Acordar de ressaca muito mais feliz é o sonho de consumo de 10 entre 10 bebuns que circulam se batendo sem parar em um show do Matanza. Não é diferente no que pode se chamar de show principal no domingão (6/11) do Hell In Rio, embora o grupo tenha trocado de horário com o Angra (saiba mais aqui) para facilitar a logística de palco, já que foi o que teve o maior público do dia, cerca de quatro mil no total, segundo os produtores. Se as histórias de psicopatas, bêbados e desajustados em geral que sempre fracassam são mais que uma utopia, uma verdadeira obsessão para essa turma, não se pode negar que o Terreirão, acostumado a requebrados descerebrados, virou, ao menos durante essa horinha e pouco, um verdadeiro pandemônio.

Pois “Pandemonium”, a capital imaginária dos infernos que se materializa ao vivo no festival, é a música chave para se entender o Matanza. Ou, por outra, como o Matanza, inventor da mistura de country com hardcore – o countrycore – se converteu em uma banda de metal e dos mais extremos, sob a batuta do guitarrista e compositor Marco Donida, que hoje se dá ao luxo de só tocar quando quer e não está no palco do Hell In Rio. “Pandemonium” é puro thrash metal com todos os seus riffs, maratonas de guitarras e clichês, e, incluída discretamente no segundo álbum, “Música Para Beber e Brigar”, representa o primeiro passo para o que aconteceria nos dois melhores discos do grupo, pela ordem, “Odiosa Natureza Humana” (2011) e “A Arte do Insulto” (2006).

Provavelmente esse tipo de história não passa pela cabeça daqueles que se destroem reciprocamente no meio da multidão, mas quando os riffs indefectíveis iniciam o segundo bloco do show, a reação de sacudir a cabeça como se a coluna vertebral fosse de borracha é mais que automática, é um disparo para não se lembrar de nada e acordar de ressaca muito mais feliz. E olha que ela vem depois de um tiro de cinco porradas emendadas umas nas outras, incluindo “Bom é Quando Faz Mal”, um clássico vocacional cujo título já explicaria tudo, não fosse a letra uma pérola, e a dobradinha temporal com “O Chamado do Bar”/“Ressaca Sem Fim”; reparem como uma chama a outra.

Para tocar tanta música, todas emendadas umas nas outras e a cada show mais rápido é preciso estar em forma, e o baterista Jonas, definitivo para o Matanza, não se exime da responsabilidade, acelerando tudo e mais um pouco. O caçula Dony Escobar, com pouco mais de um ano de casa, está à vontade e melhora a performance de palco a cada dia, enquanto o guitarrista Maurício, técnico, é peça chave nos shows. E se Donida é o mentor do Matanza, no palco o brilho é de Jimmy London, que segue temperando a porradaria das músicas com tiradas que servem também como respiro para todos. Assim como músicas menos agressivas como “Mulher Diabo” (há várias delas na plateia), “Sabendo Que Posso Morrer”, com a voz forçada na dobra do refrão, e “Tempo Ruim”. Mesmo nessas horas, o público segue se refestelando no asfalto, porque sabe que o bom em um show do Matanza é a capital do inferno em que ele se transforma.

“Metal soco na cara” é a frase dita pelo vocalista Caio MacBeserra que melhor define o som praticado pelo Project46. O quinteto, que traz como novidade a entrada do baixista Baffo Neto, do Capadócia, dá um up grade substancial no domingo do Hell In Rio; é como se o festival pra valer começasse ali, quando MacBeserra sobe em um praticável particular e desanda a cuspir tijolos embrulhados em arame farpado. Mais amadurecido que em outros festivais, como o Monsters Of Rock de 2013 e o Rock In Rio de 2015, o instrumental da banda está um nível excepcional. Músicas como “Violência Gratuita” e “Capa de Jornal” crescem muito ao vivo e resultam em grande participação do público, seja no acompanhamento com palmas ou em velozes rodas de dança.

O desfecho com o verdadeiro concerto de guitarras melódicas de “Acorda Pra Vida”, mais trabalhada no instrumental, é sensacional e deixa uma saudade de antemão no rosto de cada um ali no Terreirão. Mais que simples costela do Slipknot, o grupo tá prontinho pra escrever sua própria história. Já o John Wayne reproduz aquelas bandas de metalcore com vocais esganiçados que tomam o mundo do rock de assalto já há alguns anos. O grupo sofreu com problemas técnicos, tanto de microfone quanto na bateria (sampler?) de Edu Garcia, e foi preciso enrolar a plateia um bocado em intervalos para reparos, o que de certo modo tirou o punch da apresentação. Mas músicas como “Lágrimas”, puxada por um ótimo riff metálico, e “Tempestade” cumpriram bem o papel de agitar o público. E parabéns para o vocalista Fabio Figueiredo pelo gogó.

Set list completo Matanza:

1- Introdução
2- O Chamado do Bar
3- Ressaca Sem Fim
4- Matadouro 18
5- A Arte Do Insulto
6- Bom é Quando Faz Mal
7- Pandemonium
8- Meio Psicopata
9- Imbecil
10- Tudo Errado
11- Clube dos Canalhas
12- Eu Não Gosto de Ninguém
13- Mulher Diabo
14- Carvão, Enxofre e Salitre
15- Pé na Porta, Soco na Cara
16- Tempo Ruim
17- O Que Está Feito Está Feito
18- Contrycore Funeral
19- Sabendo Que Posso Morrer
20- Mesa de Saloon
21- Tombstone City
22- Ela Roubou Meu Caminhão
23- Estamos Todos Bêbados
24- Interceptor V-6

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