Não cria limo
Ousado, Violeta de Outono reaparece no Rio seis anos depois e dá ênfase ao material mais recente em show pouco concorrido. Fotos: Daniel Croce.
Para quem ainda está com a ideia da fabulosa formação da década de 1980, cuja sonoridade pós punk era elemento primordial no Violeta, vale o registro que o grupo, ao menos desde “Volume 7” (resenha aqui), encara o rock progressivo de raiz e busca o equilíbrio entre o cativante e a virtuose típica do gênero, em que pese o talento de Golfetti para criar climas indeléveis e, ao mesmo tempo, que lhe são facilmente reconhecíveis. É o que realça no material novo, quando o som de guitarra único do Violeta aparece carimbado em “Solstício”, música que nem se enverada tanto pelo instrumental coletivo, mas não disfarça todas as características do jeito Violeta/Golfetti de compor.
Na formação atual, desempenha papel de destaque o tecladista Fernando Cardoso, identificado com o rock progressivo “das antigas”, e que interfere diretamente em músicas como “Ondas Leves”, por exemplo. Com longa introdução instrumental e climática, a peça progressiva reserva uma verdadeira cama de teclados para que Fábio Golfetti entre solando, antes de “desafiar” o baterista José Luiz Dinolá para um breve duelo que se logo transforma em um solo de bateria. Curto, mas eficiente, emblematiza de certa forma a atual fase do Violeta de Outono. Em “Montanhas na Mente”, a tonalidade melódica, marca registrada do grupo, se mistura com uma base progressiva das mais consistentes, e “Eyes Like Butterflies” reúne talvez a maior sintonia entre os teclados e a guitarra “glissante” que está encravada no “Violeta way of sound”.“Só tocou o ‘Volume 7’! E o resto?”, gritou um gaiato lá do meio da plateia, aproveitando o clima intimista do Rival praticamente vazio, com pouco mais de uma hora de show. É que Fábio ameaçava encerrar a noite ali, sem tocar nada do material antigo. Por isso a marcação de baixo de Gabriel Costa na introdução de “Sombras Flutuantes” arrancou suspiros na plateia. A música, um número instrumental extraordinário de virtuose e bom gosto, teve a tradicional performance “slide guitar” no chão de Fábio, e abriu uma espécie de bis continuado que incluiu ainda a sombria “Faces” e “Dia Eterno”, uma das poucas do repertório do Violeta que pode bater no peito e se chamar de hit. Uma pena que não tenha sobrado tempo/espaço para pérolas como “Outono” e “Reflexos da Noite”, entre outras, mas o que fica é a certeza de que, quase 30 anos depois, a música peculiar do grupo se renova e não cria limo.
A abertura coube ao tecladista sueco Anders Helmerson, que já foi do grupo Ragnarök, e, nos últimos tempos, tem tocado com o baterista Marco Minnemann e o baixista Bryan Beller. Só que essa duplinha não veio ao Brasil, e o tecladista trouxe, segundo consta, bases pré-gravadas por eles. Na apresentação, quase um recital erudito, Anders entra mudo e sai calado, tocando cercado por duas muralhas de teclados e um equipamento que dispara feixes de raios laser sincronizados com as teclas, num efeito bem interessante. Em alguns trechos, o tecladista simula dedilhar os raios como sem fossem cordas de uma harpa gigante.O show dura cerca de uma hora, não é divido em músicas, é peça única, seguida, sem interrupções. Mas o problema é que a sonoridade, pouco orgânica, confunde o ouvinte/espectador. Afinal, qual som é produzido realmente pelos dedos ágeis de Helmerson? Quais são pré-gravados e só dependem de uma única tecla, a “play”? Caso o coletivo sonoro apresentasse trechos mais cativantes, tais questionamentos seriam irrelevantes, mas por se tratar de um exercício de virtuose pleno, ai, sim, fazem todo o sentido. De todo modo, de tão fria, sem emoção ou interatividade com o público, a exibição se torna inóspita e de difícil digestão. Recomenda-se trazer uma banda da próxima vez.
Set list (quase) completo Violeta de Outono:1- Solstício
2- Além do Sol
3- Formas-Pensamento
4- Montanhas na Mente
5- A confirmar
6- Eyes Like Butterflies
7- Ondas Leves
8- Sombras Flutuantes
9- Faces
10- Dia Eterno
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