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Psicodelia enxuta do Flying Eyes deixa público hipnotizado no Rio; bandas locais fazem bonito na abertura. Fotos: Nem Queiroz.

The Flying Eyes: psicodelia em alto volume no encerramento da noite no Teatro Odisséia

The Flying Eyes: psicodelia em alto volume no encerramento da noite no Teatro Odisséia

O feriadão de Páscoa está acabando e um grito cavernoso ecoa lá de trás do palco do Teatro Odisséia, no Rio. E sai justamente das profundezas vocais de um baterista cujo porte físico acanhado contrasta com o espancamento de tambores desenvolvido na última hora e pouco. O pequerrucho, que um pouco antes se divertia no meio do público com os combos instrumentais cariocas Psilocibina e Astro Venga, é Elias Mays Schutzman, e decreta o encerramento de uma turnê de sete datas do Flying Eyes pelo Brasil, em ótima apresentação. O grupo ainda aproveitou a passagem pelo Rio – olha a globalização aí - para gravar as músicas que farão parte do novo álbum, no Estúdio Superfuzz, com o produtor Gabriel Zander.

Algumas delas já testadas nesta noite, o que de fato não faz muita diferença, porque a) O público pouco conhece o repertório do Flying Eyes, então é como se fosse tudo novo; b) Os músicos, a despeito da simpatia de parte a parte, não avisam quais são as tais músicas novas; e c) O som nas alturas bate na caixola de cada indivíduo como uma massa sonora compacta, como se todas as músicas formassem um único bloco dominador. Para quem não sabe, o grupo é um dos ícones do stoner rock/psicodelia do underground americano, muito embora o som seja bastante peculiar para encontrar morada em um único (ou dois) subgênero do rock pesado. E ainda se salienta - peculiaridade atroz - os vocais de Will Kelly, um cruzamento de Jim Morrison com Glenn Danzig com maior alcance e uma pitada de Scott Weiland, só para se ter uma ideia.

Uma das que devem estar no disco novo é a nem tão nova assim “No Fate”, pedrada com interpretação dramática de Kelly, uma constante, aliás. Ela abre pra valer o show do Flying Eyes, já que “Poison The Well”, embora com sotaque mais palatável, não é boa escolha para a abertura. Afinal, quem quer saber de refrão cativante em uma noite dedicada à psicodelia e ao esporro? O guitarrista Adam Bufano tem ciência disso e desembrulha seu arsenal de solos viajantes e turbinados por ótimos efeitos de uma pedaleira nervosa – outra máxima, até para as bandas de abertura. Em “Circle Of Stone”, ele se descontrola esmerilhando a guitarra – um modelo Rickenbacker que chama a atenção – entulhando o desfecho de solos e ótimas evoluções instrumentais. Seu comparsa, Mac Hewitt, ergue o baixo na vertical como se tocasse em banda de black metal, e adora brincar de John Entwistle; o cara não é fraco, não.

Banda de rua, o Astro Venga deitou e rolou no palco; trio foi o mais aplaudido pelo público

Banda de rua, o Astro Venga deitou e rolou no palco; trio foi o mais aplaudido pelo público

O repertório curto e com músicas curtas para o tipo de som, além das novas, traz um apanhado geral da carreira de quatro discos e dois EPs da banda. “Sing Praise”, segundo consta, uma das novas, lenta, arrastada e pesada, traz um interlúdio com levada quase tribal de Elias, uma de suas fortes características, que aparece em outras partes do show. “Nowhere to Run” é conduzida por um riff pesadão e colante, mas o público, contemplativo (hipnotizado?) na maior parte do tempo, não desanda a bater cabeça como a música sugere. Além das nove músicas escritas a mão no set list de Will Kelly, outras duas são tocas, incluindo um bis com “Lay With Me”, com um sotaque blues de raiz numa versão turbinada em relação ao de estúdio. Poderiam ter tocado mais, mas o público, pequeno e pouco participativo, também não ajudou.

Mas curtiu, e muito, o show do Astro Venga. O grupo, acostumado a tocar na rua, parecia pinto no lixo em cima do “palcão” do Odisséia. Conhecido de boa parte da plateia, fez um ótimo show, muito por conta do entrosamento, da boa técnica e da disposição para detonar com um instrumental poderoso. A pena é que eles investem em muitas releituras instrumentais para clássicos das mpb. Se de um lado fica legal a possibilidade de ver como boas músicas poderiam soar em um arranjo rock poderoso e não em geral sem sal como nas versões originais, de outro, para o público, se atraente de início, não passa de exercício vão de adivinhação. Ademais, se espera muito mais do som vigoroso do trio do que tocar música de novela da Globo, mesmo sendo a excepcional “Tropicália”.

Bem mais cedo e com um público menor, outro trio instrumental, o Psilocibina, fez a abertura. Mas com eles o buraco é mais embaixo, não tem sotaque pop – ou se tem, não é toda hora -, e os músicos viajam por outras correntes da música, flertando com o fusion, o rock progressivo contemporâneo e a psicodelia de baixo impacto. Na primeira música o guitarrista Alex Sheeny já subverte a ordem da coisa, iniciando com uma sequência estonteante de solos, para depois virem outros andamentos. Lucas Loureiro e Rodrigo Toscano, respectivamente baterista e baixista, também entendem do riscado e sustentam um show marcado por aparentes improvisações, em músicas repletas de mudanças de andamento e desempenhos individuais ousados. Nota-se que a banda é muito nova, mas bastante promissora.

Banda nova, mas promissora, o Psilocibina viaja por várias tendências da música contemporânea

Banda nova, mas promissora, o Psilocibina viaja por várias tendências da música contemporânea

Set list completo The Flying Eyes:

1- Poison The Well
2- No Fate
3- Sing Praise
4- Sem título
5- Circle Of Stone
6- Rest Easy
7- Nowhere to Run
8- Under Iron Feet
9- Sem título
10- Oh Sister
Bis
11- Lay With Me

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