O Homem Baile

Um sopro

Na estreia no Rio, HIM convence com show bem costurado e ligeiro, repertório repleto de clássicos e público fiel. Fotos: Bruno Eduardo.

Muito mais simpático que o de costume, Ville Valo, figura central no HIM, interage com o público

Muito mais simpático que o de costume, Ville Valo, figura central no HIM, interage com o público

Tudo muito rápido. Do nada, em menos de dois meses um inesperado show do HIM foi anunciado no Rio, e chega a hora de o grupo encher o Circo Voador, nesta quinta (10/12) para a primeira apresentação na cidade, repleta de expectativas. Plenamente correspondidas, diga-se. Primeiro, porque todo mundo sabe – e não é de hoje - que o público do HIM é do tipo “die hard”: se gosta, gosta pra valer e não abre mão. Depois, porque o show está numa turnê também meio fechada de última hora, e embora o disco mais recente, “Tears On Tape” seja dos bons, o repertório privilegia clássicos de toda a carreira – os oito álbuns foram representados -, incluindo músicas que ficaram de fora na passagem da banda pelo Brasil no ano passado, quando se apresentou só em São Paulo (relembre). Uma boa medida para um show esperado por longos anos. E, por último, que Rio é Rio e Circo Voador é Circo Voador, o que converte o por vezes carrancudo Ville Valo num cara legal pacas. E ontem ele tava soltinho.

Tanto que chega a parar o show, justamente no meio do clássico “Your Sweet Six Six Six”, para repreender o comportamento inconveniente de alguns fãs mais agitados que se desentenderam na beirada do palco. Macula a música, que volta de onde eles tinham parado, mas revela um Valo interagindo muito mais com a plateia do que de costume. Interação, aliás, é uma boa palavra para uma galera que não economiza na cantoria, ainda mais quando o incentivo vem de cima do palco, caso da paradinha na ótima “The Funeral Of Hearts” para que o verso principal/título seja cantado como se fosse uma palavra de ordem de passeata. Ou na soturna “Join Me in Death”, quando Ville Valo se cala para escutar o povão cantando tudo certinho. No lugar do cigarro um atrás do outro, o cantor se apega a uma solitária toalhinha branca para se livrar do suor em uma noite abafada pacas.

O público também responde desfraldando um bandeirão sobre as próprias cabeças como se fosse torcida organizada, já na abertura, com a nervosa “Buried Alive By Love”. O som começa meio embolado, e a música serve para necessários ajustes que sacrificam o início da noite. Valo também recebe panos, bandeiras e até um sutiã, tudo carinhosamente recolhido no final. Ele se comunica com o microfone quase enterrado na boca, dificultando a compreensão, mas dá pra ver que se surpreende com um pano de fundo no palco que não parecia ser o de hábito em shows do HIM. O cenário, diga-se de passagem, é de uma simplicidade atroz, sem nenhuma referência ao logotipo do grupo e suas variações, que aparece tatuado em tudo o que é corpo de tez pálida espalhado pelo meio do público. O que só serve de parâmetro para a exaltação da apresentação propriamente dita, e realça a força das músicas.

Toda a concentração do guitarrista Mikko Lindström, destaque em solos e fornecendo peso ao show

Toda a concentração do guitarrista Mikko Lindström, destaque em solos e fornecendo peso ao show

Em relação ao show do ano passado – a comparação é inevitável – foram tocadas duas músicas a mais, mas essa não chega ser a melhor notícia. O bom é que números marcantes da carreira do HIM, que não estavam no repertório, reaparecem, como a indispensável “Pretending”, porta de entrada para o universo do grupo para muita gente. Ela ganha uma versão mais lenta e salienta os telados de Janne Puurtinen, uma constante durante a noite. A sucinta, mas eficiente “Heartkiller”, ganha um cantarolar sugerido por Valo no final, e “Heartache Every Moment” (haja heart!), atraente e de alto pode de sedução, soa como um bálsamo para os ouvidos. “Killing Loneliness”, de seu lado, no início, surpreende Ville Valo pela preferência do público, que carrega inclusive uma faixa com o nome da música. O falsete mostra que o gogó do rapaz está afiado - não custa verificar -, em que pese as ótimas variações vocais de um extremo a outro, mais uma marca registrada do grupo.

Se Valo é a figura central no HIM, a banda segue com o instrumental afiado, e, dessa vez, o baixista Mikko Paananen, depois de um dia se desidratando com caipirinhas na beira do mar, parece bem mais empolgado, ciente de como a linha de baixo é indispensável para uma banda de gothic metal. O xará Mikko Lindström segue fornecendo peso que se contrapõe aos climas inventados pelo quarteto de instrumentistas, e se destaca especialmente no solo de “Pretending” (de novo), no peso fornecido a (nem tão boa) “Bleed Well”, talvez a menos cantada da noite, e em “Rip Out the Wings of a Butterfly”, quando alguém parece ter subido o volume do som às alturas. O novato baterista Jukka Kroger, que entrou esse ano, vai bem obrigado, e tem até o direito de fazer um solinho no bis, com a cover para “Rebel Yell”, de Billy Idol, outra referência explícita ao apreço do HIM pelos anos 1980.

A outra versão – eles têm muitas gravadas - não tinha como não ser “Wicked Game”, música devidamente apropriada pelo HIM de Chris Isaak e que, talvez por ser tocada tantas vezes, aparece sutilmente diferente a cada show. Dessa vez é um improviso instrumental que prevalece, desembocando numa linda citação à “Sabbath Bloody Sabbath”, você sabe de quem, com Valo cantarolando e tudo, coisa bonita de se ver. O show, que dura pouco mais de hora e meia, tem uma música praticamente emendada na outra, e quando o povão se dá conta, acaba de verdade, mesmo que um bis com uma canção solitária represente um último gole na garrafa seca. Foi tudo rápido mesmo, como um sopro de Niemayer, desde o anúncio do show até essa ótima noite que, com boa presença de público, credencia a cidade ensolarada para receber os nórdicos branquelos regularmente. Que assim seja.

Ville Valo faz malabarismo com o microfone, ao lado do animadíssimo baixista Mikko Paananen

Ville Valo faz malabarismo com o microfone, ao lado do animadíssimo baixista Mikko Paananen

Set list completo:

1- Buried Alive By Love
2- Poison Girl
3- The Kiss of Dawn
4- Pretending
5- Into the Night
6- Killing Loneliness
7- Scared to Death
8- Your Sweet Six Six Six
9- Join Me in Death
10- Bleed Well
11- In Joy and Sorrow
12- The Sacrament
13- Rip Out the Wings of a Butterfly
14- Wicked Game
15- Heartkiller
16- Heartache Every Moment
17- Right Here in My Arms
18- The Funeral of Hearts
19- When Love and Death Embrace
Bis
20- Rebel Yell

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Comentários enviados

Apenas 1 comentários nesse texto.
  1. ZeuS em dezembro 11, 2015 às 15:35
    #1

    Ótimo show! Vai ficar na memória de muita gente que esteve lá!

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  1. Rock em Geral | Marcos Bragatto » Blog Archive » Na beirada do palco

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