O Homem Baile

Anacrônico

Com banda que pouco dialoga e repertório irregular, show de Erasmo Carlos se divide entre o projeto de rock do presente e os sucessos do passado. Fotos: Luciano Oliveira.

Erasmo canta mais do que toca: o pedestal do microfone inclinado não é mera coincidência

Erasmo canta mais do que toca: o pedestal do microfone inclinado não é mera coincidência

Foi num esquema de superprodução que Erasmo Carlos levou ontem ao Circo Voador o show da turnê do álbum “Rock’N’Roll”. Não é qualquer um que canta à frente de um telão luminoso ladeado por cortinas cafonas em pleno templo da música jovem, muito menos com 50 anos de carreira como coadjuvante do Rei. Erasmo pode, e dá o “boa noite” se dizendo “tão feliz por estar na estrada fazendo o que gosta” e tendo um “orgasmo inenarrável”. Pena a casa não ter recebido tanta gente quanto a carreira do artista mereça; ou talvez seja este mesmo o público do Tremendão, que convive com um aparente anacronismo ao tentar projetar o futuro com os dois pés no passado.

O Tremendão agita ao lado de Billy Brandão

O Tremendão agita ao lado de Billy Brandão

Erasmo leva ao palco como banda de apoio o trio de garotos da Filhos da Judith, que participou do novo álbum, mas é a dupla de guitarrista de grife formada por Dadi e Billy Brandão que divide o papel principal. Não com Erasmo, mas com o velho parceiro, o tecladista/maestro José Lourenço, que trata de pasteurizar qualquer tentativa de a banda de soar, ao menos, atual. Ou seja, os filhos da Dona Judith, que deveriam contribuir para um “up grade” no som do Tremendão - se é que a idéia era essa - acabam num papel secundário. Por isso os melhores momentos da noite vêm quando a dupla de guitarrista se salienta, como em “A Guitarra é Uma Mulher”, a melhor do novo disco, ou nos rocks de salão dos tempos da jovem guarda, como “Fama de Mau” e “Festa de Arromba”.

Rei: clone de Roberto Carlos distribui rosas

Rei: clone de Roberto Carlos distribui rosas

Só que na maior parte do tempo Erasmo Carlos encarna o lado baladeiro de Roberto e saca de seu cancioneiro aquelas músicas que todo mundo sabe cantar sem nunca ter ouvido o disco. “Sentado a Beira de Um Caminho”, “Mulher”/“Minha Superstar” e “Quero Que Vá Tudo Pro Inferno” se juntam à nova “Cover”, que ganha graça pela entrada no palco de sósias tardias de Raul Seixas e Roberto Carlos. O público, de seu lado, também não ajuda. Não dá para se estabelecer uma relação platéia/artista com fãs ralos que agitam com discrição na beirada do placo e observadores à distância que mais acompanham do que participam. Parece que o rock de Erasmo Carlos, hoje, em vez de agitar, amansa.

Não só pelo avançar da idade, mesmo porque Erasmo está bem fisicamente, muito menos por falta de repertório – só os sucessos da jovem guarda agitariam o show de qualquer banda cover de final de semana. Mas falta pegada à banda do Tremendão; é a seleção bem convocada que dentro de campo não atua bem e se salva mais pelo talento individual do que pelo jogo coletivo. Ou seja, melhor deixar os Filhos da Judith seguirem o seu caminho e voltar de vez ao repertório histórico consagrado em 50 anos de estrada, sob arranjos de gosto duvidoso, sim, mas que sempre funcionam. Deixem os meninos com o rock e as baladas para os românticos e saudosistas de plantão.

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Comentários enviados

Existem 6 comentários nesse texto.
  1. Carol Lima em outubro 2, 2010 às 14:41
    #1

    Cara, achei o show 100% de aproveitamento, os músicos se completam no palco, repertório ótimo. Erasmo está maravilhosamente bem, e continua sendo o rei do rock do Brasil.

  2. mj em outubro 2, 2010 às 20:42
    #2

    Me diverti pra caralho no show.

  3. maria silva em outubro 2, 2010 às 21:03
    #3

    Foi demais, adorei!

  4. Leandro Souto Maior em outubro 3, 2010 às 18:05
    #4

    Agradeço pelo Erasmo existir e ser uma lenda viva do rock

  5. Morgana em outubro 3, 2010 às 22:06
    #5

    Discordo com a maioria das coisas que você disse aqui, mas eu sei que você não dá a mínima para a opinião de leitores e escritores colunistas, assim como eu.

    Você falou de fãs parados e ralos, mas talvez você tenha se entretido mais em observar os defeitos, conversar com seu companheiro e acabou deixando passar muitas coisas. Eu mesma dancei com um grupo de pessoas como dançavam meu avô e minha avó juntos.

    Bem, é minha opinião.
    No mais continue tentando o seu bom trabalho.

  6. Henrique em outubro 8, 2010 às 18:20
    #6

    Cara, você gosta de música sertaneja ou pagode paulista (cada um tem o gosto que merece), mas eu gosto é de rock.

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