits de outras épocas e banda. Você pode não se lembrar, mas já dançou muito ao som de “Skaô” e “O Ó do Borogodó”, entre outras. Até uma roda de pogo se abriu no meio do publico, para surpresa do rapaz.

The Galo Power: classic rock sem cheiro de mofo

The Galo Power: classic rock sem cheiro de mofo

Entre as bandas mais novas, o The Galo Power foi a que deixou as melhor impressão. O grupo é um dos poucos no Brasil que sacou que classic rock não é som velho cheirando a mofo, mas sim um dos subgêneros do rock que mais crescem mundo afora. Assim, colocam no som um up grade bem engendrado que remete ao final dos anos 60/início dos 70, mas com um frescor dos mais interessantes. Músicas como a ótima “Big Mama” reúnem um festival de riffs, melodias e incursões instrumentais de tirar o fôlego. Vale conferir. Já o Selvagens a Procura da Lei fez praticamente dois shows em um só. Na primeira parte, um belo exemplo de rock bem feito, pesado e com apelo; na segunda afloram baladas desmedidas e um “quê” de Los Hermanos de dar dó. No fim, o hit à Strokes “Mucambo Cafundó” – que até cita o Planalto Central - salva a parada.

As duas primeiras bandas que tiveram a missão de abrir o Palco BRB cortaram um dobrado. Além de o público sem bem pequeno no horário, os equipamentos simplesmente não funcionavam. Para se ter uma ideia, Sabrina Sanm, do carioca Kita, passou uma música inteirinha como se fizesse mímica, já que não havia quem consertasse o microfone. O grupo, que investe num som pesado com programações, se viu perdido quando estas simplesmente não tocaram. Para o Dualid, cujo som é punk 77/pré-punk, a coisa não foi tão ruim: só a guitarra é que parecia desligada em mais da metade do show. Salvou a boa performance à Iggy Pop do vocalista Caju Clash.

Alf lançou três músicas e tocou antigos sucessos

Alf lançou três músicas e tocou antigos sucessos

Apresentada como banda de “hardcore bagaceira”, o Penteando Macaco é um trio que toca HC, sim, mas com um som bem mais trabalhado, que por vezes flerta com o metal e adjacências. Os músicos parecem dispostos a fugir do lugar comum, muito embora tenham citado “Geração Coca-Cola” logo de cara. No terceiro palco, o veterano Kábula brilhou com a mistura de metal tradicional e thrash, com destaque para a irônica “O Cachorro do Presidente”, que o vocalista fez todo mundo cantar. O Porão do Rock continua hoje. Clique aqui para saber tudo sobre os shows.

Set list completo Devotos:

1- Nós Faremos
2- Caso de Amor e Ódio
3- O Herói
4- O Homem Monstro
5- Orixás
6- Alien
7- Vida de Ferreiro
8- Tem de Tudo
9- Asa Preta
10- Luz da Salvação
11- Luta Pacifista
12- Me Perco Nesse Tempo
13- A Vida Que Você Me Deu
14- Dia Morto
15- Nosso Ninho
16- Eu Tenho Pressa
17- Votou Errado
18- Mas Eu Insisto
19- Roda Punk
20- Futuro Inseguro
21- Punk Rock Hardcore

Veja também: o show do Soulfly no festival

Marcos Bragatto viajou à Brasília à convite do festival.

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