O Homem Baile

Segunda infernal

Horda de camisas pretas começa a semana celebrando o compenetrado metal das trevas do Marduk; na abertura, Vader se diverte com boa dose de esporro. Fotos: Daniel Croce.

Mortuus: talhado para a função, o vocalista do Marduk mostra que tem fôlego de nadador olímpico

Mortuus: talhado para a função, o vocalista do Marduk mostra que tem fôlego de nadador olímpico

Começar a semana se acabando pode ser o mote para uma simples noite de bebedeira com os amigos no boteco mais próximo. Não para a horda de camisas pretas (das mais pretas entre as pretas) que optaram por bater cabeça ouvindo death e black metal no Teatro Odisséia, em plena Lapa, que nos últimos anos virou refúgio da bisonha e repetitiva mpb. No palco, da Escandinávia e do Leste Europeu duas bandas dão conta do recado: Marduk e Vader. O parco comparecimento do público - nota ruim da noite - foi compensado pela participação intensa na beirada do palco e no balé de braços erguidos em coreografia ensaiada que se espalhava pelo salão.

Morgan: guitarra de arrepiar até o Papa Francisco

Morgan: guitarra de arrepiar até o Papa Francisco

O show do Marduk é sério e parece despertar muito mais compenetração por parte do público do que entretenimento, diversão. Como uma missa negra (lembram do Jabor?) o quarteto sueco dispara uma avalanche sonora temperada com fumaça densa, introduções sombrias e – claro – um som que vai minando o ouvinte pelas beiradas. O vocalista Mortuus parece ter mesmo a vocação para o cargo que ocupa. Além da voz gutural – mesmo quando não canta rasgado – de fazer inveja a Andrew Eldrich engolindo o microfone em “Gimme Shelter”, tem um corpanzil de Frankenstein de assustar, em que pese a indumentária usada por todos na banda e o corpse paint que não resiste à temperatura de invernos dos trópicos. Ele não precisa muito para mostrar valor, seja na ligeira “Slay The Nazarene” ou em “Christraping Black Metal”, que lhe exige um fôlego de recordista dos 50 metros livre.

Já o guitarrista Morgan sofre para reproduzir a muralha de guitarras que coloca nos álbuns do Marduk, o que, de fato, parece mesmo impossível, e isso nada te a ver com o som do Teatro Odisséia, que funciona bem, ainda mais em um dia que a iluminação é usada de verdade, não como simples lâmpadas acesas. Mesmo assim, dá para sentir a força das músicas mais lentas e pesadas se entranhando involuntariamente no público de forma incontrolável. Porradas como “Womb Of Perishableness” e “Imago Mortis”, a partir de agora, estão biologicamente inseridas, por osmose letal, no corpo de cada um que esteve na noite maldita desta segunda. É o mal tomando posse sem pedir licença.

Peter Wiwczarek: mantendo o legado do Vader vivo

Peter Wiwczarek: mantendo o legado do Vader vivo

No repertório (veja o set list completo no final do texto), só duas músicas do novo álbum, “Serpente Sermon”, lançado no ano passado. A faixa-título, uma paulada na moleira que abre o show e acaba servindo de adaptação e ajustes de som e luz; e a ótima “Temple Of Decay”, uma rara peça inspirada no doom metal das antigas com uma evolução de guitarra de arrepiar até o Papa Francisco e os peregrinos que passaram pelo Rio no mês passado. “Azrael” e “502”, que não são tocadas em shows menores, do tipo em festival, foram incluídas, e o bis matou a pau com a arrasadora “Baptism By Fire”. Acredite: não ficou pedra sobre pedra.

“Bem-vindos ao inferno”, bradou o líder do Vader, Piotr Wiwczarek, em bom português, mais cedo, na abertura. Isso porque o grupo tem circulado bastante pelo Brasil, não no Rio, onde travou um duelo com um transformador de energia no Engenho de Dentro em mil novecentos e antigamente. Peter – pode chamá-lo assim – é o único remanescente da formação original do grupo, e vem mantendo o legado de ter nascido na Polônia com integrantes que estão no grupo há menos de três anos. Embora tenha conexões com o mundo lá de baixo, o grupo aponta o som mais para o death metal, o que se revela animador para as rodas de pogo que não param durante a horinha que o show durou.

Embora esteja prestes a lançar um novo álbum, o quarteto optou por não trazer novidades e dar uma geral na carreira, incluindo músicas como a velha “Reborn In Flames”, umas das que mais agitou o público e teve como plus a mais um solo exuberante de Peter; e a mais recente “Come and See My Sacrifice”, quando o novato Spider dá o troco e leva a um final dos mais interessantes. Num show curto como esse, não precisava a cover para “Hell Awaits”, do Slayer, mas já que ela vem, o negócio é bater cabeça e se estapear de lado a lado do Odisséia. Antes, sem que fosse anunciado, o local Enterro tocou para quase ninguém. Uma pena.

Boa abertura: Vader agitado horrores com o público se acabando bem ali na beirada do palco

Boa abertura: Vader agitado horrores com o público se acabando bem ali na beirada do palco

Set list completo Marduk:

1- Serpent Sermon
2- Nowhere, No-One, Nothing
3- The Black…
4- Imago Mortis
5- Slay the Nazarene
6- Temple of Decay
7- Christraping Black Metal
8- With Satan and Victorious Weapons
9- Womb of Perishableness
10- Azrael
11- Materialized In Stone
12- 502
13- Wolves
Bis
14- Baptism by Fire

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