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O clássico e o contemporâneo

Em show de raro acabamento, Dream Theater toca íntegra do primeiro álbum conceitual e mostra as novidades do trabalho mais recente. Fotos: Daniel Croce.

O vocalista do Dream Theater, James LaBrie, com o pedestal do microfone temático do novo álbum

O vocalista do Dream Theater, James LaBrie, com o pedestal do microfone temático do novo álbum

Sobre a plataforma no alto que contorna a bateria, de um lado um sujeito toca um keytar totalmente preto como que se guitarra fosse. Do outro, o guitarrista que vem conduzindo o show desde o início aceita o desafio e incrementa evoluções em seu instrumento que todo mundo ali conhece, mas que, ao vivo, é definitivamente outra coisa. No centro, uma bateria cúbica que obriga o próprio baterista a se esforçar mais que o normal para atingir as peças dependuradas lá em cima, muito embora para ele parece ser tudo fácil, fácil. Embaixo, no centro, um baixista de mil dedos com um baixo de mil e uma cordas que há anos se comunica exclusivamente por música também está na corrida. É essa a polaroid do show do Dream Theater executando a íntegra de uma das suas obras-primas no palco do Vivo Rio, nesta sexta (6/12).

No caso, a primeira delas, ou, por outra, o primeiro álbum conceitual gravado pela banda, “Metropolis Pt. 2: Scenes From a Memory”, que completa 20 anos de lançado esse ano. A música em questão é a sensível “Fatal Tragedy”, uma das descobertas do personagem central da trama que envolve regressão, assassinato, relacionamentos e o escambau. Ela vem colada – os dois atos da obra, com pompa e circunstância mesmo, são assim – na robusta “Beyond This Life”, que realça a permanentemente boa voz de James LaBrie com a cantoria geral da plateia no refrão, e em “Through My Eyes”, para encerrar o primeiro ato. É quando é feita uma sutil homenagem a grandes perdas do rock nos últimos tempos, com Chris Cornell, Keith Emerson e Chris Squire, entre outros, cujos nomes parecem na animação do telão, gravados em lápides. Parece pouco, mas é mais um capricho de uma banda acostumada a dar bons acabamentos nos mínimos detalhes em tudo o que faz.

O tecladista Jordan Rudess, o baixista John Myung, James LaBrie e o guitarrista John Petrucci

O tecladista Jordan Rudess, o baixista John Myung, James LaBrie e o guitarrista John Petrucci

Vale a lembrança de que o disco é o primeiro gravado com o tecladista Jordan Rudess, o dono do keytar preto, e a banda tinha o monstruoso baterista Mike Portnoy. E, ainda, que o álbum é quase um retorno ao rock progressivo clássico, em contrapartida ao prog metal que caracteriza a banda dede o início, mais de 10 anos antes, nos tempos do Majesty. Daí a sensação, durante o show, de estar no meio de outros clássicos do gênero, como “The Wall”, do Pink Floyd, ou mesmo “Misplaced Childhood”, do Marillion, e há muitas passagens de guitarra e bateria que contribuem para isso; marca registrada da banda, que fique claro. O condutor de tudo, citado lá em cima, parece mesmo ser John Petrucci, que brilha não só em solos arrebatadores que executados ao vivo parecem ainda melhores e mais técnicos, mas em boas sacadas como a embalagem, por assim dizer, com sotaque “middle east” de “Home”, uma pedrada nos cornos que o público adora.

Mas – caso tenha passado batido – o Dream Theater é uma banda que não para de lançar discos com material inédito, muitos deles com passos arriscados como o anterior, “The Astonishing” (relembre o show dessa turnê por aqui), e está como o bom “Distance Over Time”, que saiu esse ano, debaixo do braço. Dele entram nada menos que cinco das nove faixas, com destaque para “At Wit’s End”, a mais complexa do álbum, reservada para o bis e que se revela uma composição ainda mais preciosa do que no disco, com o plus do público cantando o refrão a plenos pulmões e a dupla Petrucci e John Myung, o tal baixista caladão, debulhando juntos na beirada do palco; a boa “Barstool Warrior”, com espetacular introdução, sobretudo nas guitarras, e desfile de qualidades de Mike Mangini, o dono da bateria cúbica, que tem performance criativamente impecável durante toda a noite; e a metalizada “Fall Into The Light”, nem sempre incluída nos shows desse giro, que tem as mudanças de andamento que os fãs de progressivo adoram e até um ligeiro cantarolar por parte do público.

Todo o feeling de Petrucci, o condutor do bem acabado espetáculo promovido pelo Dream Theater

Todo o feeling de Petrucci, o condutor do bem acabado espetáculo promovido pelo Dream Theater

Turnê que, se funde basicamente dois álbuns, um novo e outro clássico, implica em ausências significativas para uma banda de existência corpulenta, músicas longas e repertório extenso. Embora tenham entrado duas de 10 anos atrás – a ótima “A Nightmare to Remember” e “In the Presence of Enemies, Part I” -, várias fases relevantes são ignoradas, como as dos álbuns “Images and Words” (1992), e sempre há ingênuos órfãos de “Pull Me Under” aqui e acolá, “Octavarium” (2005); e “Train of Thought” (2003). Mas é o preço a se pagar e, no fundo, no fundo, ninguém pensa nisso no arremate de tonalidades épicas que o show assume já com “One Last Time”; depois com a sobrenatural em mais de um sentido “The Spirit Carries On”, baladaça com solo de fazer guitarrista tocar em precipício; e o ponto final com “Finally Free”, cujas idas e vindas reforçam que, com o Dream Theater, um show jamais será igual a outro, e a expectativa para o próximo é sempre maior.

Set list completo:

1- Untethered Angel
2- A Nightmare to Remember
3- Fall Into The Light
4- Barstool Warrior
5- In the Presence of Enemies, Part I
6- Pale Blue Dot
Intervalo
7- Regression
8- Overture 1928
9- Strange Déjà Vu
10- Through My Words
11- Fatal Tragedy
12- Beyond This Life
13- Through Her Eyes
14- Home
15- The Dance of Eternity
16- One Last Time
17- The Spirit Carries On
18- Finally Free
Bis
19- At Wit’s End

Mike Magini e a vistosa bateria cúbica que parece mais difícil de tocar, mas que, pra ele, é bem fácil

Mike Magini e a vistosa bateria cúbica que parece mais difícil de tocar, mas que, pra ele, é bem fácil

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