O rei do improviso
Em show marcado por virtuose e bom humor, Buddy Guy desconstrói e ‘explica’ o blues e suas ramificações; mal educado, público atrapalha. Fotos: Luciano Oliveira.
Buddy Guy também não deixa de lado suas referências e contemporâneos. Usa uma baqueta para solar em “Boom Boom”, de John Lee Hooker; se derrete ao dizer que “I Just Want Make Love To You”, de Willie Dixon, serve para “demonstrar todo o amor” que sente pelo Rio; e tem as palmas do público marcando o som em “Down Don Bother Me”, de Albert King. Em “74 Years Young”, ele desce para fazer um longo solo no meio do povo, retirando os fãs de seus lugares. Pena que o público, mal educado, em vez de mostrar reverência à aura viva do blues, opta por lhe espocar flashes e luzes na cara. O guitarrista encarou a multidão mesmo assim, sem parar de tocar no passeio, mas com muita dificuldade, sempre usando o bordão “wait a minute” para tentar acalmar o alvoroço.
Musicalmente, o show é um espetáculo de virtuose e bom gosto. Ao ser anunciado pelo tecladista Marty Sammon, Buddy Guy já entra no palco solando pra valer, com “Nodody Understand Me But My Guitar”, cujo título resume tudo. É com Sammon que o guitarrista trava os maiores duelos da noite, já na primeira música e durante várias outras, em performances que podem até ser ensaiadas nos bastidores, mas têm um “quê” de improviso extraordinário. O guitarrista Rick Hall, em trajes de jogador beisebol, é também participativo e tem seu momento de glória numa versão arrasa quarteirão de “Hoochie Coochie Man”, de Muddy Waters, logo no início da noite, solando de lado a outro do palco. Não é para qualquer um deixar Buddy Guy como guitarrista base.Curiosamente, Buddy Guy viaja por todo esse repertório, repleto de improvisações, com uma única guitarra, velha e surrada, exceto por “Skin Deep”, já no final do show, quando usa um modelo vermelho, de corpo alongado. E pensar que Noel Gallagher, por exemplo, no mesmo local (veja como foi), praticamente usou um modelo em cada música. Depois de cerca de uma hora e meia, com farta distribuição de palhetas, que quase causou confusão com seguranças na beirada do palco, Buddy Guy se despede enquanto a banda continua tocando. E aí, na hora em que o público deveria entrar gritando por um bis, a luzes se acendem e a cortina é fechada. Pelo visto já estavam todos satisfeitos com seus videozinhos amadores.
Tags desse texto: Buddy Guy