O Homem Baile

Lobão faz as pazes com a guitarra

Com banda pesada, músico recicla repertório, reinventa músicas obscurecidas pelo mercado, detona a Lapa e é vaiado ao fazer apologia à São Paulo. Foto: Reprodução internet (show do Projeto SP).

lobaoeletriocospChegou ao Rio na noite de ontem, no Circo Voador, o show “elétrico”, que recoloca Lobão no mercado, depois dos anos em que se dedicou ao projeto “acústico”. E a mudança foi radical. Saem o excesso de músicos e arranjos pernósticos e entra uma banda básica com duas guitarras, volume altíssimo e músicas pinçadas do rico repertório do músico, com finalizações sujas e repletas de peso, que as fazem parecer novinhas em folha. Lobão ressurge do caos acústico imposto pela MTV mais raivoso que nunca.

Assim foi com “Boa Noite Cinderela”, esquecida no subvalorizado álbum “Canções Dentro da Noite Escura”. Voltou densa, cheia de guitarras e efeitos, com Lobão solando muito no final. Ele parece ter descoberto como tirar novos efeitos de sua guitarra, ajudado pelo ótimo guitarrista André, cuja pedaleira precisou ser carregada por dois roadies pra palco, só pra se ter uma idéia. Com muitas músicas de sua fase mais obscura, e ainda com novos arranjos, o público só foi reconhecer e cantar junto na oitava da noite, “A Queda”, que, diga-se, também fez parte do acústico. Antes, em “O Grito”, o baixista é que se revela dono de uma virtuose atroz, fazendo a música virar um funk rock dos bons, num volume a essa altura ensurdecedor.

O público não foi dos melhores – cerca de 300 pessoas -, que venceram um toró de verão em pleno inverno. Lobão não se abalou e soltou pérolas do tipo “eu sou o rain man, a SUDENE, a irrigação do Nordeste”. Ele já chegou a cancelar uma apresentação nesse mesmo local, em 2006, por conta das chuvas. Mas, também, ao anunciar o que chamou de “bloco nostálgico”, lembrou ser “sócio fundador” do Circo Voador, no Arpoador. Desde a época ele não tocava “O Homem Baile”, que voltou, quase 30 anos depois, mais pesada e nervosa. O tal bloco, para a alegria de poucos remanescentes da época, incluiu “Scaramuça” (censurada pela ditadura) e “Robô, Robôa”, todas do primeiro disco, “Cena de Cinema”. E teve ainda “Ronaldo Foi Pra Guerra” e “Decadence Avec Elegance”, que se já flertava com o funk, virou um funk rock arrebenta-assoalho dos bons.

Híbrido, o público clamava por sucessos como “Noite e Dia”, “Canos Silenciosos” e “Vida Louca Vida”, mas tinha uma dura resposta de Lobão: “quem quiser ouvir ‘Vida Bandida’ vai pra casa e coloca na vitrolinha”, ou simplesmente “não vai rolar”, “esse é meu show no-vo”. Em vez dos hits, porradas como “O Homem-bomba”, que, ao vivo, com referências ao Helmet e à música pesada dos anos 90, é quase metal. Tanto que uma das cordas da guitarra de Lobão foi pelos ares. Ela vem colada na renascida “A Hora Deserta Bonanza” (antiga “Hora Deserta”, do álbum “Noite”), carregada por um crescente de guitarras excepcional.

A única nova do repertório fechou o show: “Song For Sampa”, numa referência a cidade em que Lobão reside há cerca de dois anos, por conta de seu trabalho como apresentador da MTV. Foi aí que ele desandou a detonar o samba, choro e bossa-nova “fakes” da Lapa, recebendo vaias dos poucos que resistiram ao avançar do horário e ao repertório com poucos hits. A redenção viria com o bis: a versão sem cortes para “Rádio Blá” e “Corações Psicodélicos” fez todo mundo sair sorrindo e feliz.

Os dois únicos senões da apresentação que resgata o Lobão rocker foram a desnecessária participação de Elza Soraes na pesadíssima versão para o samba “Me Deixe em Paz”, de Monsueto, seguida de um terrível beat box da dupla; e o início do show, quando Lobão transformou “I’ll Be There”, do Jackson 5, numa baladaça à “Starway to Heaven”, e ainda mandou um constrangedor “vai com Deus Michael!”.

Na abertura, o Rockz mostrou estar a cada dia melhor. Com um som de qualidade impecável e volume altíssimo (nem parecia show de abertura), o grupo acertou em cheio ao promover o guitarrista Gabriel Muzak aos vocais. Fruto de mais experiência e entrosamento, a banda está cada vez mais precisa e pesada. Destaque para “Hare Hare”, single do disco “A Tão Sonhada Bicicleta”, lançado durante o show; “Paramedicos” e para a doidaça “To Planejando”.

Set list completo

1- I´ll be There
2- Ipanema no Ar
3- Boa Noite Cinderela
4- Bambino
5- O Grito
6- Sozinha Minha
7- Mais Uma Vez
8- A Queda
9- A Vida é Doce
10- Você e a Noite Escura
11- O Homem-bomba
12- A Hora Deserta Bonanza
13- Me Deixa Em Paz
14- O Homem Baile
15- Scaramuça
16- Robô, Robôa
17- Ronaldo Foi Pra Guerra
18- Decadence Avec Elegance
19- Samba da Caixa Preta
20- Song For Sampa
Bis
21- Rádio Blá
22- Corações Psicodélicos

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