O Homem Baile

Devastador

Com ênfase no repertório que o consagrou, Children Of Bodom faz do Circo Voador terra arrasada com death melódico singular. Fotos: Nem Queiroz.

O talentoso guitarrista, vocalista e chefão do Children Of Bodom, Alexi Laiho, exibe sua virtuose

O talentoso guitarrista, vocalista e chefão do Children Of Bodom, Alexi Laiho, exibe sua virtuose

O cenário é de terra arrasada no pós show de um domingão daqueles no Circo Voador. Doze anos depois de estrear no Rio no inóspito e cafona Scala, o Children Of Bodom encontra, enfim, uma pousada que faz jus ao som porrada que o consagra em todos os lugares. Sob decibéis generosíssimos, um público apenas regular se converte numa plateia animada, a custa do reconhecimento imediato de cada uma das 17 músicas tocadas a ferro, fogo, muita melodia, muita grosseria e muita paulada na cabeça sem dó. “Faz um tempão, hein, Rio?”, diz o chefão Alexi Laiho lá pela quinta música, entre um “fucking”, seu bordão preferido, e outro. “E vocês todos aqui num domingo à noite?”. Não dava mesmo pra faltar.

Mas, no início, não parecia ser isso tudo. Laiho dava a impressão de ter comido uma feijoada no almoço, de modo a aparentar uma preguiça danada. O que, de certo modo, é reflexo da escolha irregular do repertório. Se “Are You Dead Yet?” é um single dos bons, e bastante rodado, ao vivo não cai bem como abertura, mesmo que a ansiedade da plateia forneça uma contribuição monstro. O som em “modo ajuste”, para dizer o mínimo, tampouco ajuda em “In Your Face”, da mesma safra da anterior, e, ademais, o guitarrista matusquela parece fazer um esforço hercúleo para segurar a guitarra, de modo a ter que apoiá-la sobre a perna escorada no monitor de retorno o tempo todo; vê-se, depois, que é o “estilo” da vez.

O discreto baixista Henkka Seppala, Alexi Laiho e o ótimo baterista Jaska Raatikainen agitando a cabeleira

O discreto baixista Henkka Seppala, Alexi Laiho e o ótimo baterista Jaska Raatikainen agitando a cabeleira

De modo que o couro só come pra valer em “Morrigan”, uma pérola do álbum mais recente, “I Worship Chaos”, a primeira a cair no gosto de uma renovada plateia que, em 2004, quando o grupo veio ao Rio pela última vez, ainda usava calças curtas. A música tem arranjo destacado por uma série de texturas de teclado de Janne Wirman e do segundo guitarrista, Daniel Freyberg, com carteira assinada desde janeiro. É aí que se percebe que a turnê é a desse álbum, lançado no ano passado, mas que só cede três músicas ao show. Em contrapartida, o grupo escala nada menos que oito, quase a metade do show, dos três primeiros trabalhos, onde se estabelece com todas as letras a marca registrada da sonoridade singular do Children Of Bodom que iria conquistar o Globo.

Porque para eles não bastou fundir guitarras melódicas com vocais rasgados como reza a cartilha do death metal melódico, mais inserir uma tecladeira desgovernada (hoje algo comum no metal extremo, mas não há 20 anos), exalar certo aroma hard rock e compor músicas colantes que permitem um sotaque relativamente pop por baixo de um esporro dos quintos dos infernos. Tudo sob o comando de Laiho, o talentoso guitarrista, dono dos solos e que – ainda tem mais essa – solta os indispensáveis grunhidos sem limpeza alguma. É o que realça na esplêndida “Children Of Decadence”, que consegue ser palatável no meio do arame farpado, com um dos melhores solos da noite, e desencadeia o enlouquecimento geral do público no bis. Ou na cadenciada “Everytime I Die”, de vocação dramática e com a tal pegada hard rock pra bater cabeça sem medo de acordar do sonho na segunda de manhã.

Alexi Laiho com o descontraído tecladista Janne Wirman, 'mais robusto', tocando ao fundo

Alexi Laiho com o descontraído tecladista Janne Wirman, 'mais robusto', tocando ao fundo

Tem também a própria “Children Of Bodom”, quando uma das guitarras flying V (são muitas) de Laiho aposta corrida com a tecladeira de um folgado Wirman, já pra começo de conversa, antes de turbinar a imparável roda de dança no meio do salão. E a devastadora “Angels Don’t Kill”, que vai direto ao fundo da alma dos mais infiéis vestidos de preto na Lapa encardida de música ruim. A música culmina num solo lindíssimo e de ampla apreciação. É o último show da turnê e o arremate quase obrigatório tem a dobradinha “Kissing the Shadows”, salientada pela mudança de andamento que antecede o solo – e o povaréu vibra - e “Downfall”, com tonalidades épicas que justificam a tal terra arrasada. Um showzaço cujo senão é durar menos de hora e meia.

Antes, o Reckoning Hour garantiu a alegria de quem chegou cedo e não se aguentava dentro das calças para agitar. Por isso a roda de dança em “Dead Man Walking”, ainda que atendendo aos pedidos do vocalista JP, funcionou. É ele o responsável por alternar vocais limpos e rasgados (o que não é mole), outra ferramenta do death melódico um tanto tímido do quinteto. Porque os dois guitarristas, ainda que se envolvam no bojo das músicas, são pouco ousados e quase não investem em tiradas individuais, com raros momentos solo de um modo geral, ponto crucial no metal. Quando tudo funciona, caso da ótima “Eye For Na Eye”, o resultado é realmente promissor. Boa abertura com o aprovo da plateia.

Caçula na banda, o guitarrista Daniel Freyberg toca junto com Wirman (no fundo) e Seppala

Caçula na banda, o guitarrista Daniel Freyberg toca junto com Wirman (no fundo) e Seppala

Set list complete Children Of Bodom:

1- Are You Dead Yet?
2- In Your Face
3- Morrigan
4- Sixpounder
5- I Hurt
6- Trashed, Lost & Strungout
7- Everytime I Die
8- Children of Bodom
9- Hate Me!
10- Lake Bodom
11- I Worship Chaos
12- Angels Don’t Kill
13- Silent Night, Bodom Night
14- Hate Crew Deathroll
Bis
15- Children of Decadence
16- Kissing the Shadows
17- Downfall

Pedrada: Reckoning Hour em ação durante o bom show de abertura para o Children Of Bodom

Pedrada: Reckoning Hour em ação durante o bom show de abertura para o Children Of Bodom

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Comentários enviados

Apenas 1 comentários nesse texto.
  1. Lucas Brum em maio 31, 2016 às 10:17
    #1

    Muito obrigado pelo espaço e pelas críticas.
    Parabéns pelo site e pela matéria.
    Forte abraco

    Lucas Brum

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