Rock é Rock Mesmo

A baba de Jimmy Page

Um furioso Jimmy Page dispara em minha direção tocando feito um maníaco e babando litros de saliva sobre a guitarra.

Meus amigos, o que é a natureza. E o que é a tecnologia. Depois de um longo e tenebroso inverno volto a escrever neste que deveria ser (e é) o espaço de maior destaque dessa joça. Onde tudo começou. E isso porque, ontem, reencontrei a baba de Jimmy Page. Mas, curiosamente, no que começo a digitar, num computador sem word - diga-se -, é o disco novo de Eric Clapton, “Old Sock”, que está na vitrola. No que tomo a liberdade de disparar que, se não fosse o cometa Hendrix, estaríamos aqui discutindo quem é o maior guitarrista em todos os tempos, se Clapton ou Page. E nesse meio tempo ainda contribuo com minha querida irmã e mentora em um roteiro de viagem para Londres. Ah, Londres.

Mas falava da baba de Jimmy Page. E explico. Não sei onde os amigos estavam na noite de sábado, dia 27 de janeiro de 1996, mas eu estava na beirada do palco montado na Praça da Apoteose com uma câmera fotográfica dependurada no pescoço esperando a entrada de Jimmy Page, Robert Plant e banda. Era a última apresentação da segunda noite daquela que seria a derradeira edição do saudoso Hollywood Rock. Já haviam tocado, nessa noite, pela ordem, Raimundos, Urge Overkill e The Black Crowes. Page e Plant haviam se reunido em 1994, ano em que os entrevistei, para fazer um álbum do tipo acústico para a MTV que eles logo deram um jeito de bagunçar, plugando instrumentos e chamando o disco de “Unledded”, em vez de “Unplugged”. Tanto que esse show, para mim, foi um show do Led Zeppelin, não de Page & Plant. Acreditem.

Mas não é o show que importa aqui. O que interessa é a baba de Jimmy Page. Eis que, durante as três primeiras músicas em que os fotógrafos podiam ficar no fosso entre público e palco, um furioso Jimmy Page dispara em minha direção tocando feito um maníaco e babando litros de saliva sobre a guitarra. Confesso que, por uma fração de segundos, titubeei e olhei fixamente para a cena, antes de, como se diz no jargão fotográfico, soltar o dedo. Sem dó. Uma imagem que jamais sai de minha cabeça é a de Jimmy Page, possesso, babando sobre sua guitarra. Poderia usar - como costumo - as referências do Mestre. Mas não era elástica a baba de Jimmy Page. Nem parecia a que espuma das narinas do cadáver velado na sala do casarão de subúrbio. Muito menos a da velha patusca com os enormes seios sobre o peitoril da janela. A baba de Jimmy Page - claro - tem um “quê” de rock’n'roll.

Em mais de uma das fotos que bati a baba de Page pende com fluência. Uma dessas fotos, inclusive, foi capa de revista, a primeira de várias outras, de quando atuei como fotógrafo. Mas a imagem que guardo é aquela que vi, ao vivo, sem a câmera na frente da cara. Digo isso para ilustrar aos neófitos que vivem a fotografar os shows, com aparelhinhos modernos na frente da gente, que o que vale, num show de rock e em todo o seu entrono, é aquilo que a gente vê e registra na memória, não o que vai parar inutilmente no youtube. Mas o que interessa mesmo é que, meus amigos, nas noites de anteontem (bêbado) e ontem (sóbrio) reencontrei a baba de Jimmy Page. Tive que assistir duas vezes para ter a certeza de não ter passado por um devaneio alcoólico.

Explico que, como de hábito, quando saí, naquele sábado, com o dia ainda claro, em direção à Apoteose para fazer a minha cobertura, coloquei uma fita na velocidade mais lenta, de modo a gravar a maior parte dos shows principais daquela noite. Dias após o show, vi e revi o show e tive a certeza de ter sido um show do Led Zeppelin, sobretudo por causa do baterista (e animal) do Cure na época, Michael Lee, que tocou com Page & Plant - observem que não é Plant & Page, meus amigos - e pela performance final, com a plateia completamente pirada com “Black Dog” e “Rock and Roll”, no bis. Era a centésima apresentação da banda, e a interatividade foi de uma intensidade atroz, com os braços do povão fazendo as vezes de hélices com as camisetas brancas girando no alto. Coisa linda. Só não me lembro, no vídeo, da baba de Jimmy Page. Essa permanecia gravada só na caixola deste que vos escreve.

Só que essa fita VHS guardada a sete chaves não tem mais onde ser tocada, não há mais videocassetes no mercado. E o que fazer com essas gravações históricas e únicas? Nada, meus amigos, nada. Órfão da referida gravação, eis que descubro um sujeito lá do Tennessee, Nashville, que tem um site no qual vende, gravados em DVDs, o que ele chama de “concertos raros”. Cheguei a ele ávido por uma cópia do show do The Sisters Of Mercy no Royal Albert Hall, em 1983, que cobiço há muitos anos, mas essa é outra (boa) história. Ele atende para o Brasil, os preços são módicos, menores que de muito DVD em loja, e a coisa funciona. Foi assim que me vi, de novo, frente a frente com a minha cópia do show histórico, com caracteres toscos e o logo da MTV Brasil. E foi assim que me reencontrei com a baba de Jimmy Page.

A baba que pendia quando ele vinha em minha direção - passe de mágica - reconheci logo. Fosse a imagem mais clara e mais aberta, sem o corte da TV, e teria visto eu próprio, ali na beirada do palco, tal qual um Marty McFly viajando pelo tempo a bordo de um DeLorean. Mas ao longo de toda a apresentação - magnífica - de quase duas horas, Page baba pra valer em várias passagens. O guitarrista sua adutoras furadas em meio ao calor acumulado nos concretos de Niemayer e Sussekind. É um verdadeiro hábito do boca frouxa deixar a saliva sair e verter, misturada ao suor, num processo de desidratação contínuo. O que esse sujeito deve beber de água para permanecer vivo não está no gibi.

Querendo ou não, tenho me aproximado mais de Jimmy Page nos últimos tempos. Vi no cinema o fabuloso show do Led Zeppelin de 2007, que saiu em DVD (saiba mais). Li a boa, embora muito “técnica”, biografia “Luz e Sombra - Conversas com Jimmy Page”, de Brad Tolinski. Dez anos depois do lançamento, comprei o DVD duplo “Led Zeppelin”, primeiro e único oficial da banda. Tenho engatilhadas uma biografia ilustrada lindíssima, e a bio de Mick Wall, indispensável de antemão, que finalmente consegui comprar numa rara promoção no ano passado. Mas, na minha cabeça, nesse instante em que vos escrevo, a fixação é no reencontro com a baba de Jimmy Page.

Até a próxima, e long live rock’n’roll!!!

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Comentários enviados

Existem 3 comentários nesse texto.
  1. Basílio em abril 15, 2013 às 15:06
    #1

    Cara, coloca essa foto aí, vai! Fiquei curiosíssimo!

  2. Fabio em agosto 27, 2013 às 13:38
    #2

    Rapaz… Eu também vi esse show na Apoteose, e gravei em VHS. Tenho a baba registrada! Depois passei esse show prum DVD-R, mas ainda tenho o VHS.
    Ele babou mais que o Dave Mustaine no Maracanã! A baba do Mustaine eu também tenho gravada em VHS.
    E, corrigindo, o Michael Lee (animal) era batera do Cult, e não do Cure… e veio a falecer já tem um tempo.
    Abraço

  3. Fabio em agosto 27, 2013 às 13:43
    #3

    Ah, tenho outros shows originais de VHS que também passei pra DVD… Plant na Apoteose, Aerosmith de 94, Black Crowes, shows do RIR 2 no Maraca…
    Tenho o hábito de gravar Festivais e Jogos do Brasil em copas do Mundo. Os jogos eu tenho desde 82.
    Se tiver interesse em algum show me fala que eu vejo se tenho.
    O aparelho de vídeo cassete eu até tenho, só não sei se ainda funciona pois faz tempo que não coloco pra rolar.
    Mas os melhores shows e jogos eu já converti pra DVD.

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