O Homem Baile

Em forma

Na ponta dos cascos, The Mission passeia pela própria carreia em performance segura e contagiante no Rio. Fotos: Daniel Croce.

O líder, vocalista e guitarrista do The Mission, Wayne Hussey, em noite de boa performance da banda

O líder, vocalista e guitarrista do The Mission, Wayne Hussey, em noite de boa performance da banda

Não é nada, não e nada, mas já se passa quase uma hora e meia de show, quando o vocalista, ao se ver sozinho na grade que separa o palco do público, opta por sair de cena à espera do bis. A música, em princípio, nem é um dos grandes hits deles, mas é de longe a que mais empolga. Pelo início com acordes repetidos, com um crescente instrumental que explode no refrão e faz a plateia cantar a plenos pulmões e acompanhar o ritmo com a palmas de modo contagiante. É mais ou menos assim que a primeira parte do show do The Mission é encerrada, já na madrugada desta segunda (24/10) na Sacadura 154, no Rio, com Wayne Hussey comandando a cantoria ampla, geral e irrestrita em “Deliverance”, colado na grade.

O bom é que o vocalista e guitarrista, líder e mentor da banda desde que foi saído do Sisters Of Mercy, lá em meados dos anos 80, dado a humores etílicos, bebe seu vinhozinho e está aparentemente bem e, de certo modo, encantado com o público. Uma plateia animadaça, a bem da verdade, considerando um show em um domingão que começa tarde pra dedéu, o que garante uma excelente interação público/banda na maior parte do show. Sobretudo em grandes sucessos – ou hits do nicho, vá lá – como “Severina”, curiosamente cantada em coro em português mesmo; a lindaça “Belief”, incluída do repertório de última hora; e as soturnas – é pós punk, oras –, mas igualmente boas “Garden Of Delight” e “Wasteland”, ambas do estonteante álbum de estreia do Mission, “God’s Own Medicine”, de 1986.

O guitarrista Simon Hinkler, com ótimas inserções durante a noite de casa cheia na Sacadura 154

O guitarrista Simon Hinkler, com ótimas inserções durante a noite de casa cheia na Sacadura 154

Ressalte-se que a formação atual, a mesma que esteve aqui em 2014 (relembre), é quase a original, contando com o caçula Mike Kelly nas baquetas, e isso já há mais de 10 anos. Ou seja, temos uma banda afiada, o que resulta em um realce nas principais características do Mission: o uso equilibrado de bateria eletrônica e acústica – com boa performance de Kelly – juntas; o baixo de sonoridade própria de Craig Adams, mas aqui menos exposto; a guitarra minimalista inventada por Hussey e por Gary Max no Sisters que Simon Hinkler soube converter em algo “mais rock”, com riffs e solos; e a crescente rítmica das músicas, que começam lentamente e aos poucos atingem uma pressão daquelas, ainda mais ao vivo. E ainda mais quando é possível reunir um bom apanhado de boas composições.

Entre elas, as mais conhecidas, há um grande passeio que cita quase toda a discografia da banda, que vai além do auge logo de cara com os álbuns iniciais. Do mais recente, “Another Fall From Grace”, de 2016 (são dois discos lançados com essa formação) a banda descola a macia “Within the Deepest Darkness (Fearful)”, que compõe muito bem o concatenamento das músicas do set. Tem coisas menos conhecidas que também não comprometem, como “Afterglow”, na qual Wayne Hussey canta mais do que toca e Hinkler descola um belíssimo solo, e a sensacional lembrança de dois covers que viraram marca registrada do início da banda: “Tomorrow Never Knows”, da fase psicodélica dos Beatles, logo a segunda, e “Like a Hurricane” de Neil Young, em linda versão.

A firmeza do baixista Craig Adams, destaque que vem desde os tempos do Sisters Of Mercy

A firmeza do baixista Craig Adams, destaque que vem desde os tempos do Sisters Of Mercy

Com os dois bis o show gira em torno de duas horas, mas é tanta lembrança tanta música boa que marcou (ao menos) uma geração que não dá para não registrar ausências como “And The Dance Goes On”, “Serpents Kiss”, a romanticaça “Stay With Me”, “Blood Brother”, “Over the Hills and Far Away” e por aí vai. Pleito que se esvai, contudo, primeiro pela boa e entrosada performance do quarteto como um todo, e depois, por destaques notáveis como a soturna e inesperada versão para “Dance on Glass”, a sempre empolgante “The Crystal Ocean”, e o desfecho do segundo bis, com a longa e por isso mesmo mais bonita ainda “Tower of Strength”. Intitulada “Déjà Vu Tour”, a turnê tem cara de despedida, mas - vamos e venhamos - parar pra que?

Set list completo:

1- Beyond the Pale
2- Tomorrow Never Knows
3- Into The Blue
4- Within the Deepest Darkness (Fearful)
5- Garden of Delight
6- Severina
7- Afterglow
8- Grip Of Desease
9- Like a Child Again
10- Butterfly on a Wheel
11- Wasteland
12- Deliverance
Bis
13- Dance On Glass
14- Like a Hurricane
15- The Crystal Ocean
Bis
16- Belief
17- Tower of Strength

Craig Adams, Wayne Hussey e Simon Hinkler e o ótimo baterista Mike Kelly no fundo do palco

Craig Adams, Wayne Hussey e Simon Hinkler e o ótimo baterista Mike Kelly no fundo do palco

Tags desse texto:

Comentário

Seja o primeiro a comentar!

Deixe o seu comentário

Seu email não será divulgado