O Homem Baile

Desbunde

Com o público sob controle, Florence Welch reafirma sonoridade singular de sua máquina sonora em ótimo show no Rio. Fotos: Nem Queiroz.

A simpatia de Florence Welch, sempre encantadora e encantada com o público ao mesmo tempo

A simpatia de Florence Welch, sempre encantadora e encantada com o público ao mesmo tempo

De longe a figura messiânica com vestes de Jesus Cristo parece caminhar descalça sobre as águas da multidão, esticando os braços, com uma série de olhares fixos para o além. Parece até que o ente se interliga com as forças da natureza e com outras forças de outros lados nem sempre explicados pela física. De carne osso, pode, contudo, não ser uma figura palpável, mas sugere abraços aos seguidores reais e exala um clima de paz e tranquilidade, muito embora, na maior parte do tempo, ofereça música para não ficar parado: densa, pesada, com a pegada ausente em muita banda de rock por aí. É ao vivo e a cores o encanto de Florence Welch e suas vestes neo-hippies à frente da máquina de fazer som, com show completo, no Metropolitan, no Rio.

O show faz parte das apresentações paralelas do Lollapalooza e é a oportunidade perfeita para o grupo mostrar, em um espaço menos amplo que o de um palco principal de festival, como aconteceu no Rock In Rio (relembre), toda a potência da banda, da performance e do gogó de Florence. E é de fato o que acontece, num espetáculo sonoro abrangente, mas também visual e com ótima interação com o público, que enche a casa e, afinal, já conhece bem o repertorio, incluindo as do disco mais recente, “How Big, How Blue, How Beautiful”, que saiu há menos de um ano. “Essa música vem de um sonho em que havia um grande azul sobre todas as coisas e eu quero dar isso a vocês agora”, diz a cantora antes de tocar a faixa-título, de refrão colante e automática adesão. Quer coisa mais Florence Welch do que isso?

Florence abre os braços para soltar a voz: apresentação contagiante e sonoridade singular da 'The Machine'

Florence abre os braços para soltar a voz: apresentação contagiante e sonoridade singular da 'The Machine'

Pois o show apresenta. Antes de “Heartlines”, a cantora se surpreende com a cantoria perene da plateia: “Vocês cantam muito bem o tempo todo, nem dá para pedir que cantem nessa ou naquela música”. De modo espontâneo, a fala quebra o roteiro e enriquece o show, mas é preciso avisar para o técnico de som, ao menos no Rio, subir um pouco o volume do microfone da moça, para que o público não a supere. O show começa no gás, com “What The Water Gave Me”, um grande sucesso que já faz Florence adotar uma das boas partes de sua performance: a corrida de lado a outro do palco e o giro sobre si própria. É de impressionar como a esguia cantora se comporta como atleta de alto desempenho na Cidade Olímpica. “Ship to Wreck”, embora nova, sustenta o pique, e a trinca do cartão de visitas tem ainda a sacolejante “Shake it Out”.

Musicalmente, e em princípio, a banda de apoio, com uns 10 integrantes, incluindo uma improvável – e nem sempre audível – harpa, manda um classic rock pré anos 70 devidamente atualizado nos nossos tempos. As moças do naipe de metais ainda fazem uma segunda voz para Florence, que fala com voz fina, mas canta como rara tenor. Não por acaso são frequentes associações com Stevie Nicks, do Fleetwood Mac, sobretudo quando a parte sonora converge para o som dos caras, e até com Siouxsie Sioux em vários trechos, mais ainda mais na parte final da já citada “How Big…”. Sim, tudo isso procede, e pode colocar uma pitada de Kate Bush e uma colherzinha de Enya que tá tudo certo. Em “Rabbit Heart (Raise It Up)” e “What Kind Of Man”, Florence passeia pelo fosso entre o palco e a grade que separa o público, para alegria dos fãs mais atirados. Um verdadeiro desbunde.

Plano geral do palco, com os músicos na penumbra e Florence Welch e suas vestes em destaque

Plano geral do palco, com os músicos na penumbra e Florence Welch e suas vestes em destaque

O palco tem um telão espelhado ao fundo que reflete a luz em ótimo efeito, fugindo do lugar comum das telas de led. Os músicos passam quase todo o tempo na penumbra, mas o público mais fiel grita o nome de vários deles em determinados intervalos. Tudo isso associado a performance de Florence faz com o que a banda fique talhada para o palco. A diferença entre as músicas gravadas em estúdio para as versões ao vivo é abissal, e isso é ótimo. Outras músicas que marcaram no show desta segunda são “Delilah”, com ótimo refrão; “You’ve Got the Love”, com uma massa sonora substancial e Florence em um de seus melhores números, na parte final; e “Drumming Song”, no arremate da noite, quando a cantora bate em retirada sem o último adeus. Também, não precisava. O que faltava era um show no Rio em local fechado, o que fez toda a diferença e, de antemão, agenda o próximo retorno.

Set list completo:

1- What the Water Gave Me
2- Ship to Wreck
3- Shake It Out
4- Bird Song Intro
5- Rabbit Heart (Raise It Up)
6- Delilah
7- How Big, How Blue, How Beautiful
8- No Light, No Light
9- Heartlines
10- Sweet Nothing
11- Queen Of Peace
12- Spectrum
13- You’ve Got the Love
14- Dog Days Are Over
Bis
15- Which Witch
16- What Kind of Man
17- Drumming Song

Uma máxima da noite: o giro sobre si própria de Florence Welch, que desce para tocar no público

Uma máxima da noite: o giro sobre si própria de Florence Welch, que desce para tocar no público

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Comentários enviados

Existem 2 comentários nesse texto.
  1. Patricia Azeredo em março 15, 2016 às 16:05
    #1

    A 15 é “Which Witch”, demo do How Big How Blue How Beautiful que o povo tava pedindo freneticamente lá na frente e ela atendeu.

  2. Marcos Bragatto em março 15, 2016 às 19:44
    #2

    Ok, obrigado!

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