O Homem Baile

Quem viu, viu

Em show recorrente, Glenn Hughes finaliza ‘fase Deep Purple’ em grande estilo e promete turnê com outros períodos de sua rica história. Fotos: Daniel Croce.

Toda a realização de Gleen Hughes no palco: o baixista que mudou a cara do Deep Purple e do rock

Toda a realização de Gleen Hughes no palco: o baixista que mudou a cara do Deep Purple e do rock

Parece que é uma música, mas, de repente, dá sinais de que é outra. E volta, a custa de solos e de improvisações instrumentais arrojadas, a ser aquela que estava sendo tocada antes. No meio, explode um solo de bateria que – não se engane – tem ginga, suingue e, para o bem e para o mal, até um sambinha de leve. Guiada pelo instinto e pela memória afetiva, e bota memória nisso, dada a idade avançada de cada um ali, a plateia reage interagindo com o som alto pra dedéu ao sacudir punhos e bater cabeças do jeito que dá. É assim, quase em estado de transe absoluto, que Glenn Hughes, baixista de uma das mais significativas formações do Deep Purple, bota pra quebrar em uma Sacadura 154 bem cheia, no Rio, na última sexta, 10/11. Coisa linda de ver.

Novidades, não as temos. O show é basicamente o mesmo da turnê anterior, que passou pelo Rio, em 2018, em uma noite daquelas no Circo Voador (veja como foi). Há, inclusive, o decréscimo de número de músicas no repertório – “Smoke on the Water”, veja você, foi limada sem dó – e de tempo, mas também não se pode trabalhar com o cronômetro na mão com um senhor de 72 primaveras muito bem vividas. Ele bem que poderia tocar, por exemplo, em sequência, a íntegra dos dois, ou até dos três discos que gravou com as MKIII e MKIV do Purple - pela ordem: “Burn” (1974), “Stormbringer” (1974) e “Come Taste the Band” (1975) -, que daria mais ou menos a mesma duração desse show. Mas aí, vamos e venhamos, não seria um show da banda de Glenn Hughes como conhecemos.

Søren Andersen, aniversariante da vez e guitarrista dos bons, sola bonito com seu surrado instrumento

Søren Andersen, aniversariante da vez e guitarrista dos bons, sola bonito com seu surrado instrumento

Porque aqui o que conta são as estocadas instrumentais que transformam as músicas em amplos devaneios idílico-setentistas calcados em riffs, evoluções de guitarra, solos de teclado do tipo Hammond, em espécie de “improvisação ensaiada” a custa de muito entrosamento entre os músicos. O guitarrista Søren Andersen (que completou 50 primaveras e ganhou um canto de parabéns pra você), por exemplo, está com Hughes, entre idas e vindas, há mais de 15 anos e faz as vezes de Richie Blackmore como poucos, ainda que de uma maneira meio pessoal. Na exuberante “Highway Star”, já no bis, ele debulha a guitarra na beira do palco lindamente. E olha que essa nem faz parte do repertório gravado por Glenn Hughes no Purple, oportunidade para verificar como a inclusão do modo de tocar grooveado dele, cheio de referências à música negra americana, faz toda a diferença. Admitamos. Com David Coverdale e Hughes, o Deep Purple é outro.

A noite começa com o arregaço que é “Stormbringer”, na qual, em meio a um esporro dos diabos, se vê como o tecladista Bob Fridzema emula um saudoso Jon Lord com maestria, em que pese o gap de 50 anos para esses tempos estranhos. E Glenn Hughes, em meio a agudos e falsetes, confirma ser ele, dentre todos os gogós do Purple e de sua época, o que mantém a melhor saúde vocal. Tem a clássica “Mitsreated”, identificada por Hughes como hit nato dede o nascedouro; tem “Gettin’ Tighter”, que honra a meteórica passagem de Tommy Bolin pelo Purple; e tem aquele ponto alto citado ali em cima, quando “You Fool No One” recebe todo tipo de citação e ainda o momento solo do baterista Ash Sheehan, trajado com uma vistosa camiseta de turista com os dizeres “I love Rio”. Que fofo…

O tecladista Bob Fridzema, que emula um saudoso Jon Lord, Glenn Hughes e o batera Ash Sheehan

O tecladista Bob Fridzema, que emula um saudoso Jon Lord, Glenn Hughes e o batera Ash Sheehan

Novidades, as temos. Segundo Glenn Hughes, ao término dessa turnê, no ano que vem, na perna europeia, ele vai partir pra outra em que pretende incluir músicas de diferentes fases de sua carreira. Um currículo que tem, além do Purple, Black Sabbath, Trapeze, Dead Daisies, a superbanda Black Country Communion, que inclui Jason Bonham, Joe Bonamassa e Derek Sherinian, citada no show, e ainda uma extensa carreira solo. E, melhor ainda, que cogita, a essa altura da vida, um disco de inéditas. Mais um motivo pra quem está diante dessa lenda viva se deixar envolver pela sedutora “Might Just Take Your Life”, a segunda da noite, e se acabar definitivamente com o poderoso riff de “Burn”, um dos mais marcantes da história do rock. A música encerra a festança em grande estilo, com ampla adesão do público, como deve ser um show de rock. Longa vida à voz do hard rock!

Set list completo

1- Stormbringer
2- Might Just Take Your Life
3- Sail Away
4- You Fool No One/High Ball Shooter/Solo de bateria/You Fool No One
5- Mistreated
6- Gettin’ Tighter
7- You Keep On Moving
Bis
8- Highway Star
9- Burn

O batera Ash Sheehan, com a camiseta de turista, na frente da ilustração de setentista de Glenn Hughes

O batera Ash Sheehan, com a camiseta de turista, na frente da ilustração de setentista de Glenn Hughes

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