O Homem Baile

Pro gasto

Com importante desfalque de última hora, Extreme Noise Terror faz apresentação concisa, mas que pode melhorar. Fotos: Maurício Porão.

O vocalista do Extreme Noise Terror, Ben McCrow, segura a onda na ausência do fundador Dean Jones

O vocalista do Extreme Noise Terror, Ben McCrow, segura a onda na ausência do fundador Dean Jones

Muitas bandas seguem na ativa sem nenhum integrante da formação original, e essa é, provisoriamente, a situação do Extreme Noise Terror, que está em turnê pelo Brasil sem o vocalista Dean Jones, impedido de viajar pelos médicos por conta de uma labirintite. Para não voltar a cancelar o giro por aqui, a banda veio assim mesmo, com formação de quarteto, considerando que são dois os vocalistas, desde a década de 80, quando foi criada lá no interior do Reino Unido. Assim, coube a Ben McCrow, na banda desde 2014, comandar o baile no Teatro Odisseia, no Rio, nesta quinta (2/11), em apresentação concisa que dura cerca de uma hora, o suficiente para que os fãs se estapeiem sem parar na beirada do palco. Na abertura, tocaram Uzômi, Manger Cadavre? e Test.

Para muita gente, a porta de entrada do ENT no Brasil é o Ratos de Porão, que incluiu a música “Work For Never” no repertório dos shows na década de 1990, e é essa espécie de hit local, tocado logo no início, que faz o público – apenas razoável, diga-se - agitar mais ainda. O grandalhão McCrow vai muito bem, fazendo a linha simpática ao cumprimentar o público a toda hora, e se desculpar, inclusive em português, quando a banda sofre com problemas técnicos, antes de “False Prophet”. O som da casa – já há tempos – está redondinho, e parece que o guitarrista Ollie Jones, o mais antigo na banda, com a ausência de Jones, é que tem o perfil detalhista/exigente demais. Tanto que o show segue, e a pedrada “No One In Innocent” causa estampidos nos ouvidos mais sensíveis. Impressionante como o som é mais encorpado se comparado aos das bandas de abertura.

Sabe-se que o Extreme Noise Terror não é dado a lançamento regulares e que a discografia é toda torta, salpicada por singles, EPs em vinil e o escambau. “Somos esquisitos mesmo”, chega a dizer Ben McCrow ao anunciar uma música em tese obscura e improvisada no bis, mas o fato é que eles têm um álbum relativamente novo na praça, que leva o nome da banda, lançado há dois anos. Dele, entram quatro músicas, que, contudo, perpetuam o estilão do hardcore old school do qual o grupo nunca abriu mão. Colada em “Deceived”, “Punk Rock Patrol” quase passa batida, mas é espécie de estopim para o início de uma paulada na moleira sem fim. Na velocíssima “Dogma, Intolerance, Control”, a impressão que se tem é que o casarão vai explodir pelos ares, e a já citada “No One In Innocent” é aquela mesmo que horroriza otorrinos mundo afora.

O engajamento do Manger Cadavre?, com a boa vocalista Nata de Lima, que cospe tijolos no palco

O engajamento do Manger Cadavre?, com a boa vocalista Nata de Lima, que cospe tijolos no palco

Ainda na seara dos vocalistas, antes de “Raping the Earth”, McCrow pede um brinde em memória de Phil Vane, outro da formação original, que morreu em 2011, e o público responde com certe reverência punk, por assim dizer. “Bullshit Propaganda” é dedicada à polícia do Rio de Janeiro, que, segundo o vocalista, parou a banda para uma averiguação e encontrou substâncias não permitidas, o que teria levado a um tipo de negociação bem-sucedida, senão a banda não estaria ali em cima do palco. Na cartilha hardcore, tem música para veganos (“Murder”) e o cover de “Borstal Breakout”, do Sham 69, há tempos incorporada ao repertório, é dedicado a três fãs das antigas contados a dedo por Ben McCrow, no desfecho da primeira parte.

O bis, até certo ponto demorado de modo a ficar a dúvida se realmente aconteceria, vem com “Chained & Crazed”, lançada em um EP em vinil, em 2015, e incluída no disco mais recente, com a ressalva de que “Não temos a menor ideia de como isso vai ficar”, de McCrow, que chega a vomitar de leve no paco; “é punk rock, né?”. E ainda uma versão animal para “Pray to Be Saved”, do EP “Phonophobia”, de 1991, espécie de sprint final nas rodas de dança da beirada do palco. A banda deixa o palco sob a promessa de voltar o quanto antes, e essa tem que ser cumprida, e com o cabelo espetado Dean Jones na fita. No frigir dos ovos, o Extreme Noise Terror fez um show na pressão que o punk/hardcore exige, mas que, sim, pode melhor muito com Jones no palco.

Entre as bandas de abertura, brilhou a politizada Manger Cadavre?, do Vale do Paraíba, que entre 12 porradas apresentadas, tem “Déspota”, cujo refrão crava a alcunha de golpista no presidente ilegítimo. Em “Existimos!”, o tema é o embate policial na região do Pinheirinho, tudo isso explicado pela vocalista Nata de Lima, cujo estilo vocal varia entre o gutural e o rasgado, com bem manda as bandas crust. Em “When All is Said And Done”, cover do Napalm Death, ela confirma uma das grandes referências da banda, que começa na própria movimentação de palco, similar à de Barney Greenway. A música mais diferentona é “Bruxas da Noite”, quase uma ode doom dark de tão sombria, tocada na parte final do set.

Uzômi e a sinfonia do esporro: meia hora sem parar com as músicas emendadas umas nas outrras

Uzômi e a sinfonia do esporro: meia hora sem parar com as músicas emendadas umas nas outrras

Antes, o Uzomi estraçalhou no palco, como se o apanhado de músicas, tocadas umas emendadas nas outras, em velocidade abissal, fossem uma coisa só, uma ópera from hell esporrenta. Impressionante o peso impingido pela guitarra do China, ele mesmo, que já foi baixista no Matanza, com riff atrás de riff, puro metal na veia. E ainda tem o bom entrosamento entre os dois vocalistas, que ajudam a dar uma cara própria à banda, em meio ao esporro generalizado. No começo de tudo, com a casa ainda vazia, o Test mostrou mais uma vez a peculiar sonoridade de fazer metal/hardcore extremo com um duo, guitarra + bateria. É de impressionar como o baterista Barata, franzino, toca cada vez mais com precisão e velocidade. O problema é que, nesse formato, o grupo é fechado em si próprio, de modo que cada show é sempre igual ao outro. Senão partir parar uma formação com mais músicos, vai ser prisioneiro desse looping para todo o sempre.

Set list completo Extreme Noise Terror:

1- Punk Rock Patrol/Deceived
2- Work for Never
3- Show Us You Care
4- Religion Is Fear
5- Lame Brain
6- False Prophet
7- No One Is Innocent
8- Raping the Earth
9- Human Error
10- Think About It
11- Bullshit Propaganda
12- Third World Genocide
13- Dogma, Intolerance, Control
14- Carry On Screaming
15- Murder
16- Borstal Breakout
Bis
17- Chained & Crazed
18- Pray to Be Saved

Duo mais barulhento do pedaço, o Test abriu os trabalhos com o Teatro Odisséia ainda vazio no feriado

Duo mais barulhento do pedaço, o Test abriu os trabalhos com o Teatro Odisséia ainda vazio no feriado

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