O Rock Como Ele é

Súbito fim

Desde que se encantara pela pequena, elegeu as baladas do Van Halen como trilha sonora daquela relação que parecia que iria durar uma eternidade.

Aquela garota realmente o havia pegado de jeito. O curioso é que jamais tinha visto a pequena muito menos escutado sua voz. Tudo acontecera na internet, e por mais que os avanços tecnológicos já permitissem o envio de imagem e de som, a severidade econômica da época não lhe permitia tanta coisa assim. Ficara com as fotos, embora fossem as conversas pelo msn o que mais despertava o interesse daquele rapaz, emancipado há pouco de uma família de classe média baixa da zona norte da cidade. Antes de completar um ano de casa no escritório de administração de imóveis, já se pirulitou para o outro lado do túnel.

A ligação com a moça era tanta que, por vezes, ele mal conseguia dormir durante a noite. Pode parecer exagero - e ele taxaria o fato dessa forma, se não estivesse acontecendo com ele -, mas era o que se passava. Primeiro, iniciava a madrugada de namoro com a pequena. Depois, levava um tempão para, já na cama, pegar no sono, pensando em tudo que havia digitado e lido de volta. No dia seguinte chegava morto no serviço para atender síndicos carentes de explicações óbvias. Os colegas de trabalho percebiam que havia varado a noite e faziam chacotas sobre com quem tinha passado. Nessas horas mal conseguia disfarçar o orgulho com um sorriso no canto da boca.

Não queria mais ter uma vida livre. Era bastante jovem ainda, mas descobriu que precisava se sentir preso a alguém. Nunca tivera um relacionamento que proporcionasse isso, e mesmo que se considerasse um sujeito de visão avançada, encarou com naturalidade a idéia de estar num relacionamento firme. Mesmo assim, desde cedo se apegou a ouvir bandas de rock, mas achava graça de ser ainda jovem e se interessar mais por grupos do chamado classic rock do que pelas novas bandas que sempre pipocavam à sua frente. Desde que se encantara pela pequena, elegeu as baladas do Van Halen como trilha sonora daquela relação que parecia que iria durar uma eternidade.

Decidiu que queria sempre estar ao lado daquela menina. Ou, por outra, de frente para o bom e velho monitor de dentro do qual a amada poderia surgir a qualquer momento. Nutria essa fantasia besta como quem deseja a mulher alheia completamente nua circulando pelos corredores do escritório. Lembrava de uma velha música de Lobão, que falava de prisioneiros das grades do vídeo, numa sala que é a nova cela, embora não fosse exatamente fã do falastrão. Não se sentia preso, mas protegido de eventuais danos que um contato ao vivo e a cores pudesse lhe causar, como acontecia nos filmes ou nas novelas de tom popularesco. Que cela, que nada. Estava era no céu.

Aquela garota realmente o havia pegado de jeito. Até que um dia, no horário marcado, a pequena não apareceu. Não era de dar bolo nos encontros, e algo poderia e acontecido. Passado um dia, nada da namorada dar sinal de vida. Mandou e-mail. Mensagem no facebook. Scrap no orkut. Nada. Resolveu telefonar e descobriu que não tinha o número. Não sabia em que rua morava, nem em qual bairro ou cidade. Não tinham amigos em comum nem mesmo no mundo virtual, de modo que, ou a pequena aparecia ou ele jamais voltaria a tê-la. Não apareceu. Já fazia uns seis meses que ele entrava no Google atrás da moça e nada. Percebeu que tinha acabado. Ela realmente o havia deixado.

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