Engenhoso
Versão completa realça ainda mais a genialidade do singular espetáculo de David Byrne no Rio. Fotos: Nem Queiroz.
A apresentação – essencialmente teatral – é um braço do Lollapalooza, que aconteceu no último final de semana, em São Paulo (veja como foi) só que em sua versão completa, com oito números a mais, incluindo alguns que não funcionariam tão bem durante o dia – o show do Lolla foi de tarde -, como as sombras gigantes de “Blind”, obviamente omitidas em SP; ou o diálogo mantido com a televisão em “ I Should Watch TV”; ou ainda na lâmpada de “Bullet”, entre outras passagens. Embora temático, uma versão do show não supera a outra em qualidade e compreensão. Definitivamente, contudo, quanto mais David Byrne, melhor.
O palcão do Metropolitan é reduzido a um cômodo menor por cortinas que recebem iluminação a cada música, onde os músicos, dançarinos e cantores de Byrne, evoluem em 21 maneiras diferentes, uma para cada uma delas. É tanto detalhe que tudo contribui para que o público assimile o todo, com a visão quase sempre centrada em Byrne, o que facilita para a assimilação do conceito do espetáculo. Quase sempre cínico e com músicas com letras fáceis de se compreender, graças ao seu gestual, incluindo as do Talking Heads que muitos da plateia conhecem, todo o investimento nas coreografias e arranjos resulta em uma simplicidade acessível a qualquer pessoa, mesmo que ela não esteja nem aí parara história – e que história – do músico.Ressalte-se que não se usa artifícios exagerados comuns nos dias de hoje: não tem jato de fumaça, labaredas, papel picado ou pirotecnia. Tudo é na base da iluminação e na coreografia por si só. A tecnologia aparece, sim, nos microfones ajustados nos rostos dos músicos, na captação do som, com muita percussão acústica, e na comunicação entre eles, provavelmente por sinal de rádio, em um palco completamente limpo, sem amplificadores, monitores de retorno e afins. As músicas, mesmo as mais conhecidas do Talking Heads, têm arranjos comuns entre si, no maior estilo David Byrne, com eletrônica, percussão e guitarra funk, tocada inclusive por ele em alguns casos, e sempre fazendo um apanhado da música periférica mundial, por assim dizer, com a banda integrantes de origens diversas, incluindo os percussionistas brasileiros Davi Vieira, que manda um rap em “Toe Jam”, e Mauro Refosco.
No repertório, muitas músicas do Talking Heads e quase a íntegra do disco novo de Byrne, “American Utopia”, que saiu no início do mês, além de uma parceria com a cantora St.Vincent (“I Should Watch TV”) e outra de Janelle Monáe. “Hell You Talmbout” é tocada depois do encerramento do espetáculo propriamente dito, quando Byrne e banda homenageiam brasileiros vitimados pela violência, como a vereadora Marielle Franco e o ajudante de pereiro Amarildo, fazendo um coro de “diga o nome dele(a)”, em português mesmo, após a citação a cada um. Originalmente, a canção foi escrita em homenagem aos negros mortos pela polícia americana, com os gritos de “say his/her name”. Outros números de destaque são “Burning Down the House”, com a adesão total do público, que no fim das contas compareceu em um bom número; “The Great Curve”, num crescente instrumental da pesada e o impagável diálogo onomatopeico (pi-pi-pi-pi-pi), em “Slippery People”; e “Everybody’s Coming to My House”, do disco novo. Mas a certeza é uma só. Jamais se verá outro show como esse.Set list completo:
1- Here
2- Lazy
3- I Zimbra
4- Slippery People
5- I Should Watch TV
6- Dog’s Mind
7- Everybody’s Coming to My House
8- This Must Be the Place (Naive Melody)
9- Once in a Lifetime
10- Doing the Right Thing
11- Toe Jam
12- Born Under Punches (The Heat Goes On)
13- I Dance Like This
14- Bullet
15- Every Day Is a Miracle
16- Like Humans Do
17- Blind
18- Burning Down the House
Bis
19- Dancing Together
20- The Great Curve
Bis
21- Hell You Talmbout
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