Rock é Rock Mesmo

Escrevendo para iniciados

Depois de idas e vindas, voltas e revoltas, nosso colunista descobriu que escreve para iniciados. E isso entre rainhas da idade da pedra, ícones da literatura nacional e a máscara que cai. Publicado originalmente no Dynamite on line.

Meus amigos, os cães ladram. Mas a caravana não pode parar. Não para, não para, não para, não. Certa vez, descontente com o desempenho de determinada banda num show, fazia minhas queixas ao amigo Marco Antonio Barbosa, o Bart, também jornalista – um dos melhores que se conhece, aliás - já do lado de fora da casa de espetáculos. Ele, ao contrário, estava radiante com o que vira lá dentro. E, durante a conversa, saiu com a frase lapidar: “foi um show para iniciados”. Achei a argumentação patética, e, de pronto, parti para o deboche. Depois, em outras coberturas, usei a mesma expressão, a nefasta “para iniciados”, para retirar toda a lógica que nela poderia estar contida.

Mas o tempo é o senhor da razão. Acontece que, anos mais tarde, estávamos nós, eu e Bart, num animado chope pós show, desta vez num bar classemediano, onde efusivos argumentos eram colocados, contra e a favor. Aquela coisa que invariavelmente acontece. Eis que, do nada, num típico ato falho freudiano, saí com a insensata frase: “foi um show para iniciados”. Bart não se conteve. Cresceu e foi à forra com todo o direito que lhe cabia, enquanto eu, no auge da minha resignação, admitia e revia, em frações de segundo, e em meio aquela barulheira dos diabos, toda a questão.

Lembro-me também, se me permite o leitor, de outro caso. Em uma das faculdades eu fiz, sempre reclamava do nível do ensino lá praticado. É até anacrônica uma avaliação desse calibre de minha parte, uma vez que, assim, estaria eu, de certo modo, desvalorizando meu próprio saber. Mas os meus queixumes eram que, na época, dada a desqualificação generalizada dos alunos, salvo raras exceções, os professores acabavam buscando um curso que se aproximasse daquela realidade, reduzindo, e muito, a qualidade do ensino. Me sentia desconfortável com essa história, já que, no meu ponto de vista, o bom nível deveria ser mantido, e, aqueles que não conseguissem acompanhar, que fossem, ora pois, vender sanduíche natural na praia.

Digo isso porque, dado o retorno que tive na semana passada, percebi que existe uma distância abissal, aqui nesta coluna, entre quem escreve e quem lê. Eis aonde eu queria chegar: estou escrevendo para iniciados. Não sabia, mas ao criar um espaço para pensar o rock, acabei descobrindo como pensam mal os que gostam de rock. Disse isso e já retifico. Eles não pensam mal. Parte deles é que assim o faz. Embora não se possa atribuir precisão e fidelidade estatísticas a uma série de depoimentos soltos na Internet, há que se elucidar certas conclusões. Uma delas é essa. Boa parte de quem anda lendo esta coluna não entende lhufas do que quero dizer. E digo isso sem a mínima falsa modéstia. A outra recai numa teoria que há anos desenvolvo: a de que, o conteúdo e o entendimento de um texto, depende muito mais de quem lê do que de quem escreve. Mas isso eu deixo para uma outra oportunidade. O que importa agora, é decidir se faço como os acadêmicos da faculdade e transformo este espaço em algo pueril e corriqueiro, para atender aos tolos, ou se, de outro lado, persevero no exercício de pensar o rock, objetivo que norteou a criação desta coluna. Ou seja, se continuo a escrever para iniciados. (Não sei por que, mas acho que isso tem alguma coisa a ver com Patton).

E tem mais. Como dizia o Mestre, a juventude tem todos os defeitos de qualquer pessoa, e um a mais: a imaturidade. E eu completo: a juventude tem todas as virtudes de qualquer pessoa, e uma a mais: a imaturidade. Depende, em cada caso, de cada indivíduo. A única coisa que não se admite na doidice juvenil é a recusa do aprendizado. O jovem que não olha para trás e não se interessa pelo novo, pelo conhecimento, pela evolução intelectual, é mais velho que as pirâmides do Egito. Digo isso porque, acreditem, sou adolescente há mais de vinte anos.

Carlos Heitor Cony disse que a Internet virou tribuna de “desocupados, frustrados que desejariam ser comentaristas de política, esportes, economia e cultura, ditando regras disso e daquilo”. Ele tem razão. Primeiro, porque é o Carlos Heitor Cony; segundo, por ter convivido muitos anos com o Mestre; e terceiro, porque, quem lê rotineiramente esta coluna, sabe. Há tempos venho desenvolvendo um raciocínio semelhante. E, de acordo com o que vi na última semana, a Web também virou divã para uma série de desajustados e pessoas com desvios de personalidade, que, se na telinha se escondem por meio de alter egos, na vida real compõem um mundo horroroso e bizarro. (E a imagem de Patton não me sai da cabeça). Mas, afirmo, a Internet é como a juventude, tal qual citada ali em cima. E vou mais longe. Pode ser, também, mera ferramenta, útil como um churrasco grego (na hora da comunicação fácil, ágil e de baixo custo, por exemplo) ou fútil como quem a usa (no caso citado por Cony).

O leitor que chegou até aqui deve estar se contorcendo na cadeira. Onde está o rock? Ele pergunta, agoniado e contrariado. Onde esse sujeito quer chegar? Questiona-se, no âmago. E eu respondo. Tá aqui no último disco do Queens Of The Stone Age que o grande Bruno baixou e me passou, mas que vou deixar para a semana que vem. Sabe, não gosto de misturar a coisas. Há que se terminar um assunto para iniciar-se outro. Ademais, é sabido, não sou o jornalista do tipo novidadeiro.

Por fim, tenho que citar uma frase que, se por um lado já encheu o saco de muita gente por aí (onde me incluo), de outro se encaixa direitinho para arrematar a coluna de hoje. E, ao mesmo tempo, para agradecer e homenagear umas das cabeças pensantes do rock que rola por essas terras (e ao mesmo tempo brindar a todos os outros iniciados que se manifestaram). Alguém que lê Rock é Rock Mesmo e entende. Uma iniciada nata. “O importante é ser você, mesmo que seja estranho, mesmo que seja bizarro”.

Até a próxima, e long live rock’n’roll!!!

Tags desse texto:

Comentários enviados

Sem comentários nesse texto.

trackbacks

There is 1 blog linking to this post
  1. Rock em Geral | Marcos Bragatto » Blog Archive » E agora vou esclarecer

Deixe o seu comentário

Seu email não será divulgado