Volta necessária
Prophets Of Rage mantém viva a fúria do Rage Against The Machine contra o sistema, em ótimo e concorrido show no Maximus Festival. Fotos: Alessandra Tolc/ARTS Live Frames.
Ou – como queiram – é o Rage Against The Machine sem o carismático vocalista Zack de la Rocha, com Chuck D (Public Enemy) e B-Real (Cypress Hill) nos vocais. Porque, ao menos nesse início, embora um EP com uma música inédita tenha sido lançado, mais da metade do repertório do show é do RATM. Para amenizar a fúria dos fãs mais dedicados, consta que Zack foi chamado para uma reunião do grupo, mas não topou. Por isso, quando os primeiros acordes de “Testify” saem pelas caixas é que o show começa de verdade, com a poeira subindo pra valer, a custa de muita roda de dança, sobretudo na região próxima ao palco. A dupla Tim Commerford (baixo) e Brad Wilk (bateria), que andou gravando com o Black Sabbath e tocando com o Smashing Pumpkins), confere uma base grooveada absurda, intangível por outros artistas.
O que se torna fértil terreno para Tom Morello implementar o seu modo não menos peculiar de tocar guitarra. Não espere dele uma virtuose vulgar, mas a extração de sons que não se vê por aí. Seja maltratando o botão de controle dos captadores, dando surra na alavanca da guitarra, ou zombando de um plugue sonoro, Morello segue musicalmente inventivo, fazendo com que os solos, verdadeiras peças de bom gosto, pareçam até um detalhe, mesmo em músicas que não são de sua autoria. Para ser ter uma ideia, a manjada “Seven Nation Army”, que até grito de torcida virou mundo afora, é desconstruída para renascer com sotaque rap/hip hop, e o belíssimo solo de Jack White dá lugar a uma verdadeira manifestação artística do guitarrista – e isso é muito bom-, que coloca uma assinatura em tudo o que faz.Em relação aos outros shows da turnê “Make The World Rage Again”, incluindo um em São Paulo e outro no Rio, o set list é ajustado por conta das limitações de horário de um festival, e “The Party’s Over”, uma das duas compostas por essa formação, é limada. A outra, que está no álbum que sai em setembro, é “Unfuck The World”, uma elegante forma de consertar o mundo com muito groove e bom desempenho da duplinha Chuck D/B-Real, duelando que é uma beleza. Outra novidade é a inclusão de “Kick Out the Jams”, do MC5, com a participação do vocalista e do guitarrista do Rise Against, Tim McIlrath e Zach Blair, respectivamente, que havia feito concorrida apresentação no Palco Thunder Dome, o secundário, mais cedo. A “parceria” começou no show do Rio, na sexta, quando as duas bandas tocaram juntas, e funciona na base do improviso e da camaradagem entre os músicos.
Assim como nos outros shows pelo Brasil, Tom Morello ergue a guitarra várias vezes para expor um cartaz com a palavra de ordem e exigência nacional “Fora Temer”, no que é acompanhado pelo grito da massa. No Rio, usou adicionalmente uma camiseta alusiva à prisão de Rafael Braga e pediu por sua soltura, numa outra demonstração de como uma banda como o Prophets (ou o Rage Against The Machine, como queiram) é necessária. Não por acaso Morello define o grupo, em uma espécie de “frase de intenções”, como “uma força-tarefa de elite de músicos revolucionários”, e mesmo que muita gente ali no meio do estapeamento da roda de pogo nem tenha se atinado para isso, ou simplesmente seja do campo ideológico oposto, pouco importa. O que conta é que a semente segue sendo lançada e adubada por esse mundão em tempos tão estranhos.A música, contudo, é conteúdo por si só, e, mesmo que a verve eventualmente não cole, ela gruda. Até quando o show foge do roteiro RATM, por assim dizer, quando Chuck D e B-Real vão para a grade, junto do povão, para mandar um encorpado medley hip hop, sob as carrapetas do DJ Lord. Ele acabou tendo seu set de início do show também cortado, por causa das limitações do horário. Mas o couro come pra valer, entre outras, em “Bullet In The Head”, finalizada como uma pedrada só; “Fight The Power”, a mais querida entre as “não Rage”; “Sleep Now in the Fire”, com citação a “Cochise”, do Audioslave; e no encerramento com “Killing in the Name”, tremenda barbada apresentada por B-Real como “a música mais poderosa do mundo”. É aí que a plateia se divide em numerosas e agressivas rodas, aproveitando cada segundo de um momento realmente único. Ou quase, né Seu Zack? Que siga o jogo, porque a luta precisa continuar.
Set list completo:1- Prophets of Rage
2- Testify
3- Take the Power Back
4- Guerrilla Radio
5- How I Could Just Kill a Man
6- Bombtrack
7- People of the Sun
8- Fight the Power
9- Kick Out the Jams
10- Hip Hop medley: Hand on the Pump/Can’t Truss It/Insane in the Brain/Bring the Noise/I Ain’t Goin’ Out Like That/Welcome to the Terrordome/Jump Around
11- Sleep Now in the Fire
12- Bullet in the Head
13- Know Your Enemy
14- Unfuck The World
15- Seven Nation Army
16- Bulls on Parade
17- Killing in the Name
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