No Mundo do Rock

Pra tocar no rádio

Depois de dois EPs virtuais, Vespas Mandarinas lança primeiro álbum e parte para ocupar o vácuo de boa música no mercadão musical brasileiro. Fotos Divulgação: Luca Bori (1) e Facebook Vespas (2 e 3).

Vespa Mandarinas voando alto: Flavio Guarnieri, Chuck Hipolitho, Thadeu Meneghini e André Dea

Vespa Mandarinas voando alto: Flavio Guarnieri, Chuck Hipolitho, Thadeu Meneghini e André Dea

É para isso que os caras do Vespas Mandarinas fazem música: pra tocar no rádio. É o que afirma, sem medo de se feliz ou de ser recriminado, o guitarrista e vocalista Chuck Hipolitho. Antes, não era assim, Chuck fez parte do Forgotten Boys, a esporrenta banda que tinha o dom de misturar – e bem – o punk do Ramones com o hard rock do Guns N’Roses. Com ele, Thadeu Meneghini, que havia deixado outro grupo, o Banzé, formou o Vespas, em 2009. A ideia era fazer música rock e brasileira, pop, que as pessoas entendessem de primeira. Bom começo, hein?

De lá para cá foram dois EPs virtuais (“Da Doo Ron Ron” e “Sasha Grey”) e certo reconhecimento da mídia, em que pese Chuck acumular a função de apresentador da MTV; a troca de baixista e baterista; e um contrato com a gravadora Deckdisc, que resultou na gravação do primeiro álbum. “Animal Nacional” saiu também em formato físico, no começo do ano, e colocou a banda na estrada. O disco, cheio de músicas colantes, reflete bem a intenção assumida pelo grupo: tocar na rádio. Há letras de Bernardo Vilhena (parceiro de Lobão nos anos 80), Arnaldo Antunes e Fábio Cascadura, e uma “versão de rock uruguaio” das mais legais.

Nessa conversa via e-mail, Chuck destrincha as origens da banda e tudo que rolou com o quarteto – completado com Flavio Guarnieri (baixo) e André Dea (bateria) - desde o início, passado pela gravação de “Animal Nacional” até a subsequente turnê que está em curso. Pois se um dia você ouvir uma música deles tocando na rádio, saiba que não foi obra do acaso. Era isso mesmo que eles queriam.

Rock em Geral: Como o nome Vespas Mandarinas surgiu?

Chuck Hipolitho: De um documentário que eu vi sobre as tais vespas asiáticas gigantes e assassinas que alimentam seus filhotes com larvas de abelhas comuns. Achei que era legal por ser feminino, coletivo, asiático, essas coisas. As pessoas têm dificuldade de entender o nome, mas quando vimos o primeiro EP já estava lançado e ficou.

REG: Desde o início da banda sempre houve a intenção fazer rock, digamos, genuinamente nacional? Por quê?

Chuck: Sim, porque era o mais verdadeiro a ser feito. Sentíamos também que havia um puta buraco na história recente de um rock como esse, há quatro anos o cenário era completamente diferente, só havia o buraco. Parece que isso está ficando cada vez mais evidente, outras bandas tem aparecido e chamado a atenção da molecada. Meios de comunicação têm dado importância também. Mas sinto que é algo que está crescendo e está apenas no início. Acho que estamos no fundo do poço do rock nacional, mas estamos nos levantando e subindo.

REG: Vocês sempre citam uma conexão com o rock brasileiro da década de 1980. Você acha que existe um círculo de bandas que pode ser enquadrado num termo desses? Quais?

Chuck: Acho que somos a única que carrega isso genuinamente com força. Também acho que as pessoas associam a gente muito mais ao tal rock 80 do que nós mesmos. Nos sentimos muito felizes com essas referências, porque gostamos de tudo que foi feito naquela época, mas nossos ouvidos estão abertos para coisas de todos os gêneros e de todas as décadas. Acho que isso (os 80) está mais no sangue porque quando estava bombando eu e o Thadeu éramos praticamente crianças e começando a absorver tudo aquilo da forma mais espontânea possível.

REG: Qual seria, então, a conexão mais forte do grupo com esse período do rock nacional?

Chuck: A vontade de tocar na rádio e de ter uma multidão cantando junto com a gente nos shows.

REG: Como surgiu o título “Animal Nacional” e o que vocês querem dizer com ele?

Chuck: Trata-se de um “manifesto” em forma de poema do Bernardo Vilhena, que quase virou uma música. Nele ele diz que é preciso se reconhecer e se entender como brasileiro, é preciso ouvir a voz do mais simples ou ignorante do brasileiro. Todos aqui temos algo a dizer. Acho que não é uma coisa nacionalista, muito mais realista. Achamos que o poema dele refletia muito a nossa visão do que queríamos fazer e de com quem queríamos falar. A música não rolou, mas o título caiu muito bem. Curioso é que o Bernardo também é parceiro em uma das músicas do disco, chamada “Santa Sampa”.

REG: As parcerias com Bernardo Vilhena e Arnaldo Antunes são uma busca por essa identidade à anos 80?

Chuck: Não vieram de uma maneira totalmente intencional, rolaram. O Bernardo já estava fazendo algo com o Thadeu antes de o “Animal Nacional” começar a ser pensado. O Arnaldo chegou na última hora, quando precisávamos de uma letra para a música que virou “A Prova”. Mas é óbvio que nos aproximamos deles porque sentimos vontade. Esses dois são verdadeiros “animais nacionais”. Temos muito orgulho de ter a energia dos dois no que fizemos.

REG: A propósito, quem é Adalberto Rabelo Filho, que assina várias músicas?

Chuck: É o quinto Vespa. Parceiro do Thadeu de longa data, um cara que entende o que a gente quer e escreve as letras de praticamente quase tudo no disco. Um conselheiro também. Sem o Adalberto nada disso estaria acontecendo. Ele era do Numismata e agora toca um projeto muito legal chamado Judas.

REG: Fábio Cascadura também assina duas faixas. Foram músicas compostas para o Vespas ou já haviam sido gravadas pelo Casca? Fale mais sobre essa parceria, digamos, mais noventista:

Chuck: Somos fãs da Cascadura e do Fábio. Eu gosto muito das músicas dele e de como escreve. “Só Poesia” foi uma música que mandei para ele e ele escreveu a letra no dia seguinte e me fez chorar porque para mim refletia um momento específico na minha vida, e “Rir No Final” ele me mandou tipo “tenho isso aqui, faz o que quiser”. Eu dei uma mexida e quase ficou fora do disco, mas quando começamos a tocar o disco para amigos antes de ser lançado, ficou evidente que ela teria que estar no repertório. Eu gosto muito dessa música.

Chuck Hipolitho no Palco da Virada Cultura de SP

Chuck Hipolitho no Palco da Virada Cultura de SP

REG: “Não sei o Que Fazer Comigo”, uma das melhores músicas do disco, curiosamente é uma versão de uma música de um grupo uruguaio. Fale como você teve contato com essa música e como decidiu fazer essa versão:

Chuck: Uma amiga que já conhecia e gostava da versão que fiz para “Antes De Que Cuente Diez”, do Fito & Fitipaldis, me mandou do nada um link para a música. O “Animal Nacional” já estava começando a ser gravado. Eu ouvi a música e pirei na possibilidade de falar aquilo em português, eu nem conhecia o El Cuarteto De Nos. Fiz uma demo, todos gostaram e acabou virando o segundo single do disco. Surreal.

REG: Podemos dizer que o personagem dessa música é você ou é tudo ficção?

Chuck: Na hora de adaptar os versos para nossa língua eu fugi um pouco da letra original tentando trazer para referências nossas, brasileiras. É óbvio que peguei muita coisa da minha própria vida, mas eu nunca fui ovo-lacto-vegetariano, por exemplo. Tem citações de Titãs ali no meio, tem um monte de coisa ali, literalmente.

REG: O disco tem ao menos duas músicas talhadas para tocar em rádio e virar hit: “Cobra de Vidro” e “O Vício e o Verso”. Há na banda uma preocupação/intenção em fazer músicas chicletes como essas?

Chuck: Todas as músicas foram escritas e produzidas para tocar em rádio. Mesmo que não houvesse rádio para elas. Fomos separando um repertório que pudesse ser de músicas diferentes e que pudessem dialogar entre si, e de músicas que proporcionassem possibilidades na hora de gravar e produzir. O Rafa (Rafael Ramos, produtor) ajudou muito com isso. Acho que essa é uma fase atual da banda, de uma ideia que vem se desenvolvendo desde o primeiro dias. Achamos que não há nada de errado em querer tocar na rádio, mas não vamos repetir as fórmulas dos últimos 10 anos aqui no Brasil. Nosso som tem guitarra, e pra caralho - fora as letras. Nesse momento em que te escrevo “Não Sei O Que Fazer Comigo” já está também na Cidade Web Rock, aí no Rio, e na 89, aqui em São Paulo, e algumas rádios do interior já estão pedindo a música. Acho que é um ótimo sinal.

REG: “Cobra de Vidro” ganhou um clipe dirigido por Ivan Cardoso. Por que escolheram trabalhar com ele e como foi o trabalho da gravação do clipe em si?

Chuck: Ele é o mestre o “terrir”, um tipo de terror trash com humor que é feito aqui no Brasil por ele com maestria. Veio como sugestão do Adalberto e foi uma ótima chance de já começar não sendo comum. O Ivan é um artista visceral, 24h por dia criando, não pára. Trabalhar com ele foi exaustivo e gratificante. O clipe ficou mais do que tudo um resultado brasileiro e fora dos moldes plásticos atuais. Foi legal, o clipe ficou no “Top10 MTV” por algumas semanas ao lado de artistas como Justin Bieber, One Direction e Rihanna (risos).

REG: O disco saiu em abril e vocês tem tocado bastante. Como avalia todo o processo, desde a entrada no estúdio de gravação até agora, com a turnê?

Chuck: Tudo super positivo e acima das expectativas. Ainda falta muito trabalho a ser feito e muito mato a ser aberto. Miramos alto com a banda e queremos o máximo de pessoas ouvindo nosso som e indo aos nossos shows, mas é preciso começar daqui de baixo. O problema é que no Brasil não existe esse caminho “do meio”, para fazer a conexão até algo mais profissional e mainstream é preciso achar um caminho único. Nossa preocupação é toda voltada ao profissionalismo e qualidade do que fazemos. Queremos tirar o máximo de cada oportunidade, não fazemos nada sem planejamento. A Marshall acabou de nos procurar com um novo pano de marketing para daqui para frente e escolheu as Vespas Mandarinas como o artista de rock deles. A gente acha que quando alguma marca procura um artista para patrocinar é um ótimo sinal, e começar assim com o aval de uma marca internacionalmente conhecida e de reputação intacta como a Marshall é mais incrível ainda. Nos dá fôlego, confiança e credibilidade para continuar buscando o melhor, sempre. Os shows estão começando a pipocar agora, queremos trabalhar muito.

REG: Antes do “Animal Nacional”, vocês lançaram dois EPs, mas somente em formato digital, certo? Por quê?

Chuck: Muito fácil hoje em dia você montar uma banda de um dia para o outro e gravar um disco na semana seguinte, antes de ter qualquer coisa já tem visual pronto e foto de divulgação e site na internet. Nós queríamos encontrar nosso caminho, ir devagar, achar a química, fazer uma coisa de cada vez. Esse é o nosso lema desde o começo, um passo de cada vez. Aquilo tudo a gente fez sozinho, e deu vários bons resultados. A música “Sem Nome”, por exemplo, teve clipe indicado a “Clipe do Ano” no “VMB 2010” e ficou em 25º nas melhores músicas nacionais do ano na “Rolling Stone” do mesmo ano. Depois veio o “Sasha Grey”, que já saiu pela Vigilante e começou nosso namoro com a Deckdisc.

REG: Algumas músicas desses EPs – boas como “Impróprio” e “Retroceder” - ficaram de fora do álbum, algum motivo específico?

Chuck: Durante o processo de composição e gravação do “Animal Nacional” nossa cabeça mudou um pouco e essas músicas precisam ser re-arranjadas. Mas a ideia era ter um álbum de inéditas, tendo apenas “Cobra de Vidro” com uma espécie de “statement” do rock que fazemos. As músicas antigas continuam no nosso repertório ao vivo conforme vamos conseguindo dar um trato nelas. “Retroceder” é uma das que a gente já tem tocado.

REG: “Impróprio”, por sinal, mostra um flerte com o rock dos anos 00 no qual a banda não investiu muito. Por quê?

Chuck: Mostra? Acho que o que aconteceu no “Animal Nacional” foi natural, não pensamos muito e saiu daquele jeito. Lembro que durante as gravações queríamos até nos afastar um pouco da estética sonora dos 80, mas foi inevitável, está nos nossos ossos, mais do que no sangue. Tem bastante 90 aí também, mas estávamos mesmo era mirando em 2015.

REG: Há intenção de lançar esse material em formato “físico” no futuro?

Chuck: Olha, eu pelo menos quero fazer uma série limitada do “Sasha Grey” em compacto de 7″, e preciso convencer o Rafael disso. O primeiro EP não sei se existe necessidade. Tem uma versão de “Um Homem Sem Qualidades”, com o Mark Arm, do Mudhoney cantando que queremos lançar em algum momento, e ainda quero lançar uma fita k7 demo com as demos do “Animal Nacional”. Vai ser engraçado isso.

REG: Esses EPs estão disponíveis on line para o público que só conheceu o grupo agora, com o “Animal Nacional”?

Chuck: Sim, só entrar no nosso site (www.vespasmandarinas.com.br) que lá tem para baixar de graça.

REG: Planos para um segundo álbum? Músicas novas?

Chuck: Às vezes arriscamos algumas coisas em ensaios, o Thadeu já tem algumas músicas. Certamente será um material muito legal, mas quando chegar a hora. Por enquanto, nosso foco é no agora, e o agora é trabalhar o “Animal Nacional” até a última gota.

Banda na gravação do clipe para 'Cobra de Vidro', dirigido pelo mestre do 'terrir', Ivan Cardoso

Banda na gravação do clipe para 'Cobra de Vidro', dirigido pelo mestre do 'terrir', Ivan Cardoso

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Comentários enviados

Apenas 1 comentários nesse texto.
  1. Alessandra em setembro 6, 2013 às 17:40
    #1

    Estou “in love” com as músicas desta banda. Inclusive as dos EPs que espero um dia tê-los fisicamente para fazer companhia ao “Animal Nacional”, que tá lá na minha estante, com autógrafo do Dea.
    Se depender de mim e da galera que me acompanha, o vôo será ao Infinito. #Beeware!

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