O Homem Baile

Cortante

Com guitarras em volume generoso, Corrosion of Conformity revive época de ouro do álbum “Deliverance” e mostra novidades em show matador. Fotos: Nem Queiroz.

O vocalista e guitarrista Pepper Keenan, que faz toda a diferença no Corrosion Of Conformity

O vocalista e guitarrista Pepper Keenan, que faz toda a diferença no Corrosion Of Conformity

Um sonho de mais de 20 anos realizado em aproximadamente seis minutos durante a música que todo mundo ali na beirada do palco quer ouvir. E de novo, mas, dessa vez, ao vivo, tocada por quem compôs, do jeito que ela foi concebida lá na fértil década de 1990. É mais ou menos essa a sensação de cada um que se estabelece ao redor do palco no Teatro Odisséia, neste domingo (13/5). Ou, ao menos, é essa a interseção afetiva de tantos gostos díspares que sobrevivem à tempos estranhos de farras de ecléticos sem fim. Sensação que explode já nos primeiros acordes de “Albatross”, a música chave para se entender/gostar do Corrosion Of Conformity, em sua primeira vez no Rio, tocada – repita-se – por quem estava lá.

Antes mesmo do início o show já se anuncia como um daqueles de deixar o ouvido zumbindo pela semana toda, e as guitarras distorcidas em ritmo, solos, andamentos, volume generoso e palhetadas em geral não decepcionam. Mas há muito mais ali a ser notado, e a dobradinha ZZ Top + Black Sabbath tocada no PA antes de a apresentação começar não é exatamente ao acaso, mas ajuda a identificar o rock pesado bem pertinho do metal, com sotaque do rock sulista americano que caracteriza o “siouci”, como grita uma plateia que se identifica, na maior parte do tempo, como “do ramo”, e isso faz toda a diferença na interação com a banda. Por isso não é só o pedido de “Albatross” ou de músicas de “Deliverance”, o álbum que projetou o grupo pra valer, em 1994, que ecoa no salão. Estamos diante de uma plateia de iniciados e, ao mesmo tempo, de um show que cativa qualquer um que não resista a guitarras bem tocas e no talo. E quem resiste?

Se demorou séculos para chegar a Cidade Maravilhosa, ergam-se as mãos pelo fato de a banda ter vindo com o vocalista/guitarrista Pepper Keenan, que dá identidade à melhor fase do grupo, mas que tem um inconstante currículo de idas e vindas. “Sério, nunca esperávamos um dia vir tocar aqui”, diz ele, em tom de agradecimento, antes de “Seven Days”. E aí o repertório enfatiza sua fase na banda, com apenas duas músicas que estão no novo álbum, “No Cross No Crown”, que saiu em janeiro, e tem nada menos que cinco de “Deliverance”, uma entrega prometida há anos e que o público adora. Entre as novas, destaque para “Wolf Named Crow”, com suspeitas guitarras melódicas, menos duras, por assim dizer, e um raro duelo entre Keenan e Woody Weatherman (fã de Eddie Van Halen, certeza), que praticamente monopoliza os solos durante toda a noite.

O duelo dos guitarristas Woody Weatherman, que praticamente monopoliza os solos, e Keenan

O duelo dos guitarristas Woody Weatherman, que praticamente monopoliza os solos, e Keenan

Embora o riff cortante, dilacerante de “Bottom Feeder” inaugure a festa com desenvoltura, o show parece começar de verdade na terceira música, quando a colante “Broken Man” brilha através do verso/título/refrão que tem adesão plena do público. O timbre da bateria e o groove imposto por Mike Dean também é de se destacar. O baixista é outra figura de destaque no COC, não só por segurar a onda nos vocais quando Pepper Keenan não esteve presente, o que não é positivamente sua melhor qualidade, mas por tocar de um modo peculiar, num misto de virtuose do bem com um groove incrível. Sua performance galopante realça nessa noite em músicas como “Seven Days”, com um desfecho punk rock com roda de pogo e tudo, e “Señor Limpio”, de caráter quase dançante em meio a tanto esporro.

Num único olhar pre-“Deliverance”, tem a boa “Vote With a Bullet”, a canção que marcou a estreia de Keenan na banda e que seguramente foi o pontapé inicial para a projeção gigantesca que trouxe o quarteto até aqui. Mas o público, do ramo ou não, da interseção ou não, se entrega mesmo em músicas como “Wiseblood”, cujo riff e refrão, acreditem, é quase a mesma coisa; “Paranoid Opioid”, com mudanças de andamento mais salientes do que na versão de disco; ou ainda no bis, em que uma jam session molda a também adorada “Clean My Wounds”, com direito a ótimas transições a base das guitarras serras elétricas, e a apresentação dos músicos. Mas é na impossibilidade de adjetivar “Albatross”, em versão vitaminada à Allman Brothers ao ser tocada ao vivo, que reside a verdadeira profissão de fé estampada nas expressões de cada um ali dentro. Um momento que - sim, senhor - vale a vida toda.

A banda certa fazendo o show de abertura certo. É essa a frase que melhor explica o show do Barizon, cujo som tem muito a ver com o do Corrosion Of Conformity, para dizer o mínimo. Mesmo com um baterista chamado de última hora (sempre assim…), o ótimo Marcelo de Souza, do Jason, o grupo mandou bem, em sete petardos, com o comando do bom vocalista Alexandre Barbosa. Das sete, a novidade é “The Leech”, prometida para um EP a ser relançado em breve, que realça o lado sludge do grupo: pesada, arrastada, dilacerante também. Entre as demais, todas do bom álbum “Towards The Rising Sun”, destaque para “Streets Of Rage”, que fleta com o hardcore, mas tem solo debulhado à Malmsteen, e o desfecho com “Summertime”, que tem ótimo riff e sugere potencial cativante pelo refrão – “Call everybody!” - de cantoria intuitiva. Vamos colocar logo esse EP na rua pessoal!

A pulsante apresentação do local Barizon: seguramente a banda certa no show de abertura certo

A pulsante apresentação do local Barizon: seguramente a banda certa no show de abertura certo

Set list completo Corrosion Of Conformity:

1- Bottom Feeder
2- The Luddite
3- Broken Man
4- Señor Limpio
5- Long Whip/Big America
6- Wiseblood
7- Who’s Got the Fire
8- Seven Days
9- Paranoid Opioid
10- 13 Angels
11- Vote With a Bullet
12- Wolf Named Crow
13- Albatross
Bis
14- Clean My Wounds

Tags desse texto: ,

Comentário

Seja o primeiro a comentar!

Deixe o seu comentário

Seu email não será divulgado