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Deu fé

Circo Voador lotado atesta a importância da segunda fase do Angra, em autodenominado ‘novo renascimento’. Fotos: Gustavo Maiato.

O vocalista do Angra, Fabio Lione, bem no comando da turnê comemorativa do álbum 'Rebirth'

O vocalista do Angra, Fabio Lione, bem no comando da turnê comemorativa do álbum 'Rebirth'

Não chegou nem na metade do show e já se pode ver um duplo duelo de guitarras entre um desafiador integrante mais recente e o único remanescente da formação original de uma banda que “volta a renascer”. E já se vê, um pouco mais adiante, um intruso percussionista roubando a cena em outro número, rememorando os tempos em que o metal nacional se permitiu flertar com ritmos brasileiros. É o Angra carimbando muito bem a passagem da turnê comemorativa de 20 anos do lançamento do álbum “Rebirth”, aquele que marca o que podemos chamar de segunda formação de uma banda cuja vocação parece ser justamente o recomeço. Tudo isso no palco de um Circo Voador com gente jorrando pelo ladrão, numa daquelas irresistíveis noites de almanaque que só essa lona pode proporcionar.

Retrato que de cara gera reflexões. Primeiro que da formação que gravou “Rebitrh”, de 2001, restam apenas Rafael Bittencourt, um dos guitarristas daqueles duelos citados ali em cima, e o baixista Felipe Andreoli. Depois, que tocar a íntegra de um disco, desde que esse artifício é usado, passa por músicas que podem não funcionar ao vivo. E, por último, a eterna dúvida: teria a fase marcada por Edu Falaschi nos vocais tanta representatividade quanto a clássica, com o saudoso Andre Matos, primeiro e único, à frente? O começo, com a extraordinária “Nothing to Say”, reforça o dilema, mas a tese se esvai quando “Nova Era”, a terceira da noite, abre a sequência “de cabo a rabo” das 11 faixas de “Rebirth”: é de impressionar a mudança de postura do público que se mete em ajustadas – o salão tá lotado - rodas de dança daquelas que nem sempre se vê, em se tratando de metal melódico.

Os guitarristas Marcelo Barbosa, o mais novo na banda, e Rafael  Bittencourt, o mais antigo

Os guitarristas Marcelo Barbosa, o mais novo na banda, e Rafael Bittencourt, o mais antigo

Público que, de fato, não está nem aí pra reflexões cabeçudas em torno de tudo o que já se passou nesses agitados 31 anos de Angra. O que eles querem eles têm e endossam enfaticamente todo o repertório do álbum aniversariante, reforçando, sim, a relevância do período. E não é só em hits do naipe de “Acid Rain”, a tal em que rola o duplo duelo guitarras Rafael versus Marcelo Barbosa, ou da faixa título do álbum, ou ainda na belíssima “Heroes Of Sand”, com o baixo pulsando no peito. Mesmo faixas menos celebradas, como a diferentona “Judgement Day”, ainda que pouco reconhecida; a grooveada “Unholy Wars”, aquela em que Guga Machado arrebenta na percussão; ou o desfecho com “Visions Prelude”, espécie de frustrada tentativa de reviver “Moonlight”, música do Viper que é chave para se entender a criação do Angra, aqui em um momento Pavarotti de Fabio Lione, não deixam a peteca cair.

Rafael Bittencourt não perde a deixa em uma fala de encerramento e vê o período pós pandemia como um “novo renascer”, fazendo a conexão com “Rebirth” - faz sentido -, ao mesmo tempo em que promete um novo álbum em que reflete sobres essas questões. Mas há outras novidades na terceira parte do show, porque em vez de salpicar a noite com clássicos da fase inicial, que no fim das contas só contribui com reles três músicas, a banda corajosamente aponta para uma representante de cada um dos outros discos. O que revela momentos surpreendentes como em “The Rage Of The Waters”, agregada a uma estarrecedora performance de Andreoli, ou na baba “Bleeding Heart’, que funciona bem ao vivo, mas também em outros constrangedores, como o encerramento flácido proporcionado pela falta de pegada de “Upper Leves”.

Lione, dessa vez sem crises, ao lado do baixista Felipe Andreoli, que tem ótima performance

Lione, dessa vez sem crises, ao lado do baixista Felipe Andreoli, que tem ótima performance

Tudo corrigido no desfecho – e no show de rock é a última impressão a que fica – no solitário bis com “Carry On”, inesgotável fonte de prazer para fãs de todas as idades, épocas, fases e formações do Angra. Vale ainda o registro de que dessa vez não teve o terrível piti de Fabio Lione (relembre 2018), que segue sofrendo para atingir as notas mais altas, e da performance animal do esbelto batera Bruno Valverde, cada vez melhor. No fim das contas – repita-se - fica a sensação de reconhecimento da segunda fase da banda, e de que o Angra é uma das poucas dessas formações longevas e muito alteradas, ao menos nessa turnê, que não apelam para os clássicos para manter a atenção no mercado e a fidelidade dos fãs. Ponto pra eles!

“Alecrim! Alecrim! Alecrim!” Era o que aparentemente bradavam os fãs da banda Allen Key, na abertura. Fãs, sim, porque, pouco depois da 20h, verdadeira matinê em se tratando de Circo Voador, já tinha gente à beça para ver o grupo. Mas o show demorou um pouco para engrenar, o que só acontece na parte final, mesmo considerando que o som da banda, confuso, se aproxima de um metal de baixo impacto meio sem razão de se ser, em que pese a figura meio caricata da vocalista Karina Menasce, identificada com subgêneros menos nobres da música. Nada que abalasse a animação dos tais fãs, que, se não cantam junto, atendem às súplicas do palco para bater palmas e erguer os braços direitinho. E fica a dica: o Judas que importa é o Priest.

Rafael Bittencourt, além de ótimo compositor, desfila virtuose em solo de mão trocada no show

Rafael Bittencourt, além de ótimo compositor, desfila virtuose em solo de mão trocada no show

Set list completo Angra:

1- Nothing to Say
2- Black Widow’s Web
3- Nova Era
4- Millennium Sun
5- Acid Rain
6- Heroes of Sand
7- Unholy Wars
8- Rebirth
9- Judgement Day
10- Running Alone
11- Visions Prelude
12- The Course of Nature
13- Metal Icarus
14- The Shadow Hunter
15- The Rage of the Waters
16- Bleeding Heart
17- Upper Levels
Bis
18- Carry On

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