Invencível
Em turnê comemorativa de 60 anos, Scorpions reforça perenidade do repertório e mostra vitalidade aeróbica em show com ‘pegada Vegas’ para grande público no Qualistage, no Rio. Fotos: Daniel Croce.
Não se faz cinco mil shows em menos de seis décadas muito menos mantendo a extraordinária vitalidade da dupla de guitarristas Rudolf Schenker, 76, único remanescente da formação original, e Matthias Jabs, oito anos mais jovem, que se revezam em solos e circulam de lado a outro do palco de maneira frenética. Eles fazem todas aquelas coreografias ensaiadas que o rock de verdade exige, empunhando as guitarras, girando, com o semblante sendo a continuação do que tocam, saltando eles próprios e, ao mesmo tempo - não se enganem -, tocando pra cacete. O auge dessa dança dos quintos dos infernos vem com a instrumental “Coast to Coast”, quando os passos ensaiadinhos conduzem os quatro - além dos guitarristas, o baixista Paweł Mąciwoda e o vocalista Klaus Meine – para o centro do palco no meio do público, em um desfecho repetido e aclamado há anos, em um dos grandes momentos da noite e do rock em todos os tempos.
Das 27 turnês mundiais já feitas pela banda alemã essa seguramente é a que se teve maior dificuldade de montar o repertório, em que pese o fato de, além de farto cabedal de sucessos acumulados ao logo dos anos, volta e meia eles aparecem com um disco de músicas inéditas. Do mais recente, o ótimo “Rock Believer”, de 22 (segundo consta foi feito em cima de sobras de composições inacabadas dos anos 1980), apenas “Gas in the Tank” é tocada, e muitíssimo bem recebida, com o público cantando o refrão como se já clássica a música fosse. Plateia de idade variada para uma banda tão antiga, e que enche o local, de modo que nem foi preciso a instalação daquelas cortinas no fundo, usadas para disfarçar a eventual escassez de público. Por outro lado, o reinserido medley com músicas mais antigas, incluindo a ótima “Speedy’s Coming”, não tem tanta adesão assim, a não ser por este ou aquele senhor de idade mais avançada e memória preservada no meio do povaréu.Tocar em 83 países em um mundo que nem sempre foi tão sem fronteiras não é para qualquer um, e não é exagero dizer que o Brasil e a Cidade Maravilhosa fazem parte de ao menos um capítulo a se salientar dessa história. É o que diz Meine, sem cair no clichê de “vocês são a melhor plateia do mundo”, ao se lembrar do Rock In Rio original, de 1985. “Quem estava lá?”, ele pergunta, citando outras bandas que também tocaram no festival, antes de a banda tocar “Send Me an Angel”, dedicada a Freddie Mercury, o vocalista que também brilhou com o Queen na mesma edição do festival. Na beirada do palco, o vocalista se emociona a olhos vistos com a cantoria da multidão. Klaus Meine, quase 77, parece fisicamente o que tem a saúde mais fragilizada, chega a caminhar com certa dificuldade pelo palco, mas mantém incrivelmente boa a voz anasalada que lhe é peculiar, com ótimas sustentações vocais durante os mais de 100 minutos de show.
Tempo que parece ser o maior da turnê até agora, neste que é apenas o quarto show, com 18 músicas no total, incluindo o divertido solo de bateria de Mikkey Dee, que cita Motörhead, banda na qual tocou e fez fama durante muitos anos, a partir da imagem de uma máquina caça níquel de cassino exibida no telão. O show inclusive tem uma “pegada Las Vegas”, com muito material de imagem usado nas residências de noites seguidas que o Scorpions costuma fazer na cidade do jogo, reaproveitado nessa nova turnê. Curiosidades no set são as participações do filho de Dee, Marcus Delaoglou, que faz as vezes do pai em “Tease Me Please Me” e “Big City Nights”, e do guitarrista e faz tudo Ingo Powitzer, que, meio sem graça, substitui Rudolf Schenker na ótima “Delicate Dance”. A música, apresentada pela primeira vez no disco “MTV Unplugged - Live in Athens”, de 2013, portanto “nova”, é outra pérola da noite. Instrumental, dá mais um tempinho de descanso para Meine.Mas o que se destaca mesmo no repertório é a inclusão de nada menos que seis das nove músicas do álbum “Love at First Sting”, lançado há 41 anos e disparado o maior sucesso da carreira da banda, o que remete – de novo – ao Rock In Rio original. O encerramento da primeira parte com “Big City Nights”; o arremate da noite com a imbatível “Rock You Like a Hurricane”, de riff de guitarra igualmente indefectível, feita pra gritar com braços erguidos e punhos cerrados; e a bela e pouco tocada “I’m Leaving You”, são três das dignas de registro, em noite em que a grande ausência é a grudenta “No One Like You”. Mas – acredite se quiser – a mais pedida e comemorada ao ser tocada pela plateia é “Still Loving You”, a madame das baladas, justamente porque vinha sendo omitida em shows recentes da banda. Ou seja, nem a cafonice afasta o Scorpions e o seu legado do interesse das massas. Ao contrário, o aproxima mais e mais.
Set list completo:1- Coming Home
2- Gas in the Tank
3- Make It Real
4- The Zoo
5- Coast to Coast
6- Top of the Bill/Steamrock Fever/Speedy’s Coming/Catch Your Train
7- Bad Boys Running Wild
8- Delicate Dance
9- Send Me an Angel
10- Wind of Change
11- Loving You Sunday Morning
12- I’m Leaving You
13- Solo bateria + baixo
14- Tease Me Please Me
15- Big City Nights
Bis
16- Blackout
17- Still Loving You
18- Rock You Like a Hurricane
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