O Homem Baile

Vigor independente

Flertando com a mpb, O Terno e Vanguart consolidam carreiras no Lollapalooza; psicodelia do Tagore mostra potencial para crescer. Fotos Divulgação Lollapalooza: Mila Maluhy/MRossi (1), Breno Galtier/MRossi (2) e Camila Cara/MRossi (3).

O vocalista d'O Terno, Tim Bernardes, e o penteado arranjado, de fazer inveja às moças do B 52’s

O vocalista d'O Terno, Tim Bernardes, e o penteado arranjado, de fazer inveja às moças do B 52’s

“Quem aí é de São Paulo e quem é de fora?”, pergunta o curioso Tim Bernardes, para depois se surpreender com a quantidade de pessoas de outras cidades que está interessada n’O Terno. A banda, liderada por ele, é atração do Lollapalooza no sábado (24/3), em um dos palcos secundários, aquele relocado para perto do que era o palco mais longe de todos. O trio, dessa vez acrescido de um naipe de metais com outros três músicos, tem o público na mão, com praticamente todas as músicas cantadas de cabo a rabo. Todo trabalhado nos uniformes vermelhos e com cores berrantes no telão fazendo um bom contraste, o grupo explora a figura estranha de seu vocalista, alto, esguio e com um penteado cuidadosamente arranjado, de fazer inveja às moças do B 52’s. Bernardes também adota o gênero “indie sem noção” ao falar, o constrangedor procedimento usado por inefáveis figuras como – com o perdão da citação – Clarice Falcão e Mallu Magalhães.

Musicalmente, a utilização dos metais dá um substancial acréscimo às músicas (caso de “Depois Que a Dor Passar”, com uma tuba, e “O Orgulho e o Perdão”, quase um samba de gafieira), mas, por outro lado, retira peso de outras, alterando o que o Terno tem de melhor: a atuação como power trio de raiz, por assim dizer. Nessa seara destacam-se “O Cinza”, e dá-lhe citação de Jimi Hendrix, com direito a um ótimo solo de Bernardes, “Bote ao Contrário”, um samba torto, até pela letra fincada na tristeza, que se converte em rock, torto também. Torto, aliás, é o vocábulo que melhor define o grupo, desalinhado com tudo o que se conhece na música, e talvez esteja aí seu grande atributo. De todo modo, o show agrada a um público bem grande, considerando-se o horário, com todo mundo – repita-se - cantando tudo. No final, Tim Bernardes se desvencilha da guitarra para se entregar ao público, em “66″. Um ao outro merece.

Na sexta, dia 23, um pouco mais cedo no palco ao lado, coube ao Vanguart entreter o público debaixo de um sol escaldante, e a banda, de carreira já bem longa – estão na ativa desde 2002 – fez uma ótima apresentação. A mistura de rock, mpb e folk, com tantos sotaques e letras em mais de um idioma agradou bastante, o que fortalece a ideia de uma carreira duradoura sem necessariamente sob as luzes do estrelato. Para quem achava que a banda vive só de “Semáforo”, um dos grandes hits indies há mais de uma década, se surpreendeu ao ver músicas como “Se Tiver Que Ser Na Bala Vai”, com realce nas guitarras surf, e a triste “…Das Lágrimas”, por exemplo, serem cantadas por muita gente no meio do público que vinha chegando.

O vocalista e guitarrista Hélio Flanders, que impingiu um tom libertário ao ótimo show do Vanguart

O vocalista e guitarrista Hélio Flanders, que impingiu um tom libertário ao ótimo show do Vanguart

Nessa última, o telão exibe a imagem da vereadora Marielle Franco (e não seria a única vez no festival), executada à bala no Rio, e o show ganha ares de libertário, nas falas do vocalista e principal compositor do grupo, Hélio Flanders. “Eles não podem escolher quem a gente quer amar” e “Vamos seguir fazendo as nossas coisas”, em um tom de esperança e incentivo, foram os mais fortes. Apesar das intensas trocas de instrumentos que prejudicam a dinâmica do show, o grupo consegue enfileirar boas sequências, e é aí que “Semáforo”, única música do bom álbum de estreia, lançado em 2007, brilha (relembre a matéria da época). “E o Meu Peito Mais Aberto Que o Mar da Bahia”, com um “quê” de Azimuth e letra que é a cara de Flanders, e “Todas as Cores”, belo exemplo de indie pop colante, também se destacam nesse bom show.

Abrir o palco principal de um festival como o Lollapalooza não é tarefa fácil, ainda mais quando sobra para a banda a tarefa de passar o som diante do público. “Voltem daqui a 20 minutos, hein!”, alerta uma voz que vaza do PA para os ouvidos de todos. Público ralo, mas também interessado, senão não estaria queimando a mufla ao meio dia e meia de um sábado de sol (23/3). Dito e feito, o Tagore volta ao palco pontualmente, um pouco sem jeito até engrenar o som que cede boas doses de piscodelia ao rock nacional, em um modo de ser que melhoraria bastante se os arranjos tivessem um pouco mais de peso; dá pra fazer muito mais esporro (ao vivo então!) com duas guitarras afiadas como essas.

A banda, do Recife, gira em torno do vocalista e guitarrista Tagore, que é também o responsável por quase todos os solos. O de “Apocalipse Jeans” é um dos melhores da tarde, e a música se destaca justamente porque há efetiva participação de todos os músicos em um excelente crescente instrumental. O grupo também se destaca pela verve de letras incomuns no cenário do rock nacional, o que se percebe, neste show, por conta do som equalizado baixo demais. De todo o modo, dá para salientar a ótima “Mudo”, que convence mais pela economia do que pelo exagero comum ao psicodelismo; e “Reflexo”, cuja mudança de andamento surpreende um início meio morno. Um bom show de uma banda com potencial para ser desenvolvido.

Tagore, o homem que dá nome à banda que lidera: fornecendo doses de psicodelia ao rock na nacional

Tagore, o homem que dá nome à banda que lidera: fornecendo doses de psicodelia ao rock na nacional

Set list completo O Terno:

1- A História Mais Velha do Mundo
2- Deixa Fugir
3- Lua Cheia
4- Eu Confesso
5- Depois Que a Dor Passar
6- O Orgulho e o Perdão
7- Bote Ao Contrário
8- O Cinza
9- Volta
10- Culpa
11- Ai, Ai, Como Eu Me Iludo
12- Melhor do Que Parece
13- 66

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