Rock é Rock Mesmo

O fim da modernidade está próximo

Em meio à apoteose dos indies e modernos, nosso colunista identifica, com a antecedência cavalar de um ano, a decadência da modernidade. Justo agora. Justo agora. Publicado originalmente no Dynamite on line.

Ouvi dizer que as empresas que prestam serviço de telefonia andam sem dinheiro. Alguém a credita? Alguém deve acreditar. Talvez até isso explique o fato de o TIM Festival não ser mais realizado simultaneamente no Rio e em São Paulo, mas sim alternadamente, a cada ano, em uma das duas cidades. A lei que proibiu o patrocínio de empresas de cigarros em eventos culturais caiu muito bem, em temos politicamente corretos como o nosso. Mas, de outro lado, a privatização dos serviços de telefonia foi o maior “negócio da China” de que se tem notícia. Daí, a olhos distantes, não se justifica a TIM não fazer o evento como ele se consagrou. Mas não sou eu que vou aqui ficar reivindicando um TIM Festival perto de mim, mesmo porque a falta dele não vai interceptar minha trajetória rumo à modernidade. Mas não vai mesmo.

Sábado passado, por exemplo. Não sei porque, mas às vezes as lembranças da década de oitenta não me saem da cabeça. O consolo é que não saem também da cabeça de um monte gente. Jornalistas principalmente. Ou foi uma década realmente muito marcante, ou a maioria das pessoas que têm espaço em veículos jornalísticos e na mídia, de uma forma geral, viveu a adolescência/juventude nesse período, daí isso marcar muito o que se tem disponível em termos de informação por aí. Será que o mundo vai ser assim? Na década de 01, vamos todos ficar dizendo que os anos 90 é que eram bons? Aí só perguntando ao Maluco da Praça.

Mas voltemos o sábado passado. Fizeram aqui o que foi chamado de mini TIM festival, pocket festival ou algo que algum jornalista assim designou. No sábado, ser moderno significava ir ver uma banda que foi vanguarda na década de 70, pelo uso inovador de sintetizadores e afins. E eu me lembrando, exaustivamente, dos anos 80. Explico. Naquela época, o vídeo cassete era uma novidade. Na minha casa, como sempre, novidades tecnológicas como a televisão e telefone demoravam mais a chegar, assim como o vídeo cassete também demorou para dar o ar da graça naquela lar pseudo classemediano. A saída era as chamadas salas de vídeo. Simples: quem tinha grana comprava um aparelho e várias novidades em VHS, e exibia em salas, mediante o pagamento de um ingresso, como no cinema, por exemplo. Me lembro de ter me deslocado até a longínqua Jacarepaguá, para ver o genial “Synchronicity”, do Police, e ainda das centenas de pessoas que foram ao Estádio de Remo da Lagoa para ver “U2 Live In Berlim”, com direito a promoção de rádio e tudo.

Temos então, uma fusão de épocas. Sim, meus amigos, porque o show do Kraftwerk que eu presenciei no sábado, na verdade não era um show, mas sim uma exibição de vídeos. E das melhores. Porque a sincronia e a temática futurista/retrô é das mais interessantes, e, fato raro, mexe com cabeça da gente. Mas não me digam que aquilo era um show, porque não era mesmo. E repito. Show é com banda, tocando instrumentos pra valer. E, segundo consta, computador não é instrumento musical, e apertar a tecla play nunca foi tocar instrumento. Uma única pergunta, pra matar a questão: Se os quatro engravatados saíssem do palco, faria alguma diferença? Claro que não. Tanto que eles saíram na música “Robots”, e tudo (o som gravado, a exibição de vídeos) continuou acontecendo. Taí a prova cabal: uma coisa é uma coisa; outra coisa é outra coisa.

Sábado o Armazém 5 tava até cheinho, apesar de os modernos, calculávamos, terem ido para o TIM versão integral do outro lado da Dutra. Segunda, porém, era a vez de Primal Scream e Libertines. Eu, sinceramente, esperava que a volta dos modernos, e mais a chegada de modernos bregas paulistanos fosse levar o armazém a pique. Porque indie, pensávamos, tem grana. No fim das contas, tínhamos apenas um parco público, que se encolheu ainda mais diante da imensidão do galpão acostumado a guardar containeres. O que me levou a seguinte reflexão: onde estão os indies? Onde foram parar os modernos? A modernidade estaria em decadência? Justo agora que eu estou (arredondando) dentro dela?

O engraçado é que, enquanto uma muralha e guitarras estuprava meus ouvidos, durante o show do Primal Scream, avistei meu amigo Moderninho de Plantão. Sabe, somos amigos há décadas, e sei que não posso interrompê-lo num momento desses. Mas, de longe, identifiquei nele um semblante paradoxal. Ele deveria ser o mais feliz ali entre tantos jovens de sorte, que podem ver suas bandas preferidas enquanto elas ainda guardam certo frescor. Mas sua face, refletindo as luzes do palco, guardava algo de indecifrável. Eu, para não dar bandeira de “out of scene”, me curvava às guitarras do Primal.

Já no Libertines, aconteceu um fato curioso. A cada música, parecia que alguém, lá atrás do palco, levantava uma placa com os dizeres: “o último a sair apague a luz”. E a cada música, um grupo de táxis lotados deixava a zona portuária. Porque indie é endinheirado, supúnhamos. E o que falta ao Libertines? Em uma palavra? Noção. Sim, meus amigos, falta-lhe noção de que as coisas, salvo raras e interessantes exceções, não acontecem de uma hora para a outra. Mimados pela mídia e por jornalistas alvissareiros, eles acabaram acreditando no contrário. Noção de que é preciso boas músicas, em qualquer segmento da música pop. Noção de que, repito, uma coisa é uma coisa; outra coisa é outra coisa.

Encontrei, enfim, meu amigo Moderninho de Plantão. Vestido de uma maneira cool e elegante, ele me parecia um tanto decepcionado. Para ele, Primal Scream é praticamente um dinossauro, no alto de seus 20 anos, e Libertines já tá meio passado, querendo apodrecer de velho. Para mim, a modernidade está em franca decadência. Justo agora. Justo agora. Mas deixo para de registrar seu fim definitivo e irrevogável, com firma reconhecida e selo de qualidade, no próximo ano, quando um novo TIM Festival se instalará no Rio. Eu, Thom York e o Radiohead esperamos por todos.

Até a próxima, e long live rock’n'roll!!!

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