O Homem Baile

Fim de ciclo

Pronto para gravar o próximo disco, Vespas Mandarinas reverencia anos 80, mas público se acaba é com o material próprio. Fotos: Nem Queiroz.

O baixista e vocalista do Vespas Mandarinas, Thadeu Meneghini, ostentando um visual retrô anos 80

O baixista e vocalista do Vespas Mandarinas, Thadeu Meneghini, ostentando um visual retrô anos 80

Enquanto este texto está sendo postado os caras do Vespas Mandarinas já devem estar trancados no estúdio Tambor, no Rio, começando a gravar o segundo álbum, sucessor de “Animal Nacional”. Antes, o quarteto deu as caras na edição desse mês do Imperator Novo Rock, para uma rara apresentação na Cidade – a banda é de São Paulo. Em um show repleto de variáveis, teve repertório desgastado, reverência explícita aos anos 80, teste de músicas novas, apresentação de nova formação e um público fiel que conhece direitinho o trabalho dos caras. Na abertura, o Sound Bullet fez um show discreto, com convidados, mas também bastante concorrido.

A sensação de final de um ciclo e começo de outro para o Vespas, no entanto, ultrapassa os fatos e transparece durante o show, em performances aparentemente não muito animadas em muitas das músicas mais antigas do repertório. Por vezes, o público parece mais ligado do que a banda, soltando uma indelével cantoria em músicas como a ótima “Cobra de Vidro” e a emblemática “Não Sei o Quer Fazer Comigo”, o que chega a ser surpreendente. Num efeito reverso, é o quarteto que acaba se empolgando com o público. Em “Distraídos Venceremos”, o vocalista/baixista Thadeu Meneghini se distrai com a letra e uma fã é chamada ao palco para fazer a correção. Tadeu aparece cantando a maior parte das músicas, muito embora o guitarrista Chuck Hipolitho tenha seus momentos bem registrados.

Duas músicas novas, que devem estar no tal disco que começa a ser gravado hoje, são testadas no show. A melhor delas é “Que Esse Dia Seja Meu”, uma parceria com Marcelo Yuka, que ressalta a capacidade da banda de compor músicas colantes, com sotaque pop e bons refrães. O plus a mais é um cantarolar de fazer inveja aos tempos áureos do Police. A outra é “Daqui Pro Futuro”, de título sugestivo para um início de ciclo, e que escorrega em um arranjo ainda a ser ajustado; o início sem bateria com longas vocalizações não chega a ser tão cativante como é o som do Vespas na maior parte do tempo. O grupo tem o reforço luxuoso de Nevilton, o intrépido guitarrista da banda de mesmo nome, que ainda começa a se soltar. Em “Antes Que Você Conte Até Dez”, versão espetacular do grupo espanhol Fito & Fitipaldis, ele dichava um brilhante duelo de guitarras com Chuck, num dos melhores momentos da noite.

Meneghini e os guitarristas Chuck Hipolitho e Nevilton: unidade apesar das múltiplas referências

Meneghini e os guitarristas Chuck Hipolitho e Nevilton: unidade apesar das múltiplas referências

Como se vê, e como ressalta Tadeu, a noite é também – e bastante – de reverências. E aí não basta as músicas próprias do Vespas terem todos os pés fincados nos anos 1980, tampouco reviver clássicos da época. É preciso tocar duas músicas do Cabine C, o sombrio grupo pós punk que acabou gravando pelo selo do RPM(!), e uma da Legião Urbana, mas a esquisita “Acrilic On Canvas”, tão difícil no bombadaço álbum “Dois”, com a qual o público parece não ter a mínima familiaridade. Do Cabine, a soturna “Nesse Deserto” abre o show sem que ninguém entenda o que se passa, e uma ótima interpretação de “Pânico e Solidão”, um quase hit deles, abre o bis. Essa montagem de set list meio esquizofrênica não contribui para o desenrolar do show, mas realça uma verdade absoluta: o publico se diverte muito mais com as músicas próprias. O que, no fim das contas, é ótimo. (Tem uma entrevista com a banda nesse link).

O legal dessa história toda é que mesmo multirreferenciada, uma banda como o Vespas consegue, de certa forma, manter uma unidade que a caracteriza; não soa uma por vezes inevitável colcha de retalhos mal costurada. Por isso é natural, ainda, a citação de “Cagaço”, de um dos álbuns mais estranhos do Paralamas, em “Um Home Sem Qualidades”, no encerramento final. Pena que, dados os atrasos da produção do Imperator, boa parte do público tenha saído mais cedo atrás de uma condução de volta para casa. Mas antes de dar no pé, seguramente eles curtiram, e com muito vigor, “Sasha Grey”, com um belo solo de Chuck; “O Vício e o Verso”, uma das primeiras a detonar um inevitável pula-pula na plateia; e as já citadas “Cobra de Vidro” e “Não Sei o Quer Fazer Comigo”, disparadas como as melhores performances da noite. Agora, é daqui pro futuro.

Na abertura, o Sound Bullet, que já tem um bom séquito de fãs, fez um bom papel, representando o tal novo rock do Rio de Janeiro. O grupo, cujo flerte com o rock pós 00 é flagrante, parece apontar para outros caminhos, o que é ótimo. Se “Ambição” já começa o show com uma cara de Strokes, e “When It Goes Wrong” mais parece um cover genérico indie (aquela guitarrinha tem endereço certo), “Feeling Good” se transforma em um rockão dos bons, com destaque para o guitarrista Henrique. Ele contudo, parece vibrar mais ao “tocar” um tablet, de onde sai sons de teremim, em duas ou três músicas, do que com as seis cordas. Também falta ainda um pouco de pegada às boas composições da banda e uma postura mais rock’n'roll do vocalista/guitarrista Guilherme, mas isso é questão de tempo. O show teve as participações do guitarrista Bruno Danton, do El Efecto, que o público adora, e do vocal de Saulo von Seehausen, do Hover, outros nomes da nova safra.

O guitarrista/vocalista Henrique e o batera Pedro: o Sound Bullet vai aos poucos ganhando cara própria

O guitarrista/vocalista Henrique e o batera Pedro: o Sound Bullet vai aos poucos ganhando cara própria

Set list completo Vespas Mandarinas:

1- Neste Deserto
2- Daqui Pro Futuro
3- A Prova
4- O Herói Devolvido
5- O Vício e o Verso
6- Antes Que Você Conte Até Dez
7- Distraídos Venceremos
8- Acrilic on Canvas
9- Santa Sampa
10- Que Esse Dia Seja Meu
11- Sasha Grey
12- Estrada Escura
13- Cobra de Vidro
14- Não Sei O Que Fazer Comigo
Bis
15- Pânico e Solidão
16- O Inimigo
17- Um Homem Sem Qualidades

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