No Mundo do Rock

The Police
De volta para o futuro

A mais inesperada das reuniões de uma banda que deixou saudade enfim acontece. Vinte e três anos depois do fim, com os desentendimentos entre o baterista Stewart Copeland e o vocalista e baixista Sting deixados de lado, o The Police está de volta para a alegria dos fãs, inclusive músicos famosos brasileiros. Publicado na Revista da MTV número 71, de abril de 2007.

Stewart Copeland, Sting e Andy Summers: Revigorados e maduros, os três ases do Police voltam e encantam o mundo

Stewart Copeland, Sting e Andy Summers: Revigorados e maduros, os três ases do Police voltam e encantam o mundo

O improvável anúncio da nova turnê aconteceu na manhã do dia 12 de fevereiro, 30 anos depois da fundação da banda, numa entrevista/show case oferecido à imprensa, aos fãs e aos convidados no Whisky a Go Go, em Hollywood. No show o trio mandou ver em “Message In a Bottle”, “Voices Inside My Head”/”When The World Is Running Down You Make The Best Of What’s Still Around”, “I Can’t Stand Loosing You”/”Reggatta de Blanc” e “Roxanne”. A banda já vinha ensaiando desde o início do mês num estúdio em Vancouver, no Canadá, preparando o retorno. “Éramos jovens ambiciosos e cada um queria conquistar seu lugar no mercado. Agora é só sentar na minha bateria e tocar”, disse Stewart Copeland do alto de seus 54 anos. “Não quero me preocupar em me expressar de uma forma diferente a cada disco, só quero seguir o Sting e o Andy. Agora é só música”, completou.

Ele se referia aos eternos problemas de relacionamento entre ele, baterista e fundador do grupo, e Sting, cantor e principal compositor. Na mesma pergunta, Sting, 55, em tom de brincadeira, retrucou Copeland dizendo que ele havia mudado bastante. O baixista, que traçou uma carreira solo de grande sucesso, sempre rechaçou qualquer idéia relacionada à volta do Police, mas agora mudou. “Não sei se há um só motivo, mas eu acordei numa manhã qualquer e decidi que deveria ligar para o Andy e o Stewart e chamá-los para tocar, assim os deixaria surpresos, surpreenderia o mundo e a mim mesmo”, admitiu. “Há uma parte da minha vida que se foi há 25 anos e é uma parte muito importante, então quero voltar a ter esse tipo de relacionamento. Ainda vamos brigar, mas é sempre uma questão musical, nada pessoal. Estamos famintos pela turnê”, concluiu, arrancando aplausos.

REGGAE DE BRANCO

E não são apenas Sting, Copeland e Andy que estão empolgados. Uma legião de admiradores – incluindo aí muitos artistas de peso – aguardava a volta do The Police ardorosamente. Enquanto gravavam o segundo álbum, ”Reggatta de Blanc” (1979), algo como “reggae de branco”, um relançamento fez “Roxanne” e “Can’t Stand Losing You” (lado B do mesmo single) estourarem nas paradas inglesa e estadunidense, criando a primeira onda de policemania. Foi nessa época que um tal João Barone tomou conhecimento da banda que seria sua maior referência no início da carreira. “Assisti ao clipe de ‘Can’t Stand Losing You’, que me impressionou muito, aquele onde eles estão tocando num estúdio de TV todo vermelho. Eu disse: achei uma banda atual e com apelo para chegar perto dos Beatles como minha banda favorita”, relembra o baterista dos Paralamas do Sucesso.

A turnê de “Reggatta De Blanc” correu o mundo e durou um ano, culminando num show no Reading Festival. Com hits como “Message In a Bottle” e “Walking On The Moon”, o disco consolidou o novo estilo de tocar, com baixo à frente, guitarra fazendo texturas ao fundo e uma bateria que marcou época e passou a pautar a música pop. Para Barone, “Stewart Copeland foi o Ringo Starr dos anos 80, influenciou um grande número de bateristas e entrou para o hall da fama entre os grandes bateristas de rock”.

Copeland se inspirou na profissão do pai, um agente da CIA, para dar o nome à banda. Nascido no Egito por conta das viagens da família, morava em Londres quando decidiu viver do rock, apoiado pelo irmão Miles Copeland, empresário de grupos como Renaissance e Wishbone Ash. Ele havia tocado no Curved Air, e foi numa das apresentações da banda que conheceu Sting, em New Castle, onde tocava no Last Exit, um grupo de jazz local. Em Londres o punk revolucionava o mundo, mas os dois estavam deslocados: não tinham pertencido à geração hippie e do rock progressivo, nem eram os moleques que freqüentavam a loja Sex, onde nascia os Sex Pistols. Por isso recrutaram como guitarrista Henri Padovani, ligado ao punk, mas foi com Andy Summers que a coisa fluiu. Quase dez anos mais velho, Summers já tinha tocado com gente de renome, como Soft Machine, Animals, Mike Oldfield e Jon Lord, do Deep Purple.

Como não conseguiram embarcar na onda punk, buscavam uma nova sonoridade. Stewart colocou alguns discos que comprava em suas viagens, por conta do trabalho de seu pai, para Sting ouvir. Depois de escutar o álbum “Lively Up Yourself”, de Bob Marley, Sting aguçou os ouvidos para um tipo de música que dependia de uma linha de baixo adiantada e malabarismos de bateria. Numa visita ao estúdio onde a banda trabalhava, Miles Copeland ouviu uma música com ritmo lento, quase igual à de um reggae e longe da tentativa de “ser punk”; a letra falava de uma prostituta que Sting conhecera no bairro vermelho, em Amsterdã. “Roxanne” foi lançada como single, mas logo retirada de circulação por causa da letra. Sting não esquentou: “Temos outras músicas como essa”. Como o punk começava a dar espaço à new wave, eles decidiram investir neste novo formato. O primeiro disco, “Outlandos d’Amour” (1978), mescla a urgência punk com o reggae. Além de Roxanne, “Can’t Stand Losing You” e “So Lonely” fizeram grande sucesso. “Truth Hits Everybody” e “Next To You” ecoavam o punk, mas a maioria das músicas vinha com a roupagem reggae e letras repletas de “iôs”.

MATURIDADE E DIVERGÊNCIAS

Leoni, então aspirante a estrela do rock nacional via Kid Abelha, até hoje considera Sting seu guru. “É a minha maior referência como baixista. As linhas eram simples. Funcionavam como uma parte fundamental do arranjo e não como simples acompanhamento. Era uma abordagem de compositor, não de músico virtuoso”, explica o baixista. Mas o que mais se destacou no disco foi a produção de Nigel Gray, que conseguiu tirar o máximo do mínimo, criando um exemplo de simplicidade e (ao mesmo tempo) sofisticação que iria influenciar toda uma geração que viria depois do punk.

The Police ao vivo 2007: três garotos em performance explosiva

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Pela primeira vez desde o início, a banda deu um tempo para Sting fazer novas músicas. A essa altura o mundo inteiro já percebia que vinha dele o potencial criativo, e começaram aí os primeiros desentendimentos com Stewart. O novo disco, “Zenyatta Mondatta” (1980) manteve o Police em evidência, e, graças aos sucessos “Don’t Stand So Close To Me” e “De Do Do Do De Da Da Da”, colocou a banda ainda mais em voga nos Estados Unidos. Esta última foi o primeiro grande sucesso na terra do Tio Sam desde “Roxanne”, e levou o álbum a uma sustentação de seis meses nas paradas, atingindo a marca de um milhão de cópias. Era a conquista definitiva das Américas. Em fevereiro de 81 o Police tocou no Brasil, num show auto-sabotado em pleno Carnaval. Leoni estava lá: “Assisti ao show, mas não valeu. O som era tão ruim que as músicas que eu conhecia quase não reconheci e as que eu não conhecia, fiquei sem conhecer. Mas tinha uma quantidade de energia”, lembra.

Com apenas dez anos na época, Pedro Sá, o guitarrista e produtor que deu a “cara rock” ao novo disco de Caetano Veloso, “Cê”, descobriu a música com “Ghost In The Machine” (1981), que tinha “Spirits In The Material World”. “Um amigo do meu pai trouxe de Nova York. Fiquei fascinado, foi o primeiro disco que eu ouvi como álbum mesmo, com conceito de álbum”, conta Pedro.

No início de 1982, o álbum rendeu ao Police o Brit Awards como melhor grupo britânico. Destacam-se a incursão no calipso caribenho em “Every Little Thing She Does is Magic” e as intervenções subliminares do guitarrista Andy Summers, que inspiraram o precoce Pedro Sá: “Quando eu comecei a tocar não percebia o trabalho dele como guitarrista, mas havia vários sons que eu nem sabia que eram de guitarra que ele fazia e eu adorava. Ele tem uma coisa de jogar para o time, é o ‘antiguitarreiro’, acho isso do caralho”.

Em 83 o relacionamento entre Stewart e Sting ia de mal a pior. Boatos sobre o fim da banda eram quase diários e contrastavam com o sucesso que o trio alcançava atingindo o topo do mundo com “Synchronicity”. O álbum que vendeu mais de dez milhões de cópias e desbancou o “Thriller”, de Michael Jackson, da parada estadunidense, levou a banda a uma extensa turnê que culminou num show para 70 mil pessoas em Nova York, superando o recorde dos Beatles. Era sem dúvida o ponto alto na carreira. No ano seguinte, singles se superavam nas paradas, fazendo de “Synchronicity” um “best of” instantâneo. Na época, o fim da banda não foi comunicado oficialmente, mas Sting, em 85, lançava o primeiro álbum solo (“The Dream Of The Blue Turtles”), tentava a sorte como ator e aparecia sozinho no mega festival Live Aid, em Londres.

O trio tentaria prosseguir gravando o que seria o sexto álbum, mas tudo o que conseguiu foi uma nova versão para “Don’t Stand So Close To Me”, que requentou uma coletânea de singles em 86. E foi só.

O LEGADO

Nesses 23 anos Sting teve uma carreira solo de grande exposição na mídia, Stewart Copeland se dedicou a compor e produzir trilhas sonoras, e Andy Summers gravou discos sem muito alarde. O trio se reuniu em três ocasiões: um show da Anistia Internacional (1986), uma apresentação com duas músicas no casamento de Sting com Trudie Styler (1992) e na indicação da banda ao Hall da Fama do Rock (2003).

Recentemente os três publicaram trabalhos biográficos. Sting e Summers um livro cada um (“Fora do Tom” e “One Train Later”, respectivamente) e Copeland um DVD (“Every One Stares: The Police Inside Out”) com imagens feitas por ele na época do Police.

Em apenas sete anos de existência, o Police agradou aos mais diferentes fãs espalhados pelo mundo. A voz de timbre característico de Sting, as linhas de baixo escoladas no jazz e influenciadas pelo reggae, a inigualável batida de Stewart Copeland e o minimalismo virtuoso de Andy Summers, juntos, até hoje encantam os fãs da boa música. Não é à toa que as coletâneas lançadas desde o fim da banda vendem feito água. João Barone considera o grupo como “a expressão máxima da new wave, do pós-punk. Eram bons músicos, carismáticos e falavam coisas interessantes. Andy Summers criou um estilo de guitarra, o Copeland reinventou a bateria com sua assinatura”.

Quanto à turnê, os três fãs divergem. Barone pensa até em tocar junto. “Esperamos que o Police venha ao Brasil, pois Os Paralamas, que não costumam tocar antes de bandas estrangeiras, poderiam abrir uma exceção”. Pedro Sá recua: “Ver um show do Police hoje em dia é como ir a um museu: é lindo, mas não é a mesma coisa, tinha um frescor que mesmo com dez anos eu percebia. Mas é legal, ficarei emocionado”. E Leoni sobe no muro. “Se tiver alguma coisa nova que demonstre a vitalidade desse projeto, estarei na primeira fila”.

Considerado dono da turnê mais lucrativa de 2007, o Police toca no Rio dia 8 de dezembro, em show único para o público brasileiro

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