Som na Caixa

Coldplay

Viva La Vida Or Death And All His Friends
(EMI)

coldplayvivalavidaA despeito da forte tendência do Coldplay “virar U2”, Chris Martin e seus acólitos parecem não estar nem aí, mesmo que este esperadíssimo disco – depois do grande sucesso de “X & Y”, o anterior – comece já com a grandiloqüência típica dos irlandeses, numa peça instrumental (“Life In Technicolor”) de levantar a multidão à frente do palanque eleitoral. Isso porque eles continuam firmes no intuito de fabricar (sim, em escala industrial) músicas de grande apelo pop, daquelas que colam na cabeça do ouvinte logo de primeira, para não mais sair. Por isso, mais de uma vez ouvimos dos quatro integrantes - não só de Martin, o mais exposto - reclames do tipo “não agüentamos mais fazer música”, enfiados que ficam em estúdio até chegar ao resultado final para cada faixa.

Do lado de cá do CD, para nós, reles mortais, vale à pena. É impressionante como depois de ouvir esse disco várias vezes, ainda que inicialmente tendo que ficar preso em frente ao computador, e depois do modo “normal”, ele soe tão inteiro, redondo, homogêneo ou qualquer outro adjetivo que signifique, no fim das contas, que ele tem unidade. E isso não é pouco. Aquele que não observar que música está tocando em determinado momento, poderá apontar o título de qualquer uma das dez como rica em todas as características de uma boa e típica música do Coldplay – ou, e alguns casos, de novo, do U2. Isso é o que nos dá a sensação da tal unidade buscada à exaustão.

A dobradinha “Lost!” e “42”, por exemplo, é de uma beleza singular, seja nos arranjos rebuscados ou na seqüência harmônica que em geral conduz a música a um ápice até óbvio, mas sempre recompensador quando se chega lá. O single “Violet Hill”, talvez seja a que mais remeta ao Coldplay “das antigas”, se possível fosse fazer esse tipo de separação. Por ser a oitava, atua como uma faixa bônus, o que, em tempos urgentes de audição on line, realmente já faz dela, em relação ao disco, algo precocemente retrô. E a exuberante “Viva La Vida”, com arranjo orquestrado e coro vocal, realça talvez o ponto alto do CD, de modo a ter sido escolhida para melhor o identificar, no próprio título, dividido com a quase épica “Death And All His Friends”, que cita “Life In Technicolor” e encerra o disco querendo recomeçá-lo – a cobra mordendo o próprio rabo.

As referências à música hispânica – ou algo que o valha – que o grupo andou alardeando a torto e a direito, e que os levou ao título e à capa (uma tela do pintor francês Eugène Delacroix), musicalmente aparecem tão sutilmente, que, não fossem citadas, passariam batidas pela maioria dos ouvintes. Em geral se aproveitando de ferramentas da informática e de recursos de estúdio, uma esmerada produção inseriu sons de tambores aqui, percussões discretas acolá, cordas explícitas (em “Yes”), uma seqüência de bateria menos indie/britânica e mais calorosamente latinizada, e assim por diante. Um bom exemplo de como, ao incorporar novas referências, não é preciso uma banda jogar fora sua identidade.

Ao mesmo tempo, o Coldplay deixa para trás outra grande característica: Chris Martin já não usa a voz do jeito soturno e doentio que pegou emprestado de Thom Yorke. Tampouco o grupo volta a soar como o Radiohead como no passado, muito embora ambos representem o bê-á-bá do indie britânico da última década. Daí a ratificação da estética cooptada, naturalmente, pelo U2, referendada por uma escalada de sucesso que tende a colocar ambos num mesmo patamar no mercado do rock e da música pop mundial. E isso sem deixar de fazer, nos dois casos, música boa e colante. Do jeito que o povo gosta.

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