Com formação incompleta, Keane agrada mais pelo entorno do que pelo conteúdo
Grupo segue a cartilha do rock inglês pós Radiohead, mas sente a falta de instrumentos de acompanhamento; público que foi ao Citibank Hall ontem, no entanto, gostou. Fotos: Marcelo Pereira de Souza.
“Essa é a última guitarra da noite”, disse Gabriel Marques, o vocalista/guitarrista do Moptop, ao anunciar “Leve Demais”, a última música de um animado show de abertura. Ele se referia a ausência do instrumento primordial do rock na formação do Keane, a atração principal da noite, e para quem o Moptop já abrira dois shows em São Paulo, durante a semana. A banda inglesa tem a formação inóspita que inclui, quando muito, dois tecladistas e um baterista. Não quer dizer que dessa mistura não saiam boas músicas, e, conseqüentemente, bons momentos ao vivo; muito ao contrário.
Primeiro porque a banda tem um frontman de respeito. Tom Chaplin já adentra o palco como se fosse um vocalista de bandas de heavy metal, indo para a borda do palco cobrar vibração do público. Em boa parte das músicas ele se mexe muito, com o microfone em uma das mãos e a outra erguida, com punho cerrado. Resultado: a platéia responde na mesma medida, com se fosse uma horda metálica. Mas não só por causa da agitação de Chaplin. O Keane tem a manha de fazer músicas com refrões facílimos de cantar – como os de “Nothing In My Way” e “Bend And Break” -, e, a bem da verdade, alguns hits entre seu público, caso de “Somewhere Only We Know”, uma das mais ovacionadas da noite, e “This Is The Last Time”.
A produção do espetáculo é apurada. Oito telas de plasma recebem imagens preparadas exclusivamente para cada música, e muitas luzes distribuídas no palco contribuem para um visual de chamar a atenção a cada número. O palco recebe uma passarela que leva a banda ao meio do público. Tudo isso chama tanto a atenção que subtrai do banquete aquilo que deveria ser o prato principal: as músicas. Sem músicos de acompanhamento, sobra pouco para o Keane, mesmo nos momentos em que são executadas as canções mais inspiradas. Para piorar, no meio do show, os integrantes vão para a ponta da passarela fazer um set mais intimista, como se fossem de bandas gigantes como Rolling Stones e U2. Péssima idéia para quem tem apenas dois discos no currículo.
A estrutura do palco, se bacana, serve para emular mais ainda o Coldplay (antes de virar U2), se levarmos em conta o belo show deles neste mesmo local, em 2003. No som, mesmo tentado evitar, é facílimo enumerar músicas que poderiam tranqüilamente ser de Chris Martin e cia.: “Try Again”, “A Bad Dream” “Bedshaped”, que fechou um bis de três músicas, e (de novo) “This Is The Last Time”. O esforço de Tom Chaplin – um menino branquinho de bochechas rosadas – não esconde tais deficiências; tampouco o discurso torto de quem “nasceu numa cidade do interior” e “considera o Rio uma cidade exótica e de reputação festiva”. Só que o público, em quantidade bastante razoável para uma banda de pouca projeção, não estava nem aí para considerações desse tipo e fazia sua parte. Cantando quase tudo e agitando o tempo todo (com direito até a um “olê, olê, quinê!”) deixou Chaplin emocionado por mais de uma vez. O vocalista prometeu voltar assim que puder. Vamos ver se, até lá, ele completa a formação do Keane. Ao menos para os shows.
Quanto ao Moptop, entrou bem cedo (quase uma hora antes do horário estampado nos ingressos) e encontrou um público reduzido, mas totalmente nas mãos. Tocando por cerca de meia hora, mandou oito músicas que certamente fariam o repertório do Keane capitular. Ah… Se o Brasil não fosse um país periférico no mundo do rock…
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