O Homem Baile

Napalm Death derrama ruído incandescente sem dó

Em pouco mais de uma hora, grupo símbolo do grindcore destrói platéia no Circo Voador. Fotos: Michael Meneses/Divulgação.

Existem bandas que têm lugar certo pra tocar e casas de show que são a cara de algumas bandas. Assim é o Circo Voador com o Napalm Death, e por isso a noite de ontem foi mais que especial, mesmo para um público minguado, por força de uma promoção/divulgação canhestra. Mas quem compareceu não fez feio e se deliciou numa daquelas noites históricas, com direito a mosh liberado e muita roda de pogo. Convertido a um quarteto desde a saída do guitarrista Jesse Pintado, o Napalm Death, se perdeu em potência sonora, ao mesmo tempo ganhou em esporro e atitude dos integrantes remanescentes. Quando esteve no Brasil pela última vez, em maio de 2004, Pintado parecia mesmo só tocar por obrigação – o guitarrista viria a falecer no ano passado, vítima de complicações decorrentes da diabetes.

Barney e o público enlouquecido do Circo Voador

Barney e o público enlouquecido do Circo Voador

O som no talo (e de qualidade impecável) garantiu a audição de toda barulheira que impressionava até ao fã mais assíduo. Barney Greenway mantém a performance que o consagrou, caminhado propositalmente trôpego de um lado a outro do palco, soltando os vocais guturais que são referência na música extrema. No repertório, muitas músicas do disco mais recente, “Smear Campaign” (segundo Barney, fala sobre religião), do ano passado, anunciadas individualmente pelo vocalista, num esforço em mostrar o quanto elas são diferentes. Em geral mais longas, e parecidas até com a chamada nova onda do metal americano, contam com os estridentes backing vocals do guitarrista Mitch Harris. Músicas antigas como “Suffer The Children” também tiveram esse up grade. Não por acaso, ela foi anunciada depois de um singelo boa noite: “Somos o Napalm Death, para aqueles que ainda não perceberam”, disse, ainda carregando o típico sotaque inglês, num das poucas colheres de chá oferecidas.

O gente boa Shane Embury chegou a apertar a mão de um fã enquanto tocava

O gente boa Shane Embury chegou a apertar a mão de um fã enquanto tocava

Todos sacaram, sobretudo aqueles que não paravam de abrir rodas e de subir a se jogar de cima do palco. Diversão da maioria, alguns acabaram importunando Mitch Harris, que chegou a dar uns trancos aqui e acolá, e a gerar reclamações por parte de Barney, que viu suas garrafas de água desaparecerem. Já o simpático baixista Shane Embury chegou a parar de tocar por um instante para atender a mão estendida de um fã em pleno show de uma das bandas mais velozes e agressivas em todos os tempos. Dentre as antigas se destacaram (e houve quem reconhecesse) a justíssima “Lie” e “Scum”, faixa-título de um álbum único da história da música, gravado por uma banda que não tinha na formação nenhum dos integrantes de hoje. Do mesmo disco, eles guardaram para o bis “Siege Of Power” e a já quase deles “Nazi Punks Fuck Off”, do Dead Kennedys, de tanto que cantam nos shows.

Os estridentes backing vocals de Mitch Harris marcam as músicas mais recentes do Napalm Death

Os estridentes backing vocals de Mitch Harris marcam as músicas mais recentes do Napalm Death

Para uma banda cujo som se baseia essencialmente no dueto violência/agressividade, não deixa de ser estranho a simpatia de Barney, todas as vezes que falou com o público. Mais ainda a adoção do lema hippie “peace for you all”, repetido no final do set, ao acender das luzes. Mas a cena mais curiosa, vista por todos que estavam nas arquibancadas, foi a de um roadie peso pesado abrindo o case do baixo de Shane Embury antes mesmo de a última música terminar. Foi só o último ruído ecoar para ele guardar e carregar o instrumento, saido à francesa do palco, seguido pelo emburrado Harris. O retrato perfeito de uma banda que nasceu para ser underground pra sempre e não está nem aí pra isso. Os ouvidos - zunindo até agora - agradecem.

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