O Homem Baile

Micareta indie

Na segunda edição do Festival Indie Rock, o Gogol Bordello (foto) transformou a praça de rock em praça pública, fundindo ritmos dançantes de qualidade questionável; Super Furry Animals salvou a noite com rock firme e identificado com suas raízes eletrônicas e psicodélicas. Fotos: Michael Meneses (ao vivo) e Reprodução internet (posada).

Eugene Hütz e sua viola mal tocada

Eugene Hütz e sua viola mal tocada

A demora em realizar a segunda edição do Festival Indie Rock colocou como principal atração o grupo que menos tem de indie no universo da música pop – ou ao menos ao que se convencionou chamar assim. Porque o Gogol Bordello, mesmo entrando no palco da Fundição Progresso, no Rio, na madrugada de hoje, quase às três da matina e tocando até ao amanhecer do dia, levou as cerca de três mil pessoas a dançar como se estivessem num animado baile carnavalesco, antes mesmo do réveillon.

Bem que Eugene Hütz e seus acólitos tentaram, numa das músicas, empurrar um sambão de avenida goela abaixo, mas o forte do grupo é a música cigana, folclórica, regional, do leste europeu, ou qualquer outra designação que simbolize uma música tocada por instrumentos exóticos mais comuns a bandas marciais de institutos vocacionais ou à quermesses de dioceses alemãs. Era acordeom de um lado, violino de outro, prato, bumbo preso no tronco de uma das vocalistas/dançarinas, e assim por diante, tudo comandado por uma viola cujo forte não era a afinação – e nem precisava ser.

Porque Eugene comandou a massa assim mesmo, do início ao fim das cerca e 17 músicas – difícil precisar números com uma emendada na outra pela mesma passagem de violão – sem dar tempo para respirar. É tango, reggae, hardcore, tudo embalado por um “lalalá” que faz a platéia pular e soltar gritos de “oi!” ou “hey!” o tempo todo, numa interatividade ímpar, que faz o show parecer uma espécie de micareta indie, com a vantagem de as músicas, embora lineares, monocórdicas e que pareciam ser sempre a mesma, não serem tão ruins como no festejo que dá origem ao termo.

Surpresas talvez tenham ocorrido no bis, quando o grupo tocou duas músicas do cancioneiro popular com a participação de uma família de ciganos locais de verdade. “Frevo Mulher”, de Zé Ramalho, e “Pagode Russo”, de Luiz Gonzaga ganharam rapidamente a roupagem do Gogol Bordello, numa prova cabal de que qualquer ritmo pode ser convertido na pasmaceira étnica propalada pela banda, e – diga-se – muito bem aceita, quem diria, pelo mundinho dito alternativo.

INDIE ROCK DE VERDADE

O figuraça Gruff Rhys e um dos cartazes, sugerindo aplausos

O figuraça Gruff Rhys e um dos cartazes, sugerindo aplausos

Diante do quadro de festejo popular, ficou fácil para o Super Furry Animals levar o troféu de melhor show do festival. Primeiro que o grupo, cascudo, soube montar um repertório na medida, com músicas até sem viço, entre as que abriram o set, mas que se interligavam para acender completamente a platéia. E, depois, porque o vocalista Gruff Rhys, figuraça, ganhava o público com bom humor ao erguer cartazes em letras garrafais sugerindo aplausos, agradecendo, e assim por diante.

Em “Zoom!”, por exemplo, guitarras evoluem ao final no melhor estilo indie, com a colaboração preciosa dos efeitos pré-gravados. O Super Furry Animals é uma das poucas bandas que consegue tecer nuances climáticas utilizando os efeitos eletrônicos com os demais instrumentos. Acontece também na recente “The Very Best of Neil Diamond”, que realça os efeitos, amplificados abruptamente, sem deixar de lado o peso das guitarras. O repertório foi o mesmo do show de São Paulo, à exceção de “Keep The Cosmic Trigger Happy”, que acabou limada, talvez pelo avançar da hora.

O público se soltou mesmo em “The Man Don’t Give a Fuck”, cujo refrão/título ficou ecoando enquanto o grupo saía do palco, e na nova “Crazy Naked Girls”, impulsionada por um efeito de bateria moldado para as pistas. Soou melhor que o programado na psicodélica “(Drawing) Rings Around The World”, uma das primeiras, carregada por um psicodelismo hippie muito mais contemplativo. Depois dessa participação no Festival Indie Rock – e daquela do TIM Festival de 2003 – já está na hora do SFA voltar ao Brasil com um show só pra ele, de maior duração.

FIGURAÇÃO APENAS RAZOÁVEL

Não é a cara do Maradona?

Não é a cara do Maradona?

Na abertura, o argentino El Mato a un Policia Motorizado se mostrou um grupo de indie rock tipicamente do terceiro mundo, que acaba reunindo características de boa parte dos segmentos do mercado internacional. Jesus And Mary Chain, Magic Numbers e Sonic Youth habitam o universo do quarteto, com destaque para a dupla de guitarristas. “Chica Rutera”, com um instrumental malucão, e “Amigo Piedra”, com a inútil participação dos rapazes do Holger, foram as melhores da noite, num show que pouco acrescentou. A platéia se divertiu mesmo com os gritos de “Maradona!” dirigidos ao baixista/vocalista Santiago Motorizado, praticamente um clone do Pibe.

Ao Holger coube o amargo sabor de tocar para cerca de 50 pessoas, embora o grupo paulistano ainda tenha pouco o que mostrar. Eles são identificados com o pop rock dançante de Klaxons e Friendly Fires, mas precisam se organizar melhor. Os cinco rapazes alegres se revezam nos instrumentos, no tipo de banda em que cada um toca um pouco de cada coisa, mas não toca bem nenhuma delas. O que não esconde boas músicas como “War”, guiada por uma boa levada de baixo, e a seca “The Auction”. Mas precisam, antes de qualquer coisa, conversar para saber onde pretendem chegar.

Tags desse texto: , , ,

Comentários enviados

Sem comentários nesse texto.

Deixe o seu comentário

Seu email não será divulgado