Pesado, mas também incomum
Ao vivo, Jinjer reforça o metal moderno e repleto de peculiaridades que encantam o ótimo público do Circo Voador. Fotos: Daniel Croce.
Estamos falando de death metal, metal moderno, metal pesado e adjacências, mas a paisagem da banda no palco já se mostra, de antemão, como algo incomum. Senão, vejamos: a) da esquerda para a direita, um guitarrista de cabelos curtos e boné, uma vocalista bidimensional com espécie de calça boca de sino de pescador, um baixista de coque samurai com instrumento de cinco cordas aparentemente mais grossas; b) no fundo, um kit de bateria todo inclinado para a frente e com as peças mais baixas, parecendo que vai despencar a qualquer momento, para um jeito de tocar jamais visto no ramo; e c) palco todo limpo, apenas com uma plataforma para Tatiana brilhar, pano de fundo simples, preto, com o nome da banda e luzes fracas que fazem do obscuro acertada opção. Quem já viu show de qualquer subgênero do heavy metal assim que venha com o primeiro bater de cabeça.
Tudo cenário para o que realmente interessa: um tipo de som definitivamente incomum, mesmo que, no fundo, no fundo, tenha lá, o tempo todo marcas indeléveis da música pesada global, só que acrescida de referências musicais de áreas diversas, sem esquecer da origem da banda, que é da Ucrânia. As mudanças de andamento da pesada “I Speak Astronomy”, com linhas de baixo de Eugene Abdukhanov, que volta e meia parecem ser de outra música em relação ao que os demais estão tocando, é coisa bonita de se ver ao vivo. As variações de bateria de Vladislav Ulasevich em “Someone’s Daughter”, por exemplo, são de grande associação de perícia técnica com criatividade, e o guitarrista Roman Ibramkhalilov, que as vezes parece fazer um acústico dedilhado no meio de tanto esporro, vive de intrincadas passagens e riffs pesados, como na quase romântica “Perennial”. Nessa massa sonora a esguia Tatiana Shmayluk deita e rola com enorme facilidade em alternar vocais rasgados/guturais com a uma bela cantoria afinada. E sem muita conversinha com o público; é de marra que vocalistas precisam.O show faz parte da turnê latino-americana e, se praticamente pula o disco mais recente, “Wallflowers”, de 2021, representado solitariamente por “Copycat”, já inclui cinco faixas do próximo trabalho, “Duél”, que sai só em fevereiro; incomum, não? Como elas vêm sendo postadas para audição gratuita na web, o público já conhece e canta junto, não representando problema, muito embora fechar a noite com uma delas, “Rogue”, não deixa de ser uma atitude de coragem. Dessas cinco, destacam-se “Fast Draw”, um hardcore quase raiz, em se tratando de Jinjer, assim anunciado por Tatiana, e “Green Serpent”, que realça a guitarra sombria – e intrincada, de novo - ao vivo e se identifica fortemente com o nu metal e suas ramificações. É um para-continua de bonito de se ouvir e gostoso de se ver.
A apresentação é curta, com pouco mais de 70 minutos de duração, mas são assim os shows contemporâneos e parece se encaixar bem um uma noite que que tocaram ainda Heaven Shall Burn (veja como foi) e as locais Innocence Lost e Clava. A participação do público, com aquele núcleo giratório, palmas no ritmo das músicas, braços erguidos em coreografia ensaiada e canto de “olê, olê, olê, Jinjê!” é show à parte que chama a atenção dos músicos. Em “Retrospection”, Tatiana Shmayluk recebe de um fã no meio do povaréu um quadro emoldurado com a imagem dela e canta com ele na frente do rosto, fazendo, ao vivo, espécie de meme de si própria. No fim das contas, fica colado o selo de qualidade e de certo modo, popularidade, pois, sabemos todos, não é nada fácil ter aceitação quando se investe em um tipo de som cheio de peculiaridades com o Jinjer. Muito mesmo no ambiente por vezes monótono da música pesada. Que voltem logo!Set list completo
1- Just Another
2- Sit Stay Roll Over
3- Ape
4- Fast Draw
5- Green Serpent
6- Retrospection
7- Teacher, Teacher!
8- On the Top
9- I Speak Astronomy
10- Someone’s Daughter
11- Kafka
12- Copycat
13- Perennial
14- Rogue
Bis
15- Pisces
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