O Homem Baile

Pop e esporrento

Encalacrado no underground, Bob Mould tem noite de superstar para iniciados no Circo Voador. Foto: Reprodução Instagram Circo Voador.

bobmould13O pequeno público que compareceu no domingão no Circo Voador para ver Bob Mould tocar não fazia jus às comemorações de vitória do grupo Queremos, que viabilizou o show através da venda de cotas antecipadas. Em compensação, a plateia composta por iniciados e aficionados indies em geral fez uma festa e tanto, motivada por um rosário de hits undergrounds despejado sem dó por Mould, numa apresentação intensa e sem blábláblá. Se você não é um dos iniciados, saiba que o sujeito é o mentor do Hüsker Dü e do Sugar, e espécie de referência para o som barulhento mainstream da década de 1990, incluindo Nirvana e adjacências. Tá bom pra você?

E o negócio do Bob Mould é a guitarra. Ou, por outra, são as guitarras e o esporro. Há quem justifique a predileção pelo músico por certa doçura embutida em suas músicas, mas elas nada seriam não fosse pela distorção e pelo alto poder – aí sim – de convencimento pop. Não á toa que, no primeiro intervalo de um show frenético, a banda sai do palco e Mould adestra a guitarra de modo que o barulho prossiga inclemente mesmo com o trio tomando um gole d’água nos bastidores. Mas Bob Mould também tem dependurado na parede o diploma de grande compositor pop, embora pouco tenha colocado a cabeça para fora do underground, talvez justamente por sua indelével predileção pelo – de novo – esporro. Bom que tenha sido assim.

O show de Bob Mould, na verdade, são três, visto que há mini sequências matadoras do Hüsker Dü, do Sugar e de sua carreira solo, nesta turnê resumida às músicas do bom álbum “Silver Age”, lançado no ano passado. Uma bênção ele ter omitido o estéril flerte com a eletrônica que macula sua trajetória, muito embora tenha outras músicas que poderiam ter entrado no set. A unificação desses três shows – ou a tentativa de – se dá em pequenos detalhes, como na versão semi estragada (logo nessa Mould?) de “Could You Be The One”, praticamente irreconhecível por conta de um andamento frouxo até chegar ao implacável refrão. De uma forma geral, Mould solo está bem mais próximo das guitarras melódicas bem sacadas do Sugar do que do hardcore diferenciado do Hüsker Dü, e isso é bom.

Mas não são pequenos deslizes que vão ficar na cabeça de quem foi ao Circo no domingo. Nada pode superar a melodia genial de “Helpless” tocada por quem a criou, bem ali na frente, como se fosse a primeira vez que ela saía das antenas de Flu-FM. Ou a crueza pura de “I Apologize”, que desencadeia uma roda de pogo animal. Ou, ainda, o final alucinante e distorcidamente porradaço de “Chartered Trips”. E as imagens? Pense num fã que subia ao palco para beijar o pescoço do cinquentão, em mais de uma vez; nos que faziam simples reverência com um abraço corrido; ou mesmo naqueles que abriram roda no trecho Hüsker Dü da noite. Todos guardarão o show de Mould como o melhor de todas as épocas, e essas imagens permanecerão com a representativa trilha sonora detonada pelo trio. Vale repetir: música boa é pra sempre.

A abertura coube ao Beach Lizards, que teve certo reconhecimento na década de 1990, e que agora só toca de vez e quando, em ocasiões especiais. O grupo mandou muitos de seus hits para uma plateia ainda mais rala que chegava ao Circo. É sempre bom ouvir de novo, mesmo sem a pressão de antes, músicas como “Naive Revolution”, “Friction” e “The Calm After The Storm”, entre outras. Pena que quando o grupo tinha o melhor público da noite, já no final do show, decidiu encerrar com “Don’t Want To Know If You Are Lonely”, do Hüsker Dü, lamentavelmente omitida por Bob Mould. Pra que?

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Comentários enviados

Existem 3 comentários nesse texto.
  1. Vagner em outubro 7, 2013 às 17:26
    #1

    Gostei da crítica e realmente esse foi um dos melhores shows da minha vida, chegando perto do Beastie Boys no antigo Imperator.

    Só uma observação: Bob Mould não cantaria “Don’t Wanna Know If You Are Lonely”, pois a música é do Grant Hart, a outra cabeça criativa do Hüsker Dü. ;-)

  2. Marcos Bragatto em outubro 7, 2013 às 18:58
    #2

    Pois é, eu não sabia dessa.

  3. R-Vox em outubro 9, 2013 às 17:16
    #3

    O que leva a uma questão: teria o Beach Lizards tocado essa música pra zoar o Bob Mould? rsrsrs
    Tirando esse detalhe, o show foi magnífico. Acho que foi o melhor da minha vida também. :)

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