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Magistral

Em espetáculo de técnica e bom gosto, Dream Theater acolhe volta de filho pródigo, revê 40 anos de carreira e mira novo álbum. Fotos: Daniel Croce.

O vocalista do Dream Theater, James LaBrie, em ótima forma depois de quatro décadas de atividade

O vocalista do Dream Theater, James LaBrie, em ótima forma depois de quatro décadas de atividade

No telão gigantesco instalado no fundo do palco imagens recriadas citam cada álbum lançado nas últimas décadas, um por um, uma imagem mais marcante que a outra. Das caixas de som se ouve uma peça sinfônica orquestral gravada previamente que cita músicas de cada um desses discos, rapidamente, cada trecho fundido um no outro, e o público é que se vire para identificar. Curiosamente, a música que é tocada em seguida não está em nenhum desses discos, mas naquele que ainda está por vir e cuja capa surge em um átimo de segundo, no arremate do vídeo. É assim que o Dream Theater volta ao palco depois do intervalo, em um Vivo Rio empanturrado de gente, nesta sexta (13/12), no Rio, para apresentar “Night Terror”, espécie de “avant première” do novo álbum, que só sai no ano que vem.

Tecnicamente, porém, é a turnê de aniversário de 40 anos da banda símbolo e referência do progmetal mundial, e por isso não há economias em um espetáculo que cobre nove dos 15 álbuns desse tempo todo, com três horas e pouco de duração, em que pese o tal intervalo, de 15 minutinhos. A citada “Night Terror”, pesada e cheia de idas e vindas como reza a cartilha da banda, rasga a plateia no meio com um frescor surpreendente para uma banda tão longeva. Não que o público - exceção na noite – contribua muito, já que parece pouco familiarizado com a novidade, mesmo a faixa tendo sido lançada há uns dois meses, uma eternidade nesses tempos tão estranhos. Trata-se de puro suco de Dream Theater, com ênfase em passagens instrumentais intrincadas, mas cativantes ainda assim, certo crescimento ao vivo, e o plus de duelos seguidos entre o guitarrista John Petrucci e o tecladista Jordan Rudess com o baterista Mike Portnoy.

O guitarrista John Petrucci brilha em duelos individuais com outros integrantes e também em solos

O guitarrista John Petrucci brilha em duelos individuais com outros integrantes e também em solos

Alto lá! Mike Portnoy? “Ah, o Portnoy voltou, o Portnoy voltou…” é o que canta a multidão, em português mesmo, em ritmo de torcida, antes de “The Mirror”, a quarta música da noite, segundos antes – coincidência ou não – de o vocalista James LaBrie apresentar o filho pródigo que à casa torna. Lembre-se que, membro fundador do grupo, Mike Portnoy pulou fora em 2010 em meio a uma fofocada dos diabos, com advogados, pedido de retorno em seguida prontamente negado e até espécie de reality show pseudo secreto que escolheu o bravo Mike Mangini como seu sucessor (puxe o fio por aqui). E o fator Portnoy conta já na disposição de uma exuberante e vistosa bateria com três bumbos e milhares de peças. Na verdade, é a fusão de dois kits, um central com duplo bumbo, e outro mais à esquerda, aparentemente mais simples, se é possível o termo em se tratando de Dream Theater, no qual ele se reveza. A lembrança do saudoso Neil Peart é instantânea.

Não por acaso toca as únicas duas músicas do set que não foram originalmente gravadas por ele nesse “segundo kit”. “This Is the Life”, lentinha insossa que que se converte em dramática balada, com debulhagem de Petrucci, e a pulsante “Barstool Warrior”, já tocada por aqui na turnê do álbum “Distance Over Time (2019), uma das que Mangini se destacou (relembre). Mike Portnoy – claro – tira as duas de letra, em que pese a performance individual de todo o quinteto, incluindo o plácido baixista John Myung. O repertório é de clássicos, exatamente o mesmo de toda a turnê, com certa ênfase no álbum “Metropolis Pt. 2: Scenes From a Memory”, de 1999, cujas músicas praticamente começam e terminam o show. Destaque para “Act II: Scene Eight: The Spirit Carries On”, de sotaque floydiano modo “The Wall”, que causa certo clima de comoção generalizada no público, e tem LaBrie com os vocais (tratados durante o show com insuspeitas ingestões) em ótima forma, e isso depois de quase três horas se esgoelando.

Jordan Rudess e o teclado com projeção de vídeo e giro tridimensional em todas as direções possíveis

Jordan Rudess e o teclado com projeção de vídeo e giro tridimensional em todas as direções possíveis

Duas pérolas, contudo, chamam a atenção. Primeiro, a inclusão de “Stream of Consciousness”, do fatídico álbum “Train of Thought”, de 2003. Trata-se de uma excepcional instrumental colante do início ao fim, na qual todos se superam em arrojadas evoluções, sem partes necessariamente “solo”, em um dos momentos mais empolgantes da noite. Depois, coladinha nela, aparece a incrível “Octavarium”, faixa-título do disco de 2005, com todas as idas e vindas instrumentais e mudanças de andamento que os fãs de rock progressivo (põe peso que vira progmetal) adoram. E o que o público acompanha cada trecho, cantando, com braços erguidos, etc, é uma enormidade: são mais de 20 minutos de pura alegria. Outros números que se salientam são a densa “As I Am”, conduzida pelo riff de guitarra quicante e com direito a duelos entre John Petrucci e Portnoy, e “Hollow Years”, outra lentinha de início que Petrucci salva com o solo final.

Tudo isso tocado com uma produção visual impecável que inclui iluminação projetada especificamente para este show, feixes de raios laser lançado sobre o público o tempo todo, e o já citado telão gigante tripartido que vaza para o praticável da bateria e até no frontispício do super teclado de Jordan Rudess. A cada ano mais turbinado, ele gira tridimensionalmente em todas as direções. Rudess ainda usa um segundo instrumento, menos espalhafatoso, justamente em “Octavarium”, e um keytar na cantarolante “The Mirror”. O desfecho do bis – e tinha que ser assim – é com o hit maior do Dream Theater em todos os tempos e lugares: “Pull Me Under”. A música, que já foi espécie de “Stairway to Haven” deles, já que não gostavam de tocá-la, tem pegada thrash metal é uma das mais emblemáticas do domínio do metal e suas ramificações da década de 1990. Resultado: pula-pula generalizado no Vivo Rio lotado e até abertura de rodas e dança. Um prêmio final para quem, desde bem cedo, fazia a fila de entrada crescer até o Aterro do Flamengo.

O plácido e eficiente baixista John Myung, aqui esticando os longos dedos no braço do instrumento

O plácido e eficiente baixista John Myung, aqui esticando os longos dedos no braço do instrumento

Set list completo

Parte 1
1- Metropolis Pt. 1: The Miracle and the Sleeper
2- Act I: Scene Two: I. Overture 1928
3- Act I: Scene Two: II. Strange Déjà Vu
4- The Mirror
5- Panic Attack
6- Barstool Warrior
7- Hollow Years
8- Constant Motion
9- As I Am
Parte 2
10- Night Terror
11- Under a Glass Moon
12- This Is the Life
13- Vacant
14- Stream of Consciousness
15- Octavarium
Bis
16- Act II: Scene Six: Home
17- Act II: Scene Eight: The Spirit Carries On
18- Pull Me Under

Mike Portnoy volta às baquetas do Dream Theater com esse vistoso kit de bateria do tipo dois em um

Mike Portnoy volta às baquetas do Dream Theater com esse vistoso kit de bateria do tipo dois em um

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