O Homem Baile

Esporro e silêncio

Bandas internacionais fracassam nos palcos principais e ícones do rock nacional e palco secundário se transformam em opções para bons shows no Porão do Rock. Fotos Divulgação: Gerdan (1, 2, 3 e 5) e Alessandro Dantas (4 e 6).

Mono Men: os velhinhos Dave Crider e John Mortensen não arregam no quesito barulheira de garagem

Mono Men: os velhinhos Dave Crider e John Mortensen não arregam no quesito barulheira de garagem

Não era para ser assim. Os dois palcos principais do Porão do Rock, que terminou na madrugada de sábado para domingo, em Brasília, estavam prontinhos, com boa altura, pé direito generoso e boa estrutura de som e luz. Só que as bandas internacionais escaladas como principais – Mono Men e Mark Lanegan – fracassaram no quesito apelo de público, elevando o terceiro palco, lá nos fundos, ao grande e verdadeiro reduto dos interessados em rock pra valer. Na dupla de palcos acolhidos por grandes patrocinadores, brilharam Paralamas do Sucesso e Lobão (veja como foram os shows), que reuniram a maior quantidade de público; segundo a produção, cerca de 18 mil pessoas circularam pelo Estacionamento do Estádio Mané Garrincha no sábado. Na sexta, inclusive, já tinha sido assim com o Soulfly (veja como foi) e o Devotos (ex-do Ódio); saiba mais.

Mark Lanegan: se era o show intimista no lugar errado

Mark Lanegan: show intimista no lugar errado

Não que o grande Mono Men não faça rock, muito ao contrário. Só que o rock garageiro praticado por essa turma, convenhamos, no Brasil é uma invenção – das mais salutares – de Goiânia. Coloque o renascido quarteto num lugar bem menor, em qualquer cidade (pode computar o Hangar 110, em São Paulo, ou o Teatro Odisséia, no Rio) que a coisa rende; afinal, é garagem. Não por acaso o guitarrista Dave Crider, que circulava entre os mortais na arena onde o festival é realizado, já esteve nos Brasil com outros três ou quatro grupos, fazendo bons shows, mas, no fim das contas, esquecíveis como as atrações secundárias de um TIM Festival da vida. Muito pouco para o Porão do Rock.

Mas nem tão ruim assim. Como em geral acontece em shows de bandas internacionais, na primeira palhetada na guitarra dá pra ver que o sujeito tem passaporte. Por isso o carequinha John Mortensen forma ruidosa dupla com Crider, e o couro come com os dois trocando piadas internas num sotaque carregadíssimo. É bom lembrar que o Mono Men soube como poucos ligar os pontos entre o proto-punk e o grunge. No meio daquela barulheira toda, destaques para “Mistery Girl”, logo no início, na voz de Dave Crider, enquanto o telão mostrava cenas picantes com gatinhas retrôs; “One Shot”, berrada por Mortensen, que canta na maior parte do tempo; e “Swampland”, uma surf music de garagem excepcional. No final, dado o atraso que o show do Lobão teria, ainda deu para rolar um bis com mais duas. Que tenha colado no ouvido dos que não estavam no terceiro palco.

Rios Voadores e a vocalista malucona da vez

Rios Voadores e a vocalista malucona da vez

Se o show do Mono Men é indicado para uma garage, imagine o de Mark Lanegan… Acompanhado de dois músicos que se revezam em violões, baixo e guitarra, o cantor demorou meia hora para aparecer e tocou 11 músicas que resultaram em duas cenas. Uma delas era de fãs que se aglomeravam na grade e aplaudiam a cada término de canção, e, a outra, de um público que não se sentia tocado pela apresentação e conversava cada vez mais alto durante as músicas. Ora, o show é típica apresentação de crooner para lugar fechado, teatro, barzinho e afins, ainda mais se consideramos o enfoque indie do repertório. De longe a atração mais cara do festival, levando-se em conta o custo benefício (cachê versus quantidade de público interessada). No frigir dos ovos, dois paralelos: Lanegan como espécie de Tom Waits sem carisma e/ou um Chris Cornell sem repertório de sucesso.

Já no terceiro palco, o show de encerramento, com o Suicidal Tendencies, teve procura tão grande que um acordo foi costurado para que Lobão só começasse a tocar depois do término daquela apresentação. Com o repertório mais ou menos igual ao do show do Circo Voador, no Rio, na terça passada (veja como foi), o grupo, pioneiro o skate hardcore, ajuntou uma grande quantidade de público (incluindo o palco invadido), mesmo tendo sido uma das atrações do PR há cinco anos. Mais cedo, antes de o Paralamas terminar o festão, o Krisiun já irrompia tímpanos de forma indiscriminada. Até a segurança se viu em apuros para suportar a pressão da plateia na grade que separa o palco do público. O trio de irmãos abriu com a clássica “Ominous”, passou pelo cover de “No Class”, do Motörhead, e tocou grandes sons (como diz o baixista Alex Camargo), como “Vicious Wrath”, desfrutando de um volume altíssimo, como acontecera com as outras bandas na véspera.

Krisiun: os irmãos Moyses Kolesne e Alex Camargo

Krisiun: os irmãos Moyses Kolesne e Alex Camargo

Se o The Galo Power se destacou na sexta como uma boa revelação do festival, neste sábado outra banda com olhos no passado também chamou a atenção. O Rios Voadores, já no nome, quer ser considerada uma banda muito louca, e talvez por isso a vocalista Gaivota (é sério isso?), de estatura diminuta, exagere nos trejeitos de malucona da vez. Mas ela tem boa voz, sabe cantar e está à frente de uma bela banda de rock de raiz; vamos dizer assim. A referência mais clara são os Mutantes, fase psicodélica, além de um jeitão “fui a Woodstock e não voltei” dos mais interessantes. O sexteto chegou ao Porão, escalado num horário de ouro, por ter vencido um concurso promovido por um dos patrocinadores. Segundo relatos, é a mais querida banda de Brasília momento. Isso para não dizer, como nos velhos tempos, a bola da vez.

Entre as bandas que tocaram mais cedo, realçaram o Rocca Vegas e para o veterano Pastel de Miolos. A primeira, de Fortaleza, é liderada pelo ex-vocalista do Switch Stance, Maurílio Fernandes, e apresenta um bom rock pesado com programações que funcionaram bem no palco principal. O show é super produzido, com uso do telão – coisa rara entre as nadas mais novas - e iluminador próprio. Destaque para “O Espelho”, single do disco de estreia, que mistura peso com batida dançante oitentista. Quase ao mesmo tempo, o Pastel de Miolos, cujos integrantes têm o sobrenome PDM à Ramones, se orgulhava de ser punk. “Isso aqui é punk rock, não é pra ficar sentado, não!”, bradava o vocalista Alisson PDM.

Brenda, a batera prodígio do The Egoraptors

Brenda, a batera prodígio do The Egoraptors

As bandas que abriram os palcos principais não foram muito bem no sabadão. O Saurios, de Brasília, com forte inspiração no rock nacional dos anos 80, por exemplo, cometeu dois erros cruciais: a) Colocar um cover de Legião no repertório, sendo que o tempo é reduzido, e b) Errar a letra desse cover. Já o The Egoraptors, que tem o modelo White Stripes, foi ligeiramente melhor, considerando algumas boas composições e a precocidade da baterista Brenda, que é bem nova e já toca mais que Meg White. Só falta ao grupo arrumar um baixista e completar a formação; até o Jack já sacou isso.

O indie pop interessante do Supercombo, mezzo capixaba mezzo paulista, se deu melhor, mesmo chegando em cima da hora do show. A banda tem um baterista de pegada forte e um tecladista que não esconde o apreço pelo Two Door Cinema Club. O resultado dá em coisa boa a depender de cada música, considerando as escorregadas à Los Hermanos dos dois vocalistas/guitarristas; eita praga! Já a Sexy Fi, de Brasília, faz uma indie meio bossa nova que pouco fica à vontade num palcão como o principal do festival, como aconteceu com Mark Lanegan. Se a vocalista tivesse mais jeito de vocalista e intimidade com o palco, a coisa poderia ser sido melhor. Mas faltam músicas legais mesmo. De longe, ainda deu para ver o “Na Lata”, espécie de Slipknot local, com integrantes usando macacões e enfatizam mais a eletrônica e a percussão. Agora só falta largar a matriz.

O líder do Suicidal Tendencies, Mike Muir, se diverte com a invasão skatista do palco, marca da turnê

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Marcos Bragatto viajou à Brasília à convite do festival.

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