O Homem Baile

Renovação

Versalle desfila bons refrães para público jovem no Rio Novo Rock; na abertura, Memora tem performance de altos e baixos e cantoria da plateia. Fotos: Nem Queiroz.

Bons refrães: o vocalista e guitarrista Criston Lucas solta a voz grave durante o show do Versalle

Bons refrães: o vocalista e guitarrista Criston Lucas solta a voz grave durante o show do Versalle

Já passa da meia-noite, já é sexta-feira, os ônibus já são escassos e a juventude vibrante que se aglomera na beirada do palco do Imperator, no Rio, se diverte como nunca. Em vez de baterem em retirada para a porta de saída, como foi fazendo parte do bom público que enche a casa, eles rumam na direção oposta. E sobem quase todos no palco, para desespero de um elegante e gentil segurança possivelmente pouco acostumado com shows de hardcore das antigas. É o desfecho da apresentação do Versalle, e a subida da turba no palco se dá, ao que parece, pela força da música “Mente Cheia”, o hit maior deles até aqui. Sim, é juventude e é vibrante com o rock, gente de pouca idade como há muito não se vê no ramo.

A música deve ser o maior sucesso da banda talvez por questões de grande execução pública. Por que a vocação do Versalle é lançar canções cativantes para o público, em geral com bons refrães e de alto teor colante até aos ouvidos dos desavisados. Como não se deixar levar por melodias cantaroláveis como as de “Avante”, já no começo; no refrão metafísico de “Modelo Adequado”, que surge de forma quase inesperada, mas gruda na hora; ou mesmo pela dramática “A Saudade É O Que Eu Não Quero”? Essa, por sinal, realça outra caraterística do quarteto, uma preocupação com arranjos incomum a pares contemporâneos. Há sempre uma textura de guitarra aqui, uma segunda voz acolá, uma mudança de andamento em uma ou outra música do Versalle.

Incluída de última hora – coisa de produtor ou gravadora – a cover de “Ainda é Cedo”, da Legião Urbana, curiosamente, quase sai pela culatra. Se a ideia é encorpar o repertório pouco conhecido, acaba sendo a única em que a tal juventude entusiasmada para de vibrar, muito embora a versão tenha sido muito bem adaptada ao jeito Versalle de ser. Jeito que inclui muitas referências ao power pop, ao pós punk oitentista – o vocal grave de Criston Lucas não esconde – e certa tristeza esperançosa em letras incomuns na maior parte do tempo. Por isso “Eu Não Consigo Mudar” vem com uma tensão até magnética, com mais trabalhos de guitarras no recheio. Embora catapultada em um programa de TV de intenções duvidosas, taí uma banda para se acompanhar com atenção.

Linha de frente do Versalle: o guitarrista Rômulo Pacífico, Criston Lucas e o baixista Miguel Pacheco

Linha de frente do Versalle: o guitarrista Rômulo Pacífico, Criston Lucas e o baixista Miguel Pacheco

Mas se o assunto é público, o Memora não tem do que reclamar. Primeiro, porque foi só o grupo aparecer atrás das cortinas para uma multidão - um dos melhores públicos do Rio Novo Rock - se aglomerar na frente do palco. Depois, porque essa turma conhece e canta boa parte das músicas do quarteto, que flutua entre a música negra americana e o rock, e descamba até para o pop radiofônico (alerta total) em uma ou outra música. Por isso, a cantoria é farta durante quase todo o tempo, e com mais força em “Do Mesmo Céu, No Mesmo Chão”, e no funk rock “Não Alimente o Medo”, ambas no abrir da noite. De cara se vê a boa potência vocal de Rafael Lima, que também toca guitarra.

Mas quem manda ver nas seis cordas é o outro guitarrista, Rod Xavier, que ganha disparado o prêmio “solo de maior bom gosto da noite”, considerando os dois shows, em “Quando Tudo For Pra Sempre”. A música é espécie de bis e tem a participação de uma trinca erudita com dois violinos e um violoncelo que, dado o volume generoso do som, só se faz perceber na introdução. O guitarrista do Verbara, Iuri Nascimento (sempre tem convidado no Rio Novo Rock!), empresta vários efeitos a “Ela”, o hit deles, mas aí Rafael Lima subtrai o peso de três guitarras ao tocar um tímido violão. Pouco importa: o público, que só foi ao Imperator para ver o grupo e depois se mandou, adora e canta junto mesmo assim.

No frigir dos ovos, o problema é que, conceitualmente, o Memora (pronuncia-se Memóra), se pauta por equívocos. Por exemplo. Os caras acham o máximo ver o público balançar os braços erguidos para um lado e outro durante uma baladaça, quando o melhor do show está na pegada de músicas mais aceleradas e com mais groove. Se perdem em espécie de jotaquestização perigosíssima na pueril “Como Você Me Vê?”, mas é na força da já citada “Não Alimente o Medo”, de arrebentar assoalho, que reside a boa composição e um arranjo peculiar. E, por fim, faz do palco palanque para um desnecessário discurso de vencedor emprestado de reality shows, quando – sabemos todos – tocar em um projeto para bandas novas é só o começo. Mais música e menos blablablá, pessoal.

Público na mão: o vocalista e guitarrista do Memora, Rafael Lima, toca violão em uma das músicas

Público na mão: o vocalista e guitarrista do Memora, Rafael Lima, toca violão em uma das músicas

Set list completo Versalle:

1- Marte
2- Avante
3- Sem Hesitar
4- Verde Mansidão
5- O Que Fazer
6- Vinte Graus
7- Modelo Adequado
8- Ainda é Cedo
9- A Saudade É O Que Eu Não Quero
9- Eu Não Consigo Mudar
11- Dúvidas
12- Mente Cheia

Set list completo Memora:

1- Do Mesmo Céu, No Mesmo Chão
2- Não Alimente o Medo
3- Idílio
4- Será Que Só Eu?
5- Sede do Peixe
6- Como Você Me Vê?
7- Ela
8- Quando Tudo For Pra Sempre

O guitarrista do Memora, Rod Xavier, dono do melhor solo da noite, com Rafael Lima ao fundo

O guitarrista do Memora, Rod Xavier, dono do melhor solo da noite, com Rafael Lima ao fundo

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