A soma de todos os males
BaianaSystem se destaca entre atrações exóticas do Queremos! Festival. Fotos Divulgação Queremos!: Diego Padilha (1 e 4), Elisa de Paula (2 e 5) e Wesley Allen (3).
Frontman dos bons, Russo Passapusso tem o público nas mãos, e manda e desmanda no rebanho: tem a hora de pular, a hora de gritar, a hora de fazer ciranda de roda, a hora de calar, tudo combinadinho. Esperto, faz as vezes de um Chacrinha jogando bacalhau para a plateia, ou de um Silvio Santos a perguntar, em plena TV aberta, “quem quer dinheiro?” para as colegas de trabalho. Dá ao público exatamente o que ele quer, afastando a ideia de que o artista é que deve propor algo. De tanto a produção do festival sugerir em slogans publicitários para que a mente do público se abrisse, parece que saiu mais coisa das caixolas desse pessoal do que se supunha entrar. De modo que está afastada, de vez, a mínima separação do joio do trigo, sem razoável dose de bom gosto.
Até quando é bom o show é ruim, porque se os músicos tocam uma melodia cativante, dura pouco e logo um resgate de sei lá o que – axé, afoxé, pagode e o escambau – aparece para esculhambar tudo. Se os ótimos vídeos são cirurgicamente sincronizados com as músicas, logo uma micaretice, um pseudo funk surge como elemento estraga-prazeres. Se um incrível groove, pesadaço, faz o peito tremer, em seguida outra citação nefasta coloca tudo a perder. É como se, ao planejar tudo isso, Roberto Barreto, apontado como “o idealizador do projeto”, e sua inefável guitarra baiana (ai, ai, ai!) tenha consultado um catálogo geral de música ruim de modo a não deixar faltar, no BaianaSystem, um item sequer.A boa noticia é, justamente por causa disso, a dificuldade que o grupo deve ter para seguir em frente, já que, ao reunir todo esse amontoado de mau gosto, parece encerrado em si próprio. E, convenhamos, vai ser difícil de a coisa piorar, em um cenário de terra arrasada e flagrante deserto criativo, em que pese o fator “queridinho da grande mídia”. E não deixa de ser incrível que um festival capitaneado pelo Queremos!, criado para trazer ao Brasil bandas que o mercado não enxerga, se curve a uma banda de tonalidades – repita-se – popularescas e que frequentemente se apresenta até gratuitamente por esse Brasilzão.

A canrora sueca Ionnalee, que atua sobre um alto praticável, atrás de um ventilador, ao som de um DJ
“Se ninguém é uma coisa só, por que um festival de música seria?”. Escrito na tela de um redator publicitário a frase sugere algum impacto, mas não se pode esquecer que, por vezes, quem quer ser tudo ao mesmo tempo acaba não sendo nada. É o que explica a inclusão de nomes como o da cantora sueca Ionnalee, que aparece dançando no alto do Palco Azul atrás de um ventilador comprimida em uma malha de ginástica. Com um DJ dando play em bases ordinárias do mundo virtual, canta e dança durante todo o show, e como a internet – sempre ela - é uma bênção, reúne surpreendente quantidade de público na beirada do palco. Incrível o ponto reducionista a que a revolução tecnológica levou a música.
O contraponto brasileiro é Xênia França, uma das poucas cantoras brasileiras que tem, ao menos, razão de ser. Com trabalho marcado pela música negra baiana, e uma banda de apoio com ênfase na percussão, Xênia mostra um repertório menos óbvio que e mais contemporâneo que os exóticos do dia, o que parece incomodar mais que agradar ao público diversificado do festival. Falta-lhe, contudo, mais presença de palco – talvez a trança enorme não contribua - e melhores composições, quem sabe um “pulo do gato” que torne a apresentação mais, por assim dizer, atrativa.Experimentalismo quem queria teve com o Animal Collective, aqui representado apenas pela dupla Panda Bear e Avey Tare. Sentados no fundo do Palco Azul com seus respectivos violões, em tambor ocasional em comum e poucos efeitos de pedais, sobretudo nas vocalizações, eles tocaram – segundo consta – a íntegra do álbum “Sung Tongs”, de 2004, já que é esta a turnê que está rolando. Os fãs colados na grade, talvez os únicos habilitados para o formato, se divertiam a valer, enquanto boa parte da plateia com um mínimo de curiosidade passou aquela hora inteira esperando alguma coisa acontecer, até que, súbito, tudo já tinha acontecido e o show terminado. Era só aquilo ali mesmo.
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