Som na Caixa

Madame Saatan

Peixe Homem
(Doutromundo Discos)

madamepeixeSe Belém fosse uma cidade do meio oeste americano, certamente o Madame Saatan seria considerado uma revelação na new wave of american heavy metal. Embora à primeira vista este novo álbum pareça uma compilação de clichês do gênero, reserva, no fundo, como espinha de erupção inevitável, um bom apanhado do que o heavy metal moderno tem expelido nos últimos tempos. É o quarteto, antes indeciso, atirando os dados, agora com o foco ajustado apostando certo na roleta viciada que lhe é oferecida com a última bala que resta na garrucha. E o tiro precisa ser certeiro.

O disco já começa como o heavy metal deve ser: sem dó nem piedade de quem ousa ouvi-lo. Os riffs pesadões de “Respira”, “Fúria” e “Até o Fim” despertam instintos irracionais que a humanidade guarda para ocasiões especiais, mas revelam música de grande apelo, que não são fechadas em si próprias. Ao contrário, cada uma é quase um convite para um bater de cabeça automático na janela ou a dar um mosh do sofá para o chão da sala. A sacada está não só nas boas composições e na pegada firme e sabbathiana de Ed Guerreiro, mas também na boa percepção da produção, que dá certo tempero cativante (pop, por que não?) a um gênero muitas vezes condenado ao gosto de poucos iniciados.

É bom ver que o Madame, nesse “Peixe Homem”, se livra das referências ao nu metal, coisa que nem os baluartes do gênero vêm conseguindo, e se apega justamente ao âmago, fazendo uma espécie de atualização do peso. Prevalece o riff ao solo; a cadência à correria; o peso à velocidade. Atento, o grupo também ignora os nocivos ritmos regionais, mas Sammliz usa o potente vocal - dádiva dos Deuses – na abordagem de temas incomuns ao heavy metal, extraídos, aí, sim, da cultura local, sem deixar de ser global, em bom (e audível) português. Estampa, no imaginário do ouvinte, visuais inverossímeis na linha do “incrível, fantástico, extraordinário”. É sangue, punhal, fogo, foice, sacrifício, morte… Alto lá, não é essa a paisagem do heavy metal? Sammliz pinta o velho quadro com novas tintas. Sem vomitar tijolos como Angela Gossow ou buscar as notas altas de Tarja Turunen, empresta uma inusitada virilidade ao vocal feminino no metal, que ganha nova dimensão.

Não é possível respirar num disco em que a guitarra, absoluta, não dá trégua, ao mesmo tempo em que, ao seu modo, é ela própria que conduz o ouvinte a assoviar tudo o que é música. A tensão de “Rio Vermelho” deságua num refrão em que guitarras distorcidas parecem falar; em “Moira” o riff sugere um cantarolar tão óbvio que nem a vocalista resiste; a nervosa “Sete Dias” fala de macumba sem lhe pegar nada emprestado, fazendo uso de um inusitado “balanço”; e a balada exemplar “A Foice”, além de salientar o alcance vocal de Sammliz, tem tudo para ajudar o grupo a aparecer em cenários ainda refratários à música pesada. Mais do que um grande disco, “Peixe Homem” é uma paulada na moleira daquelas que o sujeito não tem vergonha de pedir mais.

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Comentários enviados

Existem 2 comentários nesse texto.
  1. Mario em setembro 19, 2011 às 11:18
    #1

    Conheço o Madame Saatan há longos tempos, desde o quarto adaptado nos primórdios da residência-loja do Natalicio.

    E tenho encanto em dizer, sem dúvida alguma, de que pela primeira vez percebo que de Belém sai uma banda que considera as raízes, no entanto, não se desvincula de uma expressão também universal. Quem aqui reside consegue perceber algumas raízes na banda, no entanto, essas expressões aparecem sutilmente, por isto não cai em um simples regionalismo.
    A banda esta ficando cada vez mais racionalizada (no bom sentindo da expressão). Amadurecimento visível dos integrantes, tanta em sua expressão musical como visual.
    O Madame Saatan conseguiu explorar um espaço muito disputado. E talvez, pelo nome, não tenha ido mais além, pois sabemos o peso midiático negativo que a palavra representa. Mas isto pouco importa para os amantes do estilo, no entanto, acredito que seria midiaticamente mais plausível se a banda alterasse o nome apenas para Madame, pois assim teria mais entrada na grande mídia (eu não ia gostar, mas sou amante da música deles de qualquer maneira)
    Sem dúvida alguma, a banda conseguiu encontrar a harmônia secreta necessária para uma carreira artitistica e profissional.

  2. Jorge Luis de Sousa Leite em agosto 26, 2012 às 22:30
    #2

    Gostei muito do som que eles fazem viva o rock and roll sempre

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