A festa estava toda armada para o Autoramas lançar o novo álbum, “O Futuro dos Autoramas”, no Imperator, no Rio, nesta sexta (8/4). Som passado, banquinha de CDs montada, cenário arrumado, banda de abertura com muita disposição… Só faltou o público. Ou, por outra, as cerca de 100 pessoas que foram até o Méier é que aproveitaram a ótima apresentação da banda, cuja nova formação, de quarteto, está completando um ano. Com ainda mais rodagem e segurança, os músicos mostraram boa parte do novo repertório, entremeado por grandes sucessos do passado. Daqui pra frente, pode-se cravar o marco histórico de antes e depois do Autoramas (leia aqui uma entrevista com a banda).

É que existem, ao menos, dois Autoramas. Um é o trio de rock retrô garageiro que se estabeleceu com invejável carreira autossustentável até 2014. O outro é o New Autoramas, um quarteto formado às pressas com músicos rodados – o que é ótimo – que ainda busca adaptação e entrosamento adequados para a nova realidade. Por isso, caso um desavisado fã adentrasse o salão durante “Demais”, uma das músicas novas, pensaria estar em um show da nova formação da Penélope, muito pela voz doce e cativante de Érika Martins. Se chegasse em “I Saw You Saying (That You Say That You Saw)”, com o olhar fixo no baterista Fred Castro, arriscaria se tratar de uma banda cover de Raimundos, uma vez que nem todos sabem que a singela canção é assinada por Gabriel Thomaz.

Mas quem conhece o grupo – e há um punhado de amigos de sempre que fortalecem o ralo comparecimento de público - não se engana. Reconhece de estalo o ótimo repertório construído pelo hitmaker Gabriel, e de certa forma se surpreende com o vigor com o qual as musicas são tocadas. O volume de som generoso, um peso extra reforçado pela mão viril de Fred , as indefectíveis distorções do baixo, agora com o onipresente Melvin, mais realçadas que antes, e até a adição de teclados contribuem por demais para o up grade do New Autoramas. De certo modo o show é, também, uma celebração à experiência dos quatro músicos que brilham no palco, com vasta folha corrida no rock nacional, cujo reconhecimento, no entanto, nunca é pleno. Nessa seara, é preciso, sim, provar tudo de novo a cada dia.

O show é primeiro do lançamento do disco no Rio, e são sete as músicas dele tocadas durante a noite. A melhor delas, disparado, é “Quando a Polícia Chegar”, que funciona muito bem ao vivo, e, pela força da música em si, é a que abre o show na prática. “Problema Seu”, de andamento até certo ponto sombrio, é outro achado de composição e enfatiza a peculiar visão de Gabriel Thomaz sobre as relações, caso também de “O Que Que Você Quer”, do verso quase metafísico “O que que você realmente quer?”, talhado para o divã. Mesmo que não sejam ainda tão conhecidas pelo público, todas se inserem muito bem no repertório - a instrumental “Telecatch” é pretexto para pequenos solos de cada um –, que, não custa repetir, é recheado de grandes números do cancioneiro autorâmico. E o New Autoramas aproveita com muita propriedade.

O melhor, contudo, está na intercessão mantida entre o Autoramas e o New Autoramas. Primeiro, a presença do rock hero Gabriel Thomaz, que garante, além das boas músicas, um show de rock como deve ser. Depois, é que a banda segue muito boa de palco, senão melhor que antes – a estrada é longa - já bem mais adaptada do que há um ano, quando estreou (relembre o show do Circo Voador), fato que reforça o bem que um palco faz. Por último, mas não em último, ressalta-se a força de músicas como “Fale Mal de Mim”, o maior hit da banda; “Abstrai”, numa embalagem mais pesada e segura; “Catchy Chorus” e a vocação do rock para o rebolado; e o esplendor de “Você Sabe”, quase um hard/classic rock de tão encorpada. Coladinha na já citada “O Que Que Você Quer”, forma o melhor momento da apresentação, se for para citar apenas um.

A abertura ficou por conta da Facção Caipira, que também está com um álbum novo na praça, “Homem Bom”, lançado em setembro. O grupo tem formação distinta, sem guitarra e com violão ressonator e harmônica praticamente em todas as músicas. O que encaixa muito bem no blues rock/bluegrass defendido pelo quarteto. Mesmo porque Jan Santoro sabe tirar um som mais clássico de guitarra, usa slide guitar com perfeição e as composições são assaz interessantes. As melhores são “Ex-fumante”, “Blues Brasileiro” e “Tiro e Queda”. O show ainda tem duas participações antagônicas. Primeiro, a voz exuberante de Rebeca Sauwen, da banda Gragoatá, na emblemática “Ressaca”, e, depois, uma dançarina meio nada a ver em “Levada”, que ajudou a divertir o público muito reduzido. Mesmo assim, saldo altamente positivo para os caras.

Set list completo Autoramas:

1- Mundo Moderno
2- Quando a Polícia Chegar
3- Nada a Ver
4- Abstrai
5- Couldn’t Care At All
6- Música de Amor
7- Problema Seu
8- I Saw You Saying (That You Say That You Saw)
9- Verão
10- Você Sabe
11- O Que Que Você Quer
12- Paciência
13- 1,2,3,4
14- Demais
15- Jet to the Jungle
16- Jogos Olímpicos
17- Catchy Chorus
Bis
18- Resta Um
19- Telecatch
20- Fale Mal de Mim

Tags desse texto: Autoramas, Facção Caipira