O Homem Baile

Raimundas

Mulheres dominam o mosh no Raimundos Rock Fest; grupo toca repertório próprio, do Ramones e inclui muitas citações a standards do gênero. Fotos: Nem Queiroz.

Volta por cima: vocalista e guitarrista, Digão é o cabeça dessa nova fase consolidada dos Raimundos

Volta por cima: vocalista e guitarrista, Digão é o cabeça dessa nova fase consolidada dos Raimundos

O show é de hardcore, o mosh é liberado, todo mundo sobre e se joga do palco do jeito que dá. Mas o que chama a atenção mesmo é a quantidade de meninas na função, de modo que até o vocalista percebe e não perde a oportunidade. “Tá bonito isso aqui hoje!”, é o que exclama um satisfeito Digão, ele mesmo, que há mais de década e meia assumiu os vocais do Raimundos, depois da saída de Rodolfo Abrantes e de um turbilhão de mudanças que já há certo tempo encontrou a acalmaria na formação atual. Não chamariam a atenção as mulheres no palco não fosse a banda o Raimundos, cujas letras não são, vamos e venhamos, as mais politicamente corretas para tempos tão estranhos, para dizer o mínimo. Mas acontece que estamos no Circo Voador, é noite de sexta (16/9), e aqui tudo é absolutamente possível.

A noite é das moças e uma delas, inclusive, é convertida em vocalista solo ao fazer as vezes de Erika Martins em “A Mais Pedida”, uma da canções mais certeiras e menos escrachadas da banda. Colada em “Mulher de Fases”, talvez o maior hit do grupo, sobretudo, e de novo, entre as mulheres, traduz um dos vários grandes momentos de uma noite marcada não só pela volta por cima do Raimundos, mas pela bufonaria generalizada. Explica-se que não é um show do Raimundos como o que se costuma ver por aí, mas se trata do Raimundos Rock Fest, o que dá ao grupo o direito de fazer o que quiser, e aí vêm citações, no meio das músicas, a Metallica (“Fade to Black”), Pink Floyd (“Comfortably Numb”) e System Of A Down (“Aerials”), nas quais o público não se faz de rogado e adora do mesmo jeito.

O baixista e figuraça Canisso, outro da formação clássica, que tem um momento solo no início do bis

O baixista e figuraça Canisso, outro da formação clássica, que tem um momento solo no início do bis

Não que o quarteto precise. Porque, no fundo, no fundo, seus próprios hits são os que causam maior furor no meio do salão, desde o início, com a gritaria geral em “Puteiro em João Pessoa”, passando por “O Pão da Minha Prima” e “I Saw You Saying (That You Say That You Saw)”, e no arremate furioso com “Eu Quero Ver o Oco”, e olha que nem teve a semi-escatológica “Selim”. Nenhum desses momentos se inferioriza, do ponto de vista da aceitação/participação do público, quando comparados aos covers de músicas consagradas de artistas mais consagrados ainda. Mas – explica-se – o Raimundos ultrapassou o fundo do poço do descaso no meio artístico e aprendeu que antes de fazer isso ou aquilo por ser bom ou não, é necessário fazer o que tem que ser feito. E assim, deu a famosa volta por cima de Paulo Vanzolini e está aí de novo, todo serelepe, por cima da carne seca, enchendo Circo Voador e o escambau. Ok, a gravação de um acústico está prevista ainda para este ano.

E não é só o repertório repleto de hits dos últimos tempos de ouro da indústria fonográfica que dá o tom de convencimento. Ocorre que essa formação, que conta ainda com o original Canisso (baixo), Marquin (guitarra) e Caio (bateria), já tem uns 10 anos e os caras estão tocando bem pra dedéu. E alto pra cacete. E com Digão mais concentrado, não só em tocar, mas em tocar bem e em cantar mais e deixar menos o coro do público sozinho, o que já foi um problema na transição do antigo vocalista para o status quo atual. Por isso o show é uma pauleira só, mesmo quando o reggae chega junto em “Mulher de Fases”, ou quando Canisso vira rapper em “Boca de Lata”, ou ainda se o assunto é esporro no início ameaçador com a sequência “Be a Bá”/“Nega Jurema”/“Pitando no Kombão”, que cita até o riff de “Raining Blood”, do Slayer. E tudo isso com o som bem equalizado e no talo. Acreditem: é pau puro pra valer.

Destaque: uma das 'Raimundas' que sobe o palco e é convertida em vocalista na música 'A Mais Pedida'

Destaque: uma das 'Raimundas' que sobe o palco e é convertida em vocalista na música 'A Mais Pedida'

Por último, mas jamais em último, cabe o registro de que nessa edição do Raimundos Rock Fest quem abre para o Raimundos, além do H2O, que fez um grande show (veja como foi), é o próprio Raimundos, só que tocando o repertório do Ramones. Em princípio, o set list previa 17 músicas, mas só nove foram tocadas, com Digão colando boa parte das letras em um tablet sustentado por um pedestal ao lado do microfone. Foi uma festa danada e todo mundo gostou, mas o artifício é desnecessário ante – repita-se - ao apreço do público pelo cancioneiro dos Raimundos. O mais marcante nessa parte inicial é o apelo feito por Digão. “Meninas, não usem a camiseta do Ramones à toa. Ramones não é moda, é alma”, bradou. E - bom lembrar - teve “Fora Temer” do público e “Fora todos” do Raimundos. Sempre bom não se afastar por muito tempo de um show como esse.

Set list completo:
1- Do You Remember Rock ‘N’ Roll Radio?
2- Rockaway Beach
3- Teenage Lobotomy
4- Poison Heart
5- Bonzo Goes To Bitburg
6- I Believe in Miracles
7- Pet Sematary
8- I Wanna Be Sedated
9- Blitzkrieg Bop
10- Puteiro em João Pessoa
11- Be a Bá
12- Nega Jurema
13- Pitando no Kombão
14- Opa, Peraí Caceta!
15- O Pão da Minha Prima
16- Mulher de Fases
17- Fade to Black/A Mais Pedida
18- Reggae do Manero
19- Iron Man/Smells Like a Teen Spirit/Enter Sandman
20- Vida Inteira
21- Palhas do Coqueiro
22- I Saw You Saying (That You Say That You Saw)
23- Comfortably Numb/Me Lambe
Bis
24- Boca de Lata
25- Rio das Pedras
26- Esporrei na Manivela/Aerials
27- Eu Quero Ver o Oco

Um Circo voador bem cheio recebeu essa edição do Raimundos Rock Fest, que teve de tudo um pouco

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