Rock é Rock Mesmo

Quem pisou na bola foi o Jornal da Globo

Se Arnaldo Jabor pisou na bola na análise sobre a morte de Dimebag Darrel, o Jornal da Globo é que cometeu um equívoco cavalar. Seus repórteres e editores praticamente rasgaram o diploma. Publicado originalmente no Dynamite on line.

Meus amigos, o negócio é o seguinte. Dezenove não é vinte, porém noventa e nove é quase cem. Estamos às vésperas de comemorar cem coluninhas, e, nessa época do ano mais vale um chope gelado na mão e um disco na vitrola do que qualquer outra coisa. Por isso, bebam a vontade que o ano tá acabando e só vai ter outro Natal no ano que vem.

Gerou repugnância geral entre os fãs de música pesada, sobretudo na Internet, a maior rede de boatos do mundo, as opiniões do ex-cineasta e colunista dos telejornais da Globo, Arnaldo Jabor, sobre o heavy metal, a despeito da morte de Dimebag Darrel, o ex-guitarrista do Pantera. Ele foi assassinado em pleno palco, quando fazia um show com sua nova banda, Damageplan. Fãs de metal fazem abaixo-assinados, outros espinafram o falastrão, criou-se um rebuliço geral. Mas calma, olha a violência.

Arnaldo Jabor trabalha para a Globo já há algum tempo, e, ao ser contratado, deve ter sido orientado a fazer o papel que, em outros tempos, foi ocupado por Paulo Francis (que até virou nome de banda, em Recife), mais famoso pelo jeito característico de falar que pelo conteúdo de seus comentários. De origem na esquerda que resistia à ditadura, e revelado pelo Pasquim, Francis traiu toda uma geração, quando, aos poucos, foi se transformando num reacionário, até morrer de medo. Sim, meus amigos, em fevereiro de 97, depois de, sabe-se lá a mando de quem, fazer uma dura e exagerada campanha contra a Petrobrás, ele estava ameaçado por vários processos movidos por conta de suas calúnias, e não resistiu. Era a época em que se discutia a quebra do monopólio estatal do Petróleo e a estratégia dos interessados era desmoralizar a Petrobrás. Paulo Francis chegou a cunhar a expressão “mamateiro” para se referir aos engenheiros da empresa, e, ameaçado por vários processos, morreu, repito, de medo (tecnicamente o óbito registra infarto).

Jabor segue a linha de do Paulo Francis de antes disso, quando o que ele falava tinha certa relevância e alguma contundência. Nos últimos tempos, tem batido forte no governo Bush e em sua política externa, o que, decerto, atrai a simpatia da maioria. Como foi (é?) cineasta, já até apresentou alguns números, usando velas acesas, “efeitos” de luz, etc. Não me admira, entretanto, que ele tenha dito o que falou no Jornal da Globo, na noite seguinte a do assassinato de Darrel, porque, sabemos todos, ele não é o ramo. E, ainda, pouco me importa o que ele tenha falado, porque, repito, é apenas a opinião dele, e esta, certamente, não denigre, de forma alguma, a imagem do heavy metal. Não sou advogado do afamado colunista nem estou aqui para defendê-lo, mesmo depois de ele ter atribuído como causa da morte de Dimebag Darrel a “qualidade inferior” da música pesada e o fato de ela “incitar a violência”. Um colunista pode dizer o que quiser, e em geral faz suas análises baseado na própria carreira e/ou experiência de vida. Como Jabor nunca teve nada a ver com o metal em si, admito que ele possa dizer o que disse. E repito: isso em nada afeta a música pesada em si.

O problema, meus amigos, é como o Jornal da Globo abordou a notícia, na matéria que antecedeu ao infeliz comentário de Jabor. Diferentemente do colunista, o noticiário não pode sair falando a torto e a direito o que bem entende. Deve, isto sim, seguir critérios jornalísticos, e não pode ter, de forma alguma, preconceito contra isto ou aquilo. As matérias ali apresentadas devem ser frutos de apuração e informação, nunca de opiniões. Estas ficam para os editoriais e colunas, como a de Arnaldo Jabor. Mas não foi isto o que aconteceu. Como a matéria foi apresentada no último bloco, a cada vez que os comercias iam entrar, a bela Ana Paula Padrão lia as chamadas mais absurdas, num clímax que parecia apontar para um filme de terror. Numa delas, se não me falha a memória, foi usada a expressão “ritual bizarro” para definir o ocorrido. Já na matéria, o qualificado William Waack fez chacota justamente da vítima, ao traduzir seu apelido (ou nome artístico), como “saquinho de maconha” (ou algo parecido), num tom pejorativo. Foi evidente o preconceito no tratamento dado a notícia, que, se chocou a muitos, não passou de mais um desses assassinatos que volta e meia acontecem nos Estados Unidos. Parece até que os repórteres e editores do JG não assistiram à “Tiros Em Columbine”, onde Michael Moore escancara o medo e a reverência americana pelas armas. Esse deveria ser o mote da reportagem, não o metal. Porque, grosso modo, o que aconteceu como Dimebag Darrel foi o mesmo que ocorreu, vinte anos antes, com John Lennon: um louco chegou, do nada, e matou o cara. E sempre é bom lembrar das aulas da faculdade, onde nos ensinaram a identificar os ganchos jornalísticos e a definir a ordem de importância dos fatos e da notícia. Será que esses caras da Globo, bem remunerados que são, mataram essas aulas? Será que eles rasgaram os diplomas?

Não é a primeira vez, no entanto, que falam do rock e do heavy metal num grande veículo sem conhecimento de causa. Na verdade, isso é o que mais acontece, e não só no Brasil. Quem não se lembra dos processos movidos contra Ozzy Osbourne (depois que um garoto cometeu suicídio, em tese, por ter ouvido a música “Suicide Solution”), AC/DC (”Highway To Hell”) e Judas Priest, só para citar alguns exemplos? Aqui no Brasil posso afirmar que a grande maioria dos jornalistas não circula bem na área da música pesada (a tratam com desprezo e deboche) e, de outro lado, os que entendem de música pesada não trafegam bem pelo bom jornalismo. Assim, vemos matérias bem feitas nos grandes veículos, mas de conteúdo duvidoso, e matérias com excelente conteúdo na mídia especializada, porém de costas para o bom jornalismo. Um nó que precisa ser desatado o mais rápido possível.

Quanto à morte de Darrel, e com todo o respeito que um falecimento merece, vamos e venhamos, ele não era esse guitarrista todo, não. Eu sei que muitos são fãs do Pantera (sua ex-banda), incluindo, segundo li por aí, o próprio assassino. Sei que o Pantera foi, por um bom período, um dos grandes destaques da música pesada mundial, e que fazia um som difícil de se caracterizar (um mérito e tanto), embora sempre agregado ao thrash metal. Mas sua morte não muda em nada o cenário da música pesada, mesmo porque, como guitarrista, ele já tinha batido as botas há muito tempo. Prestem atenção: não estamos falando da perda de um Frank Zappa, de um Tony Iommi, de um Hendrix ou de um outro grande ícone do rock. Falamos o ex-guitarrista do Pantera. E só.

Por fim, e para soterrar de vez essa história de que música (seja ela qual for) incita a violência, deixo esta lapidar frase de Zappa, que foi bem resgatada por Maurício Ricardo no site charges.com. Tem uma bela charge lá sobre o assunto também: http://charges.uol.com.br/vercharge.php?idcharge=1590&modo=som. “O que mais existem são canções de amor. Se músicas nos levassem a fazer alguma coisa, todos nós amaríamos uns aos outros”.

Até a próxima, e long live rock’n'roll!!!

Tags desse texto:

Comentários enviados

Existem 4 comentários nesse texto.
  1. Kairos em janeiro 3, 2012 às 14:36
    #1

    Cara, como teve a coragem de postar que Dimebag Darrell foi apenas ex-guitarrista do Pantera? Alguém antes dele ou depois dele fez o que ele fazia? Os riffs, solos todos pesados e marcantes, sem contar na criatividade. O negócio é o seguinte: falar é facil, qualquer idiota fala, escreve sobre alguém, mas você mudou alguma coisa na música? Você foi alguém importante? Seja homem de deixar meu comentário no site, pois se você pode expor sua opnião, eu posso expressar à vontade.

  2. Lucas em janeiro 3, 2012 às 14:38
    #2

    Concordo com o Kairos.

  3. Alex em janeiro 3, 2012 às 14:39
    #3

    Totalmente infeliz, ridiculo cara, você tem certeza de que curte rock?

  4. Adelvan em agosto 6, 2013 às 18:49
    #4

    Também achava Dimebag um ótimo guitarrista.

trackbacks

There is 1 blog linking to this post
  1. Rock em Geral | Marcos Bragatto » Blog Archive » Segunda infernal

Deixe o seu comentário

Seu email não será divulgado