Rock é Rock Mesmo

As vaias do Prêmio Multishow

As vaias no Prêmio Multishow mostram que não dá mais para ligar a TV e ver tanta música de baixa qualidade ou com pouca criatividade sendo premiada, enquanto um sem número de novos artistas sequer têm espaço na mídia e no próprio mercado, mas fazem história no meio independente.

Meus amigos, agora é sério. Rock é Rock Mesmo na área. Depois de um mês de ensaios, eis que a coluna estréia de vez neste novo endereço. Tá certo, ainda está tudo muito provisório por aqui, mas este é o único jeito de a coisa ir andando até se acertar direitinho. Não que eu goste das coisas feitas pela metade ou inacabadas, mas a verdade é implacável: não há outra alternativa.

Pra começo de conversa gostaria de cumprimentar todos os que abrilhantam o site Gardenal com suas publicações. É com orgulho que passo a integrar este espaço, e é bom saber que estou bem avizinhado, justo eu que sei bem o que são as más companhias. Depois, não sei se devo, mas acho que vale dizer, mais ou menos, a que se propõe esta coluna. Ela nasceu para falar de rock. Não para ficar descobrindo novidades ou reportando fatos - é uma coluna, não um noticiário. Mas para criar caso mesmo, levantar discussões sobre cada coisinha que envolve o mundo do rock; coisas que intrigam este que vos escreve, que, modéstia a parte, pensa o rock de uma maneira bem própria. Mais ainda, a coluna vem exercendo uma certa vigilância (positiva) sobre a mídia dita especializada (ou não) que volta e meia comete certas injustiças com o mundo do rock. Sempre, evidentemente, com a opinião (e as verdades absolutas) em primeiro lugar.

Hoje, entretanto, talvez eu não fale de rock tanto assim. Não por falta de assunto, coisa certamente impossível com o vasto material que este mundo globalizado nos proporciona. Mas é que algo me incomoda, e eu não posso deixar de falar. Ontem acompanhava o Jornal Nacional, para ficar por dentro das mazelas do nosso governo (hoje tem depoimento de Marcus Valério) e depois via pela enésima vez o sensacional “Escola de Rock”. No que mudei de canal, dei de cara com a entrega do Prêmio Multishow. Nelson Motta, Regina Casé, músicos, famosos e famosas. O que era aquilo?

Vi várias cenas lamentáveis que poderia usar nesta coluna por um mês, como a de Tati Quebra Barraco (dá pra acreditar?) dizendo o nome do vencedor na categoria clipe antes de anunciar os indicados. Mas o que me chamou a atenção foram as vaias. Sim, meus amigos, teve gente que ganhou prêmio e saiu vaiado. Premiações, em geral, trazem sempre certas polêmicas. Quem não se lembra do ano em que o Jethro Tull faturou o Grammy como melhor banda de heavy metal e deixou o Metallica em segundo? Qualquer cidadão de inteligência eqüina percebe, já pelo nome, que a segunda banda é do ramo, e a primeira não. Esse tipo de vacilo acontece sempre. Mas não a vaia. Não lembro de ter visto vaias em outras premiações. Talvez a indignação dos reaças pró-Bush quando Michael Moore foi premiado no Oscar, mas nada tão significativo como eu vi ontem pela TV. Eis onde eu queria chegar: o Prêmio Multishow foi vaiado.

Tanto que Regina Casé se incomodou. Não tenho nada contra Regina Casé. Nem a favor, a bem da verdade. Para mim, embora engraçada no passado, desde os tempos do Asdrúbal Trouxe o Trombone, passando pelo genial TV Pirata, hoje a considero uma pessoa ignóbil. No passado, já há uns dez anos, um afamado colunista da Folha de São Paulo destruiu, com maestria, toda a persona de Regina Casé. No dia seguinte foi demitido em público, no próprio jornal. Hoje o jornalista, que deixou muitas viúvas por aí, vive de publicar gibis legais e livros bacanudos. No seu lugar está lá na Folha o Álvaro Pereira Jr. Mas falava das vaias e de Regina Casé. Incomodada com o apupo, a apresentadora, que, diferentemente do elegante Nelsinho Motta, queria aparecer mais que o necessário, tratou de defender quem a contratou. Foi óbvia ao dizer que, quem escolhe os vencedores do Prêmio Multishow, é o povo, e, portanto, as vaias não se justificariam.

Assim como eu, a alentada apresentadora se incomodou com as vaias. Mas eu gostei, apesar de, confesso, não lembrar exatamente para quem foi a assuada. Talvez tenha sido para o Júnior (ele agora tem um sobrenome, mas eu não lembro), que, acredite se quiser, venceu como melhor instrumentista, numa categoria onde concorria, entre outros, Edgar Scandurra. Embora tenha escrito isso com certo constrangimento, digo que não importa quem foi vaiado, mas a vaia em si. E mais: a reação da apresentadora dizendo que a escolha foi do povo, o que deveria demover qualquer intenção de contrariedade por parte da platéia.

Pois eu digo: mesmo que a escolha fosse feita pelo povo, ainda assim estaria passível de ser vaiada e reprovada pela platéia abastada que compareceu ontem ao Teatro Municipal, no Rio. Está provado historicamente que o povo erra muito antes de acertar. E se a voz do povo fosse realmente a voz de Deus, seríamos todos ateus. Mas vou mais longe. Ou, por outra, ao ponto. Povo é uma ova. Não é o povo quem escolhe. São os internautas. Ou melhor: os internautas interessados em música. Ou, ainda: os internautas interessados em música e que têm a assinatura de TV à cabo. Deu pra perceber a minoria que participa da votação? Qualquer estatística sobre o assunto vai apontar que é um percentual mínimo da população brasileira que participa. E nem vou entrar no mérito das campanhas que as assessorias dos artistas fazem e dos respectivos fã clubes (só isso explica, sem justificar, a premiação do irmão da Sandy). É o povo quem escolhe, Dona Regina?

Dito isso, vou abordar outra questão. Antes, devo dizer que excluirei as pressões e lobbies por parte de empresários e gravadoras. Mas, pense bem. Em tese, o assinante do canal Multishow vota em artistas que ele conhece, entre outras fontes, por terem espaço no próprio canal. E qual o critério pra a exibição de videoclipes de um canal de entretenimento? Na melhor das hipóteses, há parâmetros de notoriedade, qualidade técnica, etc. E o assinante do canal, até por natural indução, vai votar naquilo que ele assiste no próprio canal. Isto é: faz-se o assinante ter acesso a um restrito número de artistas, e a escolher dentre esses artistas quais os que devem ser premiados, num belo círculo vicioso. E isso sem falar que a indicação preliminar não é feita por votação, mas pela curadoria do Prêmio. Tudo pra justificar a votação popular alegada pela alegre apresentadora. É ou não é para se mandar uma boa vaia?

Vejam bem, meus amigos, não quero aqui desqualificar a premiação, nem os agraciados com a estatueta. Considero importante esse tipo de evento, e é preciso premiar quem e destaca na música brasileira. Mas se é para fazer, vamos fazer direito. Porque senão, seremos obrigados a aturar a verdadeira palhaçada que foram os resultados de ontem. Por exemplo? O prêmio de melhor instrumentista para Júnior; o de melhor CD para Marcelo D2, que não lança nada de novo desde 2003; Pitty, que também não faz nada de novo há dois anos, como melhor cantora (ela pode ser melhor tudo, menos isso); “Vamos Fugir”, que é uma versão feita há séculos como melhor música; e até o Dead Fish, com 13 anos de história, concorrendo na categoria revelação. É mole?

Por fim, há que se registrar – de novo – que há algo de errado no mercado da música brasileira. Não dá mais para se ligar a TV e ver tanta música de baixa qualidade ou com pouca criatividade sendo premiada, enquanto um sem número de novos artistas sequer têm espaço na mídia e no próprio mercado, mas fazem história no meio independente. Acho que tem muita gente por aí precisando abrir os olhos pra não perder o trem dessa história. Se é que já não perderam.

Até a próxima, e long live rock’n’roll!!!

Nota: Ao estrear neste novo espaço, não poderia deixar de agradecer a Alexandre Matias, que fez a ponte entre esta coluna e o site Gardenal; Pablo Miyazawa e Bruno Furnari, que mesmo ocupadíssimos criaram o espaço para a publicação do site que está sendo preparado; Flávio Flock, de antemão, pela paciência com que vem montando este site; Bruno Natal, pela força; e Lia Portocarrero, pelas boas vindas.

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Comentários enviados

Apenas 1 comentários nesse texto.
  1. Chris em setembro 7, 2011 às 11:55
    #1

    Essa merda toda é por causa da ascenção das classes C, D e E ao paraíso do consumo. Então dá-lhe música BREGA, o pior mesmo é quando se da a união de rede de TV, mídia impressa, rede de rádio e gravadora de disco, tudo do mesmo dono querendo o monopólio do mercado…

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