O Homem Baile

Monstro do Metal

Vinte e cinco mil pessoas celebraram a banda mais cultuada da história o rock pesado. No templo do samba, o Iron Maiden pôs fãs para chorar com canções do início de carreira. Publicado na edição de hoje do Jornal do Brasil. Foto: Daryan Dornelles/Divulgação.

O vocalista Bruce Dickinson comanda a apoteose do metal oitentista

O vocalista Bruce Dickinson comanda a apoteose do metal oitentista

Não era bravata a promessa feita por Bruce Dickinson no show do ano passado, em São Paulo, de que o Iron Maiden voltaria ao Brasil com um espetáculo ainda maior este ano. Cerca de 25 mil fãs do grupo compareceram sábado, na Praça da Apoteose, e viram a exuberância da parte final da turnê “Somewhere Back In Time”, criada para reviver a época em que o grupo explodiu no cenário mundial da música pesada, nos anos 80, e extrapolou os (às vezes estreitos) limites do heavy metal. Com 13 mudanças de cenário, a entrada de duas versões da mascote Eddie, muitas explosões e pirotecnia, além de sucessivas trocas de figurino do próprio vocalista, o grupo emendou 16 músicas em quase duas horas, numa apresentação teatral de tirar o fôlego.

– Disseram que esse lugar é do samba, achei que não teria fãs de heavy metal – brincou Bruce Dickinson, numa alusão à Marquês de Sapucaí. – No ano passado, não tocamos aqui, mas agora mudamos o repertório para compensar.

Logo depois, anunciou “Children of the Damned”, a quarta da noite, jamais tocada pelo grupo nas outras sete oportunidades em que passou pelo Brasil. O guitarrista Adrian Smith sacou do baú uma guitarra de braço duplo e valorizou a versão ao vivo da música, uma das primeiras compostas quando Bruce entrou no Iron Maiden, em 1981, em substituição a Paul Di’Anno, o vocalista original.

No meio da plateia, quem vibrou foi o militar Fábio Luquesi, que elegeu o álbum “The Number of the Beast”, com a estreia do novo vocalista, o preferido. Mas ele não se considera apegado à fase antiga da banda.

– Turnê do Iron Maiden vale a pena por qualquer música. Quando tem o disco novo, a gente aprecia o que eles fazem de mais atual, e aqui lembramos do tempo em que começamos a escutar – comparou.

Acompanhado da esposa e do filho de 14 anos, Luquesi garante que o caçula de 2 pede para ouvir Iron Maiden todos os dias. Já o economista Carlos Augusto vê na turnê a possibilidade de resgate de um tempo que os fãs mais novos não puderam acompanhar:

– É legal porque eu era muito pequeno na época e não consegui ir ao show do Rock In Rio – lembra ele, que vai seguir a banda em São Paulo, Belo Horizonte e Brasília. – Teve gente que começou a gostar de Iron Maiden depois da fase de ouro. Não é uma turnê revivalista, eles só dão uma parada nas músicas dos discos mais recentes.

Soldado do século 19

Augusto faz coro com as declarações de Bruce Dickinson no longa “Flight 666 – O filme”, que teve pré-estreia mundial antes do show, à tarde, no Cine Odeon (leia na página B2). O documentário, dirigido por San Dunn e Scot McFadyen, os mesmos de “Metal – Uma Jornada Pelo Mundo do Heavy Metal” (2005) e “Global Metal” (2008) – mostra a primeira parte dessa mesma turnê, quando a banda fez um giro de 70 mil quilômetros pelos cinco continentes, num total de 23 shows em 45 dias. No filme, o vocalista, que pilota o Ed Force I, customizado com a mascote Eddie, aparece como comissário Bruce, com uniforme e tudo. Os números impressionantes só foram alcançados graças à adaptação feita numa aeronave para transportar os músicos, a equipe de palco e ainda as toneladas de equipamentos e cenários dessa turnê.

Um desses cenários é o da música “The Trooper”, uma das mais velozes e empolgantes do Iron, que traz Bruce vestido como um soldado da cavalaria inglesa do século 19 agitando bandeiras britânicas carcomidas por batalhas campais. Antes, em “Phantom of the Opera”, uma das cinco que foram incluídas nessa última fase da turnê, o vocalista aparece impossível nas várias mudanças de andamento que a música oferece, subindo e descendo as plataformas de dois metros de altura que circundam o fundo e as laterais do palco.

“Rime of the Ancient Mariner”, com inacreditáveis 13 minutos de duração, encerra a primeira hora do show. A música é baseada numa fábula do poeta romântico inglês S. T. Coleridge, cuja moral da história é anunciada por Bruce Dickinson:

- Quanto mais o homem destrói a natureza, mais ela se volta contra o homem.

E aí que o grupo protagoniza um de seus momentos mais emblemáticos, quando os três guitarristas e o baixista Steve Harris empunham os instrumentos à beira do palco, numa coreografia ensaiada de arrepiar, reafirmando que o Iron Maiden é, antes de tudo, uma banda de guitarras.

Eddie aparece em duas versões e surpreende plateia

O público participa sem parar, quase sempre com os braços erguidos e punhos cerrados, justificando a inclusão de “Fear of the Dark” no repertório, já que a música é a única intrusa no chamado período de ouro do grupo, mas tem forte apelo popular. Fato que se repete na delirante Hallowed be thy name, outra pinçada do álbum The number of the beast. É o momento único para o representante comercial Carlos Oliveira, 33 anos, que também aposta na possibilidade de reviver uma época que não pôde acompanhar direito.

- Quando eu tinha a idade do meu filho, de 11 anos, eu fui ao Rock in Rio I nas costas do meu pai, e hoje estou aqui e com os dois. São três gerações de fãs do Iron Maiden – vibra, apontando para o pai, Jonser, 56, e para o filho Caio, debutante na festa do heavy metal.

O desfecho do show se dá quando uma gigantesca cabeça de esfinge se abre no fundo do palco, na música Iron Maiden, de onde surge a mascote Eddie. Ela aparece como uma múmia gigante pendurada, ameaçando se jogar sobre o público e soltando faíscas pelos olhos enquanto labaredas saem das plataformas em direção ao teto do palco. O bis traz a esperadíssima “The Number of The Beast”, com direito à presença da própria besta, sentada numa das plataformas. Para surpresa geral, em “The Evil That Man Do”, Eddie reaparece, com três metros de altura, caminhando pelo palco, dessa vez reproduzindo o estilo “cyber” da capa do álbum “Somewhere In Time”.

Ainda houve tempo para Bruce Dickinson apresentar cada integrante da banda, fazendo piada com todos, durante a última música, a pré-histórica “Sanctuary”. O vocalista falastrão aproveita para chamar o público (que não para de cantar olê, olê, olê, Maiden) para assistir ao filme do grupo, ao mesmo tempo em que promete um disco de inéditas para o ano que vem e a volta ao Brasil em 2011. Que ninguém duvide de quem promete e costuma cumprir.

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