O Homem Baile

Sem levar em conta

Castigado em palco distante e horário ruim, Duran Duran brilha com o que tem de melhor e ainda mostra atualidades no Lollapalooza. Fotos Divulgação Lollapalooza: Breno Galtier/MRossi (1, 2 e 4) e MRossi (3).

Em boa forma, Simon Le Bon conduz o Duran Duran a um ótimo show sob o sol do Lollapalooza

Em boa forma, Simon Le Bon conduz o Duran Duran a um ótimo show sob o sol do Lollapalooza

Imagine um show em que o Duran Duran, o ícone maior do new romantic, tenha que entrar em cena com o sol batendo na cara dos músicos, todos embecados, encasacados e encastelados em armaduras chiquérrimas. É exatamente o que acontece durante o horário do futebol no domingo do Palco Onix do Lollapalooza, o palco do fim do mundo à boca miúda, dada a distância e topografias cruéis. Sem se intimidar ou deixar o guarda roupa de lado, o grupo aparece com um Simon Le Bon todo de branco, óculos escuros e tênis verde mais cheguei que as chuteiras dos jogadores de futebol desses tempos, combinando com a camisa. Os figurinos seguem com cada integrante e sua cor berrante predileta, e a roubada criada pelos produtores logo se converte um entardecer lindo e acolhido por um excelente público que correu pelas montanhas.

Explica-se que, além da música criada lá atrás no pós punk oitentista, o new romantic requer vestimentas adequadas sem as quais não faria o menor sentido. Imagine, para facilitar o entendimento, que sem o new romantic não seria possível o RPM, a banda brasileira que mais vendeu discos em todas as épocas, entre outras características reunidas. Mas é possível percorrer uma carreira tão longa e destacada em apenas uma horinha de show (e olha que a entrada no palco tem atraso de sete minutos)? O enigma se decifra quando uma saraivada de blockbusters como “A View to a Kill”, que foi tema de filme da série “007”, “Hungry Like The Wolf” e as antiquíssimas “Rio” e “Girls On Filme”, já na parte final, são tocadas. Tudo embalado por uma sonoridade funky que sempre fez parte da trajetória do DD, entretanto realçada no álbum mais recente – e ainda tem mais essa -, lançado há menos de dois anos.

O baixista John Taylor e o guitarrista Dominic Brown se divertem durante o curto e intenso show

O baixista John Taylor e o guitarrista Dominic Brown se divertem durante o curto e intenso show

Ele se chama “Paper Gods” e cede duas músicas ao show. São elas “Pressure Off”, parceria com a lenda Nile Rodgers e a cantora Janelle Monáe, que açambarca o público com ótimo refrão e uma linda ventania de papel picado; e “Last Night in the City”, também dividida, com a cantora Kiesza, no álbum. No show, Le Bon tem a ajuda de duas ótimas vocalistas – Anna Ross e Erin Stevenson -, que arrasam na maior parte da música com o gogó afiado e ótimas performances. A participação de destaque, contudo, é da cantora brasileira Céu, que havia tocado mais cedo em outro palco, e surge como a dama de negro que faltava na palheta de cores démodé do Duran Duran para brilhar solo ou dividindo os vocais com Simon Le Bon em “Ordinary World”. Um dos maiores hits do grupo, a música é acompanhada com emoção pela plateia. Na turnê brasileira de 2012, quem cantou essa música com a banda foi a doce Fernanda Takai (relembre).

Seja por conta de uma equalização que precisasse de um ajuste mais fino, ou por opção do grupo mesmo, o som muitas vezes descamba para um grave pesado que parece despropositado. Em ambas as opções é o tecladista e sócio fundador Nick Rhodes que está no comando, resolvendo qualquer questão de sonoridade com seus loops gravados em um baú sem fundo, de modo a determinar a vibe sonora do repertório. Em “Notorius”, por exemplo, um funk rock de almanaque, o baixão de John Taylor bate no fundo do peito, o que acontece também na cover para “White Lines”, do Grandmaster Melle Mel, que o Duran gravou no obscuro álbum “Thank You”, de 1995. Dois bons exemplos do que é o funk de verdade, tocado por instrumentos, ante a pasmaceira difundida em palcos de música de gosto duvidoso espalhados em um festival de estéril diversidade.

Simon Le Bon e a brasileira Céu cantam juntos o hit 'Ordinary World', num dos grandes momentos do Lolla

Simon Le Bon e a brasileira Céu cantam juntos o hit 'Ordinary World', num dos grandes momentos do Lolla

Se o tempo urge de verdade, o Duran Duran acaba se despedindo sem tocar seu maior sucesso em todas as épocas - e havia muitos outros -, “Save a Prayer”, conhecida e cantada em todas as profissões de todas as classes sociais em todas as sociedades e ainda queridinha dos descolados e plantão por conta da gravação feita recentemente pelo Eagles Of Death Metal (veja como foi no Lolla 2016). Sobrou então para o sotaque new wave de “Rio” a tarefa de encerrar muito bem um show que, apesar de curto, começou sob o sol, passou por um belo entardecer e se despediu de noite. Com a ajuda de mais lançamento de papel picado aos ares e de bolas coloridas gigantes sobre o povão, deu tudo certo. Porque banda de arena é banda de arena e não se deixa intimidar pela logística equivocada de um festival.

Set list completo:

1- The Wild Boys
2- Hungry Like the Wolf
3- A View to a Kill
4- Last Night in the City
5- Come Undone
6- Notorious
7- Pressure Off
8- Ordinary World
9- (Reach Up for the) Sunrise/New Moon on Monday
10- White Lines (Don’t Don’t Do It)
11- Girls on Film
12- Rio

Plano geral com todas as cores do Duran Duran; o tecladista e manda-chuva Nick Rhodes é o de azul

Plano geral com todas as cores do Duran Duran; o tecladista e manda-chuva Nick Rhodes é o de azul

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